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    Cifras & Letras

    Livro aponta desesperança da classe média branca dos EUA

    GEOFF DYER
    DO "FINANCIAL TIMES"

    26/08/2017 02h00

    Joshua Roberts/Reuters
    O presidente Donald Trump cumprimenta simpatizantes ao chegar a Reno,em Nevada
    O presidente Donald Trump cumprimenta simpatizantes ao chegar a Reno,em Nevada

    Desde o choque da eleição de novembro nos Estados Unidos, começou a busca por alguém que explique Donald Trump, por um escritor respeitável que consiga justificar a ira de uma porção da classe trabalhadora branca que conduziu um bilionário de Manhattan à Presidência.

    "Happiness for All?", ("Felicidade para todos?", ainda sem tradução), o novo livro de Carol Graham, é um texto econômico denso no qual parte do argumento depende da diferença entre indicadores "hedônicos" (sentimentos) e indicadores "avaliativos" (atitudes).

    Trump mal é mencionado no livro, escrito em sua maior parte antes da eleição. Mas o estudo serve como um guia sobre as forças que ajudaram a conduzi-lo ao poder.

    O quadro de estresse, mortalidade em ascensão e crescente cinismo na classe trabalhadora branca está levando a "apoio crescente a políticos populistas e nativistas que fazem promessas irreais", escreve a autora.

    Pesquisadora da Brookings Institution e professora da Universidade Maryland, Graham é uma das principais proponentes da chamada "economia da felicidade", que envolve indicadores de "bem-estar" que buscam promover uma avaliação diferente sobre a situação de uma economia do que aquela que indicadores convencionais, como o PIB, oferecem.

    Entre os economistas, as opiniões sobre os novos indicadores estão divididas. No Reino Unido, o governo decidiu que indicadores de felicidade deveriam ser incorporados às estatísticas econômicas nacionais. Outros observadores creem que usar pesquisas subjetivas para orientar políticas é um erro.

    TRABALHO DURO

    Graham conduz os dados sobre bem-estar a uma área mais frutífera, ao avaliar como a experiência da desigualdade forma as visões que os americanos têm sobre o futuro e o valor do trabalho duro.

    Usando fontes que variam de dados de pesquisas de opinião a indicadores de mídia social que revelam o quanto as pessoas sorriem, ela derruba o mito de que a desigualdade é aceita nos Estados Unidos por vir acompanhada por histórias de sucesso.

    Em lugar disso, oprimidos pelas dificuldades da vida cotidiana, os americanos de baixa renda se tornaram menos dispostos a planejar para o futuro e estão menos otimistas sobre sua chance de avanços sociais do que os pobres da América Latina –região que, para muitos, simboliza a desigualdade. E ela constata que os brancos pobres dos Estados Unidos estão menos otimistas quanto ao seu futuro do que os negros e hispânicos pobres.

    Boa parte do debate sobre Trump contrapõe o conceito de identidade branca à ansiedade econômica causada pela desindustrialização. Em outras palavras, os partidários de Trump ou são racistas ou estão subempregados.

    DESESPERANÇA

    Graham conta história diferente, de uma crise social na classe trabalhadora branca. Detalha indicadores objetivos de redução de oportunidades, da disparada nos índices de obesidade à queda na expectativa de vida, passando pela epidemia de heroína. Também menciona indicadores subjetivos, como o nível de estresse reportado. E o retrato que ela pinta é o de "uma caixa-preta de desesperança, falta de expectativas e pouca fé no futuro".

    Os americanos mais ricos acreditam que trabalho duro e educação permitirão que prosperem. Os dados de Graham sugerem que muitos mais pobres já não acatam essa ideia, um dos fundamentos da sociedade dos EUA.

    O ponto mais fraco do livro está nas soluções propostas. Recomenda reformas como medidas de complementação de renda, que encontraram sucesso na América Latina em programas que condicionam os pagamentos a que os beneficiários mantenham seus filhos na escola ou façam outras escolhas socialmente responsáveis.

    Mas a sensação geral é de anticlímax. O livro de Graham deslinda meticulosamente a sensação de ser deixado para trás, que Trump compreendeu, mas que apanhou de surpresa os círculos oficiais de Washington. No entanto, o que ela oferece como resposta é pouco mais que um cauteloso gradualismo que lembra horrivelmente as propostas de Hillary Clinton.

    Tradução de PAULO MIGLIACCI

    Happiness for All?
    AUTORA Carol Graham
    EDITORA Princeton University
    QUANTO R$ 94,70 (livro digital; 199 págs.)

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