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    Trabalho escravo 'fere dignidade, não apenas liberdade', diz Dodge

    REYNALDO TUROLLO JR.
    DE BRASÍLIA

    24/10/2017 13h03

    Pedro Ladeira/Folhapress
     Cerimônia de Posse da Nova Procuradora Geral da República (PGR) Raquel Dodge, com a presença do presidente Michel Temer, da presidente do STF Ministra Carmen Lucia, e dos presidentes da câmara e do senado, deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ) e senador Eunício Oliveira (PMDB-CE), na sede da PGR
    O presidente Michel Temer na cerimônia de posse de Raquel Dodge na PGR

    A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, voltou a afirmar nesta terça-feira (24) que a portaria do governo federal que altera as regras para a fiscalização do trabalho análogo à escravidão é um "retrocesso" que "viola a lei penal brasileira".

    O assunto tornou-se o primeiro embate relevante entre a procuradora-geral, empossada há pouco mais de um mês, e o governo Michel Temer.

    Em reunião do CNMP (Conselho Nacional do Ministério Público) nesta manhã, Dodge afirmou que o trabalho escravo "fere sobretudo a dignidade humana, não apenas a liberdade humana". Uma recente portaria do Ministério do Trabalho tornou mais limitado o conceito de trabalho escravo, exigindo que haja "restrição à liberdade de locomoção da vítima" para que os casos flagrados se enquadrem como crimes.

    "Gostaria de acrescentar o fato de que realmente encaminhei ao ministro do Trabalho [Ronaldo Nogueira] a recomendação conjunta assinada pelo Ministério Público Federal e Ministério Público do Trabalho que assinalava que a adoção desse conceito de trabalho escravo nessa portaria viola a lei penal brasileira", disse Dodge, após o assunto ser trazido à reunião por dois conselheiros do CNMP.

    "Eu acrescentei na minha manifestação de encaminhamento um outro argumento que é aquilo que me parece mais substantivo quando nós estamos tratando de enfrentar o trabalho escravo no Brasil: que o trabalho escravo fere sobretudo a dignidade humana, não apenas a liberdade humana. É nessa perspectiva de que a portaria, ao adotar um conceito como que a proteger apenas a liberdade de ir e vir, acabou por restringir em demasia o conceito, aquém daquilo que já fazia a lei."

    Também nesta terça, a ministra Rosa Weber, do STF (Supremo Tribunal Federal), concedeu liminar que suspende a portaria até que a corte julgue o caso.

    Na reunião do CNMP, a procuradora-geral disse que um precedente do Supremo permite que o Ministério Público ajuíze uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) para questionar a suposta inconstitucionalidade da portaria –o instrumento da ADI é geralmente usado para questionar leis, não portarias.

    "Eu entendo que há [na portaria] não apenas ofensa à lei, mas ofensa direta a dois artigos da Constituição, e no tocante a ser possível ou não arguir em Ação Direta de Inconstitucionalidade a inconstitucionalidade de uma portaria em face da Constituição assinalo a todos os conselheiros que na última sessão do Supremo Tribunal Federal houve exatamente um precedente da corte admitindo e declarando a inconstitucionalidade de uma portaria em frente à Constituição", disse.

    "O tema é muito importante sobretudo porque o Brasil vem de ser condenado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos no caso da fazenda Brasil Verde, exatamente na perspectiva de aprimorar uma política pública que tem sido reconhecida mundialmente como muito bem-talhada para enfrentar a escravidão, e não pode haver exatamente aquilo que nós estamos vendo, que é essa portaria que promove um retrocesso dessa política pública", concluiu Dodge.

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