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    Google quer comissão de até 30% por assinante que atrair a sites de notícias

    MADHUMITA MURGIA
    DO "FINANCIAL TIMES"

    24/10/2017 13h21

    Jens Meyer - 17.abr.07/Associated Press
    FILE- In this April 17, 2007 file photo, exhibitors of the Google company work on laptop computers in front of an illuminated sign of the Google logo at the industrial fair Hannover Messe in Hanover, Germany. Google's removal of search results in Europe is drawing accusations of press censorship, as stories from some of the continent's most prominent news outlets begin vanishing. The U.S. Internet giant said Thursday it is getting 1,000 requests a day to scrub results. The U.S. firm must comply with a May ruling from the European Union's top court that enables citizens to ask for the removal of embarrassing personal information that pops up on a search of their names. Among links to vanish were stories on a soccer referee who resigned after a scandal in 2010, French office workers making post-it art, a couple having sex on a train and a lawyer facing a fraud trial. At least three British media, including the Guardian newspaper and public broadcaster BBC, said Google notified them search results in Europe would not contain some links to their publications.(AP Photo/Jens Meyer, File) ORG XMIT: LON108
    Pessoas em frente ao logotipo do Google durante feira em Hanover (Alemanha)

    O relacionamento entre os grupos de mídia e o Google é desconfortável há muito tempo, e o poder do grupo de buscas sobre os consumidores causa desconfiança quanto a uma perda gradual de acesso e à extração pela empresa de receitas que deveriam caber ao setor de mídia.

    Quando o Google anunciou neste mês que deixaria de oferecer links que possibilitam a leitura de conteúdo em sites noticiosos pagos sem que os operadores dos sites possam controlar esse acesso, o que poderia ajudar os provedores de conteúdo a obter novos assinantes, usando dados e algoritmos próprios, os executivos do setor comemoraram.

    Alguns deles disseram que isso representaria milhões de dólares a mais em faturamento para os sites jornalísticos, e outros previram alta de dois dígitos nos índices de conversão de assinaturas.

    Agora, Richard Gingras, o vice-presidente da divisão de conteúdo noticioso do Google, revelou um detalhe complicado: em entrevista ao jornal "Financial Times", ele disse que a empresa planejava cobrar até 30% de comissão sobre as novas assinaturas que propiciar aos provedores de conteúdo.

    "Queremos ter um ecossistema saudável, do qual nos beneficiemos tanto como sociedade quanto nos negócios", ele disse. "Ainda estamos definindo as coisas; não somos especialistas no negócio de assinaturas, mas as receitas compartilhadas serão muito, muito generosas."

    A questão para os provedores de conteúdo noticioso é determinar se isso quer dizer que o Google tentará se posicionar como intermediário entre o consumidor e as empresas de mídia —criando novas fontes de receita para ele— ou se suas inovações no uso de dados e de inteligência artificial poderiam ajudar a aquecer a economia do setor de notícias on-line, que cada vez mais recorre ao modelo de acesso pago.

    Esse debate surge em um momento em que os gigantes da tecnologia enfrentam questões sobre a ascensão das "notícias falsas" (fake news), e sobre o papel deles na provisão de jornalismo responsável.

    "O Google e o Facebook são os sóis gêmeos do universo noticioso —têm papel essencial para a economia das notícias digitais, e os provedores de conteúdo não têm escolha a não ser navegar ao redor deles", diz Ken Doctor, analista do setor de notícias e autor de "Newsonomics".

    De acordo com dados da Parse.ly, que analisa as audiências da web, Facebook e Google, juntos, enviam 76% do tráfego externo recebido pelos sites noticiosos. "A verdadeira questão não está na receita compartilhada, mas se [o Google] conseguirá acelerar a obtenção de assinaturas", disse Doctor.

    Os provedores de conteúdo tendem a concordar com essa análise, porque elevar o número de assinaturas para seu conteúdo digital agora é prioridade, dada a queda na circulação das publicações em papel. "Nós certamente consideraremos [compartilhar receitas], da mesma forma que consideraríamos em qualquer análise de canais de aquisição [de assinantes] —ou seja, será que o custo de adquirir um assinante tem nível aceitável, e inferior ao da receita criada?", disse um executivo de mídia internacional que pediu que seu nome não fosse mencionado.

    "Mas mais que isso, nosso preceito central é a relação direta com o consumidor, de modo que uma comissão de 10%, 30% ou 90% da receita é, na verdade, um aspecto secundário ante a condição do relacionamento direto", ele acrescentou.

    Ainda que Gingras insista em que o Google não esteja planejando criar um negócio de assinaturas, continuam a existir preocupações sobre essa possibilidade, dada a vantagem de negócios de que o Google desfruta como intermediário de pagamentos por bens digitais.

    "Assinaturas de conteúdo noticioso no momento são só um pontinho em termos de novas receitas para uma empresa como o Google, mas faz sentido para eles se tornarem intermediários, o que a empresa já vem tentando fazer há seis anos, desde que criou o Google Wallet", diz Doctor.

    "Quer os produtos em questão sejam assinaturas, música ou filmes, isso é parte significativa da estratégia de negócios do Google, e eles não vêm encontrando tanto sucesso nesse segmento quanto a Apple e a Amazon", ele acrescentou.

    CLIQUE GRÁTIS

    A ação do gigante das buscas para acomodar os provedores de conteúdo demorou muito a surgir. Em 2007, a companhia introduziu uma controvertida política de "primeiro clique grátis", que exigia que os provedores de conteúdo que operavam sites de acesso pago oferecessem um mínimo de três artigos por dia via buscas do Google.

    Desde então, a companhia vem enfrentando críticas cada vez maiores da parte dos provedores de conteúdo que operam com assinaturas, para os quais a atitude do Google prejudica seus modelos de negócios e os pune por não participarem.

    O "Wall Street Journal", da News Corp, por exemplo, informou que o número de visitantes encaminhados ao seu site pelo Google News caiu em 94% nos primeiros cinco meses de 2017, depois que o jornal optou por não oferecer mais conteúdo gratuito.

    "Nosso projeto quanto às assinaturas veio do crescente reconhecimento de que os consumidores de fato estão dispostos a pagar por jornalismo de qualidade", diz Gingras.

    "Também estamos percebendo uma tendência de mercado, dado o número de provedores de conteúdo que estão adotando o modelo de assinatura. Há dez anos, o número de jornais que só ofereciam conteúdo pago podia ser contado nos dedos das mãos. Há dois anos, eles eram pouco mais de três dúzias. Agora, são centenas. No ano que vem, o número será ainda maior", disse.

    O Google não está sozinho em seu esforço por resolver as dificuldades no relacionamento com a mídia on-line. O Facebook anunciou na quinta-feira (19) que estava testando novas maneiras de ajudar provedores de conteúdo como a revista "The Economist" e o "Washington Post" a vender mais assinaturas. Mas a rede social requererá que os provedores de conteúdo ofereçam pelo menos dez artigos gratuitos, para começar, ao contrário do Google, que permitirá que as empresas decidam o número de amostras grátis que pretendem oferecer.

    "[O Facebook] é um ambiente de acesso exclusivo. É, em certo sentido, um jardim murado. Para realmente tirar o máximo de um ambiente como aquele, como provedor de conteúdo, é preciso ter um relacionamento de negócios com eles", disse Gingras.

    "A web aberta é crítica para o futuro de qualquer provedor de conteúdo. É nesse ponto que temos um objetivo comum com eles", ele afirmou.

    Como o Facebook, o Google se viu arrastado aos debates sobre o papel das duas empresas como portais de acesso a notícias —especialmente à luz das acusações quanto às ascensão das notícias falsas.

    Gingras disse que plataformas como o Google dependem da sobrevivência do conteúdo de alta qualidade na web. "É uma boa ideia para a sociedade? Claro que sim. Mas se você também a contemplar em termos da natureza de nosso negócio, a verdade é que quanto mais provedores de conteúdo bem sucedidos houver, mais beneficiado será o Google, igualmente. Essa é a nossa motivação".

    Tradução de PAULO MIGLIACCI

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