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    Crédito fácil por meio de apps vira problema para consumidor chinês

    DO "NEW YORK TIMES"

    30/12/2017 02h00

    Como muitas pessoas na China, Bai Shichao tem dívidas maiores que o seu salário comporta. Bai, 30, é entregador em Pequim e tomou muito empréstimo de empresas chinesas de crédito online.

    Em um país onde não existem métodos confiáveis de dizer quem é digno de crédito, essas companhias recorrem à inteligência artificial e a dados pessoais exóticos –como a velocidade de digitação do solicitante em seu celular–para determinar que credores têm maior probabilidade de pagar em dia.

    No caso de Bai, os métodos fracassaram. Ele emprestou dinheiro para abrir um negócio. Quando o projeto fracassou, tomou mais crédito para investir em carvão, sementes oleaginosas e açúcar, nos mercados futuros chineses. Não demorou para que fizesse novos empréstimos a fim de pagar velhos credores.

    Hoje, a dívida de Bai supera os US$ 5.000, e ele ganha menos de US$ 600 por mês.

    "É como ser viciado em jogo", disse Bai, que abandonou a universidade e teve diversos empregos braçais, como segurança ou garçom. "Você começa a apostar e logo se vicia nisso".

    Com mais de US$ 100 bilhões em empréstimos, e diante da crescente preocupação dos consumidores com sua privacidade, Pequim está agindo para controlar o boom dos empréstimos online, segmento pouco regulamentado e muito capitalizado.

    Em novembro, o banco central da China proibiu novas plataformas de empréstimos pessoais online. Em dezembro, uma comissão regulatória anunciou medidas de repressão a essas empresas e limitou suas taxas de juros.

    Os pequenos empréstimos chineses estão se acumulando. Mais de 8,6 mil empresas dão alguma forma de crédito, e cerca de US$ 145 bilhões em empréstimos ainda não foram pagos, segundo o banco central chinês –ou US$ 392 bilhões, de acordo com o Boston Consulting Group.

    "Estamos preocupados por, em um ambiente no qual não existe um sistema de crédito efetivo, as pessoas tenderem a se endividar demais", disse Bai Chengyu, executivo da Associação Chinesa de Microfinanciamento.

    Essas empresas surgiram para dar empréstimos a quem não tinha histórico de crédito –um total estimado em cerca de 1 bilhão de chineses.

    A China recorreu ao setor de tecnologia, que opera com rapidez, para resolver o problema, e hoje há milhares de apps que oferecem empréstimos ou financiamentos, muitas vezes em segundos.

    As maiores empresas da internet e das finanças chinesas bancam esses projetos.

    Dois anos atrás, o BC chinês solicitou que as empresas de maior sucesso –entre elas divisões de grupos como a Tencent Holdings e o Alibaba Group– criassem sistemas de classificação de crédito.

    Mas se negou a dar licenças que formalizariam esses sistemas, e o governo deu a entender, segundo a imprensa local, que o projeto ficou aquém do esperado.

    No mês passado, uma associação de financeiras online ligada ao banco central anunciou planos para um sistema que avaliaria dados fornecidos pelas grandes empresas de tecnologia. Poucos detalhes foram revelados.

    LOCALIZAÇÃO

    As novas plataformas também despertam questões de privacidade, área de preocupação nova para a China, mas cuja importância vem crescendo. Muitas plataformas que acompanham o uso de smartphones têm acesso a dados de localização, listas de contatos e registros de chamadas, e isso tudo pode ser usado para localizar e perseguir os inadimplentes.

    "O governo vem enfrentando dificuldades, porque percebe que informações pessoais dos consumidores estão disponíveis em toda parte", disse Liu Yue, sócio do Boston Consulting Group na China. "Mas não sabe como mudar essa situação porque os dados já estão em uso".

    Bai Chenbgyu, da Associação Chinesa de Microfinanciamento, acrescentou que "algumas das empresas usam formas de intimidação para pressionar os clientes a pagar os empréstimos".

    No mês passado, a província de Guangdong, no sul da China, alertou que uma dúzia de apps tinham lacunas de segurança que permitiam que as empresas roubassem informações que eram usadas para intimidar devedores, seus amigos e familiares.

    Um dos apps em questão era o Paipai, cuja produtora, o PPDAI Group, abriu seu capital recentemente na bolsa de Nova York. As autoridades de Guangdong disseram que o app transmite dados dos usuários sem autorização. A prática "expõe seriamente a privacidade dos usuários", disseram as autoridades.

    Um devedor do Paipai diz ter acumulado mais de US$ 75 mil em empréstimos de 30 plataformas diferentes, para cobrir suas despesas e investimento em uma loja de sapatos. O homem, que pediu anonimato por medo de represálias dos cobradores, disse que costuma receber muitas ligações diárias de cobrança.

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