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    Presidente do Itaú encara desafio com start-ups de tecnologia financeira

    JOE LEAHY
    ANDRES SCHIPANI
    DO "FINANCIAL TIMES"

    16/10/2017 17h11

    Bruno Poletti/Folhapress
    SAO PAULO, SP, 22.09.2016: Candido Bracher - Coquetel para a entrega do premio As Melhores da Dinheiro 2016. (Foto: Bruno Poletti/Folhapress, FSP-MONICA BERGAMO) ***EXCLUSIVO FOLHA***
    Candido Bracher, presidente do Itaú Unibanco

    "Torço para o Santos, e isso não é coincidência", diz Candido Bracher sobre o clube de futebol que revelou Pelé, talvez o mais reverenciado jogador brasileiro.

    "Qualquer pessoa razoavelmente sensata da minha idade tinha de torcer para o Santos porque vimos Pelé jogar –quando eu era criança, Pelé ganhava tudo".

    Para os executivos do Itaú Unibanco, o maior banco do setor privado brasileiro e o maior banco latino-americano em capitalização de mercado, ganhar é importante, mesmo diante dos padrões repletos de testosterona do mundo financeiro. Bracher, que assumiu o comando do banco em maio, não é exceção.

    Mas para deixar sua marca, ele precisará encarar o desafio das empresas de tecnologia financeira. Por enquanto, elas ainda são peixes pequenos, o que não quer dizer que não mordam. O banco Goldman Sachs estima que já haja 200 empresas de tecnologia financeira no Brasil, com o potencial de subtrair cerca de R$ 75 bilhões (US$ 24 bilhões) em negócios dos bancos tradicionais em prazo de 10 anos, em setores lucrativos como os cartões de crédito.

    Ao assumir o comando do Itaú em um momento no qual a maior economia da América Latina está se recuperando de sua pior recessão e os bancos, que contam com excesso de agências, sofrem pressão das start-ups de tecnologia financeira, o primeiro desafio de Bracher será simplesmente estar à altura de seu predecessor, Robert Setúbal.

    Agora copresidente do conselho do banco, Setúbal, membro da família fundadora do Itaú comandou uma ascensão nos ativos do grupo de cerca de R$ 15 bilhões em 1994, quando ele assumiu o posto, para R$ 1,4 trilhão (US$ 456 bilhões) em junho deste ano. Parte dessa ascensão aconteceu por conta de uma megafusão com o rival Unibanco, em 2008, e outras aquisições, como a das operações brasileiras do Citigroup, este ano.

    Bracher pode ser beneficiado por uma economia mais forte –os analistas antecipam que o Brasil cresça ligeiramente este ano, e em 2,4% em 2018, depois de passar por uma contração de mais de 7% em dois anos e de suportar múltiplas crises políticas.

    "O pior certamente ficou para trás", diz Bracher, que quando o assunto não é futebol, é um homem amigável mas reservado. "Tivemos dois trimestres consecutivos de algum crescimento econômico, o desemprego está caindo e houve uma forte queda nas taxas de juros. Isso oferece uma indicação de que há espaço para que a economia cresça nos próximos meses".

    Nosso encontro acontece na sede do Itaú em São Paulo, repleta de obras de arte brasileiras de valor inestimável. Bracher é parte da aristocracia bancária do país. Formado pela Fundação Getúlio Vargas, ele é filho de Fernão Bracher, antigo presidente do Banco Central que fundou o banco de investimento BBA Creditanstalt, adquirido pelo Itaú em 2002.

    Com 27,4 milhões de correntistas e quase cinco mil agências e quiosques, o Itaú suportou a desaceleração reduzindo sua exposição a empréstimos de alto risco e sem garantias a clientes pessoa física. Em lugar disso, passou a se concentrar mais em crédito imobiliário e empréstimos caucionados, além de atividades tarifadas como a gestão de patrimônio. No final de junho, empréstimos com inadimplência de mais de 90 dias no pagamento respondiam por 3,2% do portfólio da instituição.

    Mas a carteira de empréstimos a empresas do Itaú sofreu abalos, nos últimos anos, quando as grandes empreiteiras brasileiras se viram implicadas na maior investigação sobre corrupção na história do Brasil, a Operação Lava Jato, que está averiguando propinas políticas na Petrobras. "Foi como a tempestade perfeita... empresas que eram bem capitalizadas de repente desapareceram. Também tivemos taxas de juros altas e uma desvalorização cambial".

    Bracher, que comandava as operações de investimento e corporate banking do Itaú, antes de se tornar presidente-executivo, diz que o Itaú tem 100% de cobertura provisionada para os empréstimos com mais de 90 dias de atraso nos pagamentos, o que inclui os empréstimos empresariais reestruturados durante a crise. "Minha expectativa hoje, considerando o mercado, é que a maioria dessas empresas [com dívidas reestruturadas] conseguirá sobreviver", ele diz.

    O Brasil historicamente tem taxas de juros entre as mais altas do mundo. As taxas médias de juros passaram dos 40% anuais e os spreads eram de 30% em 2015 –abaixo apenas do Malaui e de Madagascar, de acordo com dados do Banco Mundial. Os críticos argumentam que as taxas são usura. Os bancos rebatem que os spreads altos refletem a fraqueza na legislação de falência do país, os altos custos trabalhistas e outros fatores, e que são necessários para conter o custo elevado do capital.

    Uma coisa que Bracher não tem, diferentemente de seu predecessor, é tempo. Ele está se aproximando da idade de aposentadoria compulsória para os diretores executivos do Itaú, 62 anos.

    No tempo que lhe resta, ele diz que continuará levando adiante a estratégia de longo prazo do banco para expansão na América Latina, ainda que o México continue a ser complicado por oferecer poucos alvos para aquisições.

    O Itaú tem uma incubadora de empresas de tecnologia financeira, a Cubo. O banco estabeleceu agências digitais e se comunica com os clientes via WhatsApp. "O que [as empresas de tecnologia financeira] não têm, normalmente, é a capacidade de administrar um conjunto complexo de produtos financeiros", ele diz.

    O banco UBS previu que os bancos brasileiros podem fechar até 30% de suas agências existentes. Mas Bracher afirmou que o Itaú está investindo em encontrar novos papéis para sua extensa rede de agências.

    "Alguém me disse outro dia que os clientes gostam de se queixar a pessoas de carne e osso –esse pode não ser o melhor uso para uma agência, mas se tiver de ser...", brincou.

    Ele também quer refinar a cultura da empresa, que recompensa agressivamente o bom desempenho individual e pune os retardatários., A geração brasileira mais jovem trabalha mais colaborativamente. "Estamos mudando o layout de nossos espaços para facilitar essa maneira de trabalhar", ele diz sobre os novos escritórios de plano aberto do banco. "A maneira de atrair e reter talentos para o banco precisa mudar".

    Não que isso sinalize um Itaú mais brando. Como o Santos, que foi eliminado da Copa Libertadores este ano, o maior banco latino-americano passou por um período difícil. Mas seu novo presidente-executivo continua decidido a ficar no topo da tabela.

    Suceder Roberto Setúbal será um desafio, diz Marcelo Kayath, antigo copresidente do banco de investimento do Credit Suisse no Brasil e fundador da QMS Capital, uma empresa de investimento. "[Setúbal] fez do Itaú uma potência financeira e o banco privado mais bem administrado do Brasil", ele diz.

    Outro fator quer aumentará a pressão sobre Bracher será a regulamentação mais severa e o desafio competitivo de novas empresas. Além disso, diz Kayath, ele terá de preparar sua sucessão.

    Tradução de PAULO MIGLIACCI

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