• Mercado

    Thursday, 02-May-2024 21:13:27 -03

    Cifras & Letras

    Crítica

    Nobel pede maior atuação de economistas no debate público

    MARTIN SANDBU
    DO "FINANCIAL TIMES"

    16/12/2017 02h00

    Fred Lancelot - 13.out.2017/Reuters
    O economista francês Jean Tirole, laureado com o Prêmio Nobel em 2014 e autor de "Economics for the Common Good"
    O francês Jean Tirole, Nobel de Economia de 2014 e autor de "Economics for the Common Good"

    "Economics for the Common Good" é um livro ambicioso. Como sugere o título [Economia para o bem comum], trata-se de uma resposta à crise profissional dos economistas, cuja credibilidade foi seriamente abalada pelo colapso financeiro de 2008.

    É difícil imaginar alguém mais qualificado para escrever uma obra como essa do que o francês Jean Tirole, Nobel de Economia de 2014.

    O cerne do livro é sua convicção de que ser um bom economista e praticar a economia pelo bem comum são dois lados da mesma moeda.

    Tirole trata com honestidade a contradição naquilo que exorta seus colegas a fazer: tomar parte mais ativa no debate sobre políticas públicas, mas sem jamais ir além daquilo que suas pesquisas podem justificar.

    "Os pesquisadores têm uma obrigação para com a sociedade de tomar posições sobre as questões quanto às quais adquiriram competência profissional", escreve.

    Mas ele não considera a mídia o "habitat natural" de um acadêmico. "O traço distintivo de um acadêmico, seu DNA, é a dúvida."

    O trabalho de Tirole são muitos livros em um. Em parte se parece com um livro didático, com um panorama sobre os recentes avanços quanto a informação, competição e questões regulatórias, mercados de trabalho e finanças.

    Também há uma série de descrições da situação no mundo real –exemplos práticos de como mercados e instituições concretos funcionam, de cartões de crédito à estrutura do emprego no setor de transporte rodoviário, passando pela colusão entre empregadores e empregados para manipular as leis trabalhistas francesas e pelos danos ambientais causados pela queima de carvão.

    Partes do livro versam sobre –e se dirigem a– economistas. Entre elas estão as reflexões de Tirole sobre a vanguarda da disciplina e as áreas em que ela se sobrepõe a outras áreas acadêmicas.

    Quanto a isso, Tirole escreve não apenas como estudioso mas como guia, encorajando os colegas a levar a sério as percepções psicológicas sobre o comportamento econômico e os limites morais do que os mercados podem fazer.

    Também há um capítulo sobre as vidas cotidianas dos pesquisadores econômicos, que pode ser esclarecedor para muitos cônjuges, pais e filhos de economistas que talvez nunca tenham descoberto o que o economista em suas vidas faz no trabalho.

    As seções e os capítulos são em geral autônomos, e Tirole mesmo encoraja os leitores a serem seletivos.

    Há alguns temas unificadores. Um deles é a economia da informação, que Tirole, como pesquisador, fez muito ao aplicá-lo a questões de organização industrial e estrutura de mercado.

    A maneira pela qual a informação é disseminada pode explicar questões variadas como captura regulatória, crises financeiras, a inação quanto à mudança no clima e a escassez de companhias lideradas por trabalhadores.

    Os capítulos de Tirole sobre a economia digital são instigantes quanto a isso.

    ECONOMIA DO 'FRILA'

    Por exemplo, o avanço da economia digital tipicamente é visto como estímulo à "economia do frila", mas Tirole aponta que em certos casos ele também pode beneficiar o emprego convencional.

    Os caminhoneiros tendiam a ser autônomos e donos de seus próprios veículos porque as transportadoras de outra forma não conseguiriam assegurar que os vastos investimentos de capital realizados nos veículos fossem cuidados da maneira devida.

    Agora, empresas como essas podem usar monitoração por computador para reduzir o risco de confiar caminhões a motoristas contratados.

    Tirole descarta dicotomias tradicionais tais como Estado vs. mercado ou empregado vs. autônomo. "O funcionamento apropriado do mercado depende do funcionamento apropriado do Estado."

    O livro nos leva a entender que iluminar a maneira pela qual o funcionamento correto pode ser promovido é o modo de economistas contribuírem para o bem comum.

    Tirole não deixa dúvida de que isso é complicado. "É difícil dizer" é a frase mais recorrente do livro. Mas, se a mensagem parece ser menos um chamado às barricadas do que um conselho discreto sobre a necessidade de manter a honestidade e continuar trabalhando para que as coisas melhorem, é uma recomendação que cabe muito bem no mundo atual.

    Tradução de PAULO MIGLIACCI

    Economics for the Common Good
    AUTOR Jean Tirole
    EDITORA Princeton University
    QUANTO R$ 68,30 (564 págs.)

    Edição impressa
    [an error occurred while processing this directive]

    Fale com a Redação - leitor@grupofolha.com.br

    Problemas no aplicativo? - novasplataformas@grupofolha.com.br

    Publicidade

    Folha de S.Paulo 2024