• Mercado

    Monday, 29-Apr-2024 06:37:06 -03

    Brasil mostra 'abordagem pragmática' em infraestrutura, mas há incertezas, diz jornal

    DE SÃO PAULO

    20/09/2017 14h54

    O jornal britânico "Financial Times" viu com bons olhos as iniciativas do governo brasileiro para destravar concessões e obras, mas considerou os investimentos em infraestrutura no país ainda muito aquém se comparado a outros países emergentes.

    O atual governo do presidente Michel Temer é "mais favorável às empresas", o que tem levado o Brasil a adotar "um abordagem mais pragmática" para atrair negócios, com taxas de retorno "em níveis mais realistas", avaliou o jornal em uma série de reportagens sobre o tema.

    "Em março, quatro aeroportos foram privatizados com sucesso em uma operação que surpreendeu muitos céticos", disse o FT. O jornal cita também a realização de consultas públicas para atrair cerca de R$ 16 bilhões em investimentos privados para dois projetos de ferrovias para ligar a região Centro-Oeste, produtora de soja, a portos no norte e sul do país.

    "Além disso, o governo pretende vender concessões para a construção de mais de 900 quilômetros de rodovias, com compromissos de investir mais de R$ 10 bilhões; tem planos para abrir concorrência sobre projetos de portos, com a expectativa de atrair R$ 20 bilhões em investimento; e há também uma proposta para levar o acesso de banda larga à internet a regiões remotas, com o lançamento de um novo satélite em maio e R$ 2,8 bilhões em investimento do setor privado e do setor público", completa.

    Na terça-feira (19), o governo também publicou medida provisória que beneficia as concessionárias de rodovias com prazos maiores para obras, o que deve destravar não apenas os investimentos no setor, mas também abrir espaço para as negociações de ativos. Em agosto, o conselho do PPI (Programa de Parcerias em Investimentos) aprovou a venda de estatais e de projetos controlados pela União, como a Eletrobras, a Casa da Moeda e o aeroporto de Congonhas.

    "O maior desafio, de longe, continua a ser como bancar os projetos, já que o governo não tem dinheiro", diz o FT.

    Com o governo Temer procurando parcerias com a iniciativa privada e as grandes construtoras nacionais ainda afetadas pelo escândalo da Petrobras, novos participantes, empresas menores e investidores estão identificando potencial nos projetos no país, avaliou o jornal.

    No entanto, ressalta o FT, com muitas empresas brasileiras impedidas de participar de negócios por suspeitas de corrupção, o Brasil ainda dependerá muito do capital estrangeiro.

    "O governo terá conforto com a resiliência dos fluxos de investimento estrangeiro direto, mas para os projetos de maior risco e que envolvem mais dinheiro em transporte e energia pode ser mais difícil atrair interessados."

    Quem está de olho na abertura das empresas brasileiras é a China, aponta o jornal. As aquisições comandadas pelos chineses no ramo de infraestrutura responderam por quase 40% da entrada total de investimentos no Brasil, de acordo com a consultoria Dealogic.

    "Em certo sentido, os chineses estão desempenhando o papel de salvadores. A dívida de algumas das companhias brasileiras de eletricidade estava subindo para níveis insustentáveis, exacerbada pela recessão e por uma medida do governo que forçou as companhias a reduzir tarifas para renovação de seus contratos por 30 anos, em 2012", afirmou o FT, usando como exemplo a aquisição de participação na CPFL Energia pela State Grid, estatal chinesa de transmissão.

    INCERTEZAS

    O jornal diz também que as suspeitas que rondam o presidente brasileiro "comprometeram uma agenda de reformas que começaram a puxar a economia de volta."

    "Embora Temer continue impopular junto ao público, as empresas e os mercados apoiam o programa de reforma de seu governo", diz o jornal, citando o teto dos gastos públicos e as reformas trabalhista e da Previdência.

    O FT pondera que o presidente "parece ter sobrevivido às acusações de corrupção", mas que há "incerteza considerável" sobre o resultado das eleições presidenciais do próximo ano. "Alguns investidores temem que o Brasil possa se radicalizar à esquerda ou à direita."

    "Ninguém tem pista de quem possa ganhar as eleições presidenciais de outubro de 2018 e pastorear o país para a recuperação... Nenhuma dessas incertezas é boa para o investimento em infraestrutura, que é inerentemente de longo prazo."

    O jornal cita entrevista de Armínio Fraga, ex-presidente do Banco Central, à Folha, em que Fraga diz que "se a mudança imprimida na direção da política econômica for mantida, consolida uma coisa muito boa." "Mas pode acontecer o contrário, uma guinada populista, e ir tudo para o brejo", completou.

    BUROCRACIA

    O jornal afirmou também que a infraestrutura do Brasil continua a ser "muito inferior à de qualquer um dos países com que ele concorre nos principais mercados de exportação."

    Enquanto a burocracia para expansão de rodovias leva à inação brasileira, a China "anda ocupada", compara o FT. "Foram abertos milhares de quilômetros de novas linhas de alta velocidade desde 2007 e modernos trilhos de trem bala que ligam até cidades remotas a Shanghai e Pequim."

    O jornal diz que políticos —"estejam eles mais à esquerda, como a ex-presidente Dilma Rousseff, ou à direita, como seu sucessor, Michel Temer"— sabem que o país precisa melhorar em transporte e outras infraestruturas.

    "Há um consenso crescente também de que comprometer capital nesses grandes projetos pode reduzir a dependência da economia brasileira do consumo, característica tão forte de seu desenvolvimento nos últimos dez anos."

    O problema, segundo o jornal, é que, "por todos os tipos de razões", o Brasil —ao contrário da China e de muitos outros países emergentes— foi ineficaz ao colocar esses planos em prática.

    Alguns avanços foram feitos no âmbito do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), diz o FT, antes de as grandes construtoras brasileiras serem implicadas na Operação Lava Jato, como em transmissão de eletricidade, investimentos em estradas, modernização de aeroportos e construção de moradias do Minha Casa, Minha Vida.

    Mas muitos projetos ficaram atolados na burocracia do país, onde obter financiamento tem sido difícil e a "legislação trabalhista restritiva" ajuda a retardar o processo, afirma o jornal.

    Fale com a Redação - leitor@grupofolha.com.br

    Problemas no aplicativo? - novasplataformas@grupofolha.com.br

    Publicidade

    Folha de S.Paulo 2024