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    OMC ruma para implosão ou trajetória sem os EUA

    CLÓVIS ROSSI
    COLUNISTA DA FOLHA

    03/12/2017 02h00

    Dominick Reuter/AFP Photo
    O presidente dos EUA, Donald Trump, em elevador em Nova York
    O presidente dos EUA, Donald Trump, em elevador em Nova York

    A grande batalha no sistema multilateral do planeta nem está na agenda da Conferência Ministerial da OMC (Organização Mundial do Comércio) que começa no próximo domingo (10), em Buenos Aires, mas é o assunto que, de alguma maneira, definirá se os EUA, a grande usina comercial, continuarão no sistema ou se os demais países resolvem seguir adiante sem Washington.

    A OMC é o grande xerife do comércio internacional, por sua vez parte obviamente vital da economia global: em 2016, só as exportações de mercadorias atingiram US$ 11,2 trilhões -o equivalente ao tamanho no ano passado do PIB chinês, o segundo maior do mundo.

    Caso sejam incluídos serviços e propriedade intelectual, as duas outras mega-áreas em que a OMC incide, fica fácil ver a sua importância.

    É essa relevância que os Estados Unidos puseram em causa ao anunciar que questionam a caracterização da China como "economia de mercado", anunciada na quinta-feira (30).

    Se a China é ou não "economia de mercado" não está na agenda de Buenos Aires, pela simples razão de que está "sub judice" na OMC e assuntos em processo de decisão não são discutidos nas conferências ministeriais
    -que representam a máxima instância da organização.

    Por que é importante rotular uma economia como sendo ou não "de mercado"?

    Porque, se for de mercado, os encargos em processos antidumping cairão substancialmente. Dumping é o procedimento de vender bens a um preço abaixo do seu justo valor, o que obviamente afeta os concorrentes.

    O problema é definir justo valor: em tese, numa economia de mercado, cabe a este definir o valor que será tomado por justo por outras economias de mercado, salvo que prefiram acionar a OMC pela suspeita de que o produto é subsidiado.

    Numa economia com forte presença do Estado, caso da China, a acusação (de Estados Unidos e Europa) é a de que o preço é achatado pelo governo, via subsídios, para exportar mais.

    Como esse tema em si não pode entrar na pauta de Buenos Aires, a impressão que se tem em Genebra, sede da OMC, é a de que os Estados Unidos embutirão a discussão em um aspecto correlacionado: o destino do Órgão de Apelação, uma espécie de tribunal superior para resolver controvérsias na OMC.

    Os EUA estão bloqueando a designação de novos juízes, com o que, dos sete habituais, restaram apenas quatro em funções.

    Já em janeiro, o organismo pode se tornar inoperante, o que "terá sérios impactos sistêmicos", como disse o diretor-geral da OMC, o brasileiro Roberto Azevêdo, ao jornal "Valor Econômico".

    Washington poderá aproveitar a grande câmera de eco que é toda conferência ministerial da OMC para explicitar seu desconforto com as decisões do Órgão de Apelação.

    Qual o impacto sistêmico antevisto por Azevêdo?

    O mais dramático seria a implosão da própria OMC, privada da capacidade de funcionar como xerife a pôr ordem na casa do comércio planetário. Mas, em Genebra, trabalha-se com uma hipótese menos apocalíptica: representantes de países importantes, em especial a China, têm dito que o mundo precisa ser capaz de imaginar um mundo em que os Estados Unidos não estejam presentes nos organismos multilaterais (é o que está acontecendo, por exemplo, com o Acordo de Paris sobre o clima, de que os Estados Unidos são os únicos ausentes).

    Se esse exercício acabar sendo feito pelo menos informalmente em Buenos Aires, se reproduzirá uma situação inimaginável há bem pouco tempo: os Estados Unidos ausentes de uma das mais importantes representações da globalização e a China liderando os "globalistas".

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