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    OMC muda o jogo comercial para sobreviver

    CLÓVIS ROSSI
    COLUNISTA DA FOLHA

    20/12/2017 02h00

    Informa a OMC (Organização Mundial do Comércio): entra em hibernação o multilateralismo e chegam os acordos plurilaterais. É uma pequena revolução no âmbito comercial: o multilateralismo é a regra de ouro da instituição, desde que foi criada, em 1995. Plurilateralismo, por sua vez, era um anátema.

    Mas a Conferência Ministerial de Buenos Aires, realizada na semana passada, serviu acima de tudo para demonstrar que o modelo multilateral tornara-se inviável.

    Exige que todos os 164 países-membros da OMC ponham-se de acordo em torno de cada assunto em discussão, sob pena de não haver entendimento algum. Em Buenos Aires, ficou evidente que alguns países fincavam estacas em algum ponto que consideravam inegociável e não negociavam nada até que conseguissem ver sua reivindicação atendida.

    Caso, por exemplo, da Índia, que recusava-se a entrar em qualquer negociação para valer sem que os demais países aceitassem regras que lhe permitissem subsidiar a formação de estoques reguladores de alimentos, em nome da segurança alimentar.

    Os Estados Unidos (e o Brasil) se opuseram –e a conferência terminou, formalmente, sem nenhum entendimento em nenhuma área.

    Mas, nos bastidores, Roberto Azevêdo, o diretor-geral da OMC, negociou a guinada para o plurilateralismo. Nesse tipo de acordo, entra na negociação quem quer e sai quando quer, se achar que seus interesses não estão sendo atendidos.

    MESMA MENTALIDADE

    Entram os que, no jargão comercial, se chamam de "like-minded countries" ou países com a mesma mentalidade, em tradução livre. O oposto exato de países com mentalidades em colisão frontal.

    Os primeiros temas para essa pequena revolução serão três: facilitação de investimentos, estímulos para que pequenas e médias empresas tenham mais acesso ao comércio global e o vastíssimo tema do e-commerce (comércio eletrônico).

    Cada um dos itens recebeu a adesão de pouco mais de 80 países. O Brasil está em todos eles.

    A guinada surpreendeu até patrocinadores do livre-comércio, como o Conselho Nacional de Comércio Externo dos Estados Unidos.

    "Para uma administração [a de Donald Trump] que vinha evitando a discussão de esforços plurilaterais, o engajamento nas conversas sobre e-commerce é alentadora", afirma Jake Colvin, vice-presidente para Assuntos de Comércio Global.

    OU BILATERAL OU NADA

    De fato, até a conferência de Buenos Aires, o governo Trump deixava claro que rejeitava não apenas o multilateralismo como qualquer conversa que envolvesse mais de dois países. Ou os acordos eram bilaterais ou nada.

    Fácil de explicar: o peso que têm a economia e o comércio americano são tais que, em qualquer negociação apenas com um outro parceiro, a chance de obter concessões é imensa –certamente maior do que uma negociação que envolva outros gigantes (China, Brasil, União Europeia, por exemplo).

    É óbvio que um navio gigantesco como a OMC não muda o curso do dia para a noite. O que vai acontecer, de agora em diante em Genebra (a sede da OMC), não são negociações propriamente ditas, mas apenas "conversas exploratórias, com vistas à negociação", conforme o fraseado usado em Buenos Aires para o e-commerce.

    Seja como for, é um passo adiante enorme, porque no esquema multilateral já não havia nem conversa, quanto mais negociação.

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