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    Milionários buscam gestores para não ter dilapidado o patrimônio

    DANIELLE BRANT
    DE SÃO PAULO

    29/01/2018 02h00

    O playboy Jorginho Guinle (1916-2004) achou que ia morrer aos 80 anos. Decidiu, então, aproveitar ao máximo a vida e torrou sua fortuna. Ele, porém, viveu até os 88, sem dinheiro e morando de favor no Copacabana Palace, hotel fundado por sua família -e seus herdeiros ficaram de mãos vazias.

    A ruína de Jorginho não só abriu os olhos de muitas famílias -que viram a necessidade de ter uma gestão profissional para preservar seu patrimônio. Bancos, consultorias e butiques de investimento também notaram que havia um mercado e passaram a disputar esses milhões.

    Afinal, são valores que estão longe de ser irrisórios: as casas especializadas costumam cobrar uma comissão ou taxa pelo trabalho que pode variar entre 0,25% e 1,5% do total sob gestão.

    Outra alternativa adotada pelos muitos ricos é nomear alguém da família ou um executivo para administrar o "family office", a estrutura criada para gerir o patrimônio. Montar uma empresa dessas requer (além de dinheiro) autorizações de reguladores.

    "Um terço dessas famílias opta por montar o 'family office', mas dois terços delegam. Isso vai depender do perfil da família", afirma Leonardo Bortoloto, sócio da Aditus, consultoria que tem R$ 30 bilhões sob gestão.

    "Se tiver feito a fortuna no mercado financeiro, poderá puxar para si a decisão. Mas, se vier da indústria, por exemplo, poderá preferir transferir a gestão."

    Na prática, a decisão também pode ampliar ou limitar o espectro de produtos a investir. Se escolherem uma gestora, a oferta de aplicações vai ser a que estiver no portfólio dessa empresa.

    Uma gestão independente, por outro lado, consegue enxergar o mercado de uma maneira mais abrangente, avaliando melhores opções em casas distintas, de acordo com o planejador financeiro Rodrigo Assumpção, da associação Planejar.

    Henrique Assale /Folhapress
    Milionários

    ALTO NÍVEL
    Como funcionam os escritórios que deixam os ricos mais ricos

    1 - O QUE SÃO
    Empresas que ajudam famílias a manter ou ampliar seu patrimônio; às vezes a própria família cria uma estrutura para fazer essa gestão

    2- PÚBLICO-ALVO
    Famílias milionárias –ou bilionárias

    3- COMO FUNCIONAM
    Um administrador ou membro da família fica encarregado de tomar decisões envolvendo o patrimônio da família, seja no caso de um family office ou na escolha dos serviços de outra empresa ou de um banco

    4- COMO COBRAM
    Costuma ser um percentual dos ativos sob gestão

    5- QUAIS SERVIÇOS OFERECEM
    Além de assessoria financeira e de investimentos, podem gerenciar as contas, pagar impostos e empregados, fazer planejamento sucessorial, tributário e jurídico

    6- INVESTIMENTOS
    Têm acesso a produtos mais sofisticados (fundos exclusivos e com estratégias mais arriscadas); muitas famílias aplicam parte do dinheiro no exterior

    ALÉM DA FORTUNA

    A fortuna dessas famílias é uma porta de entrada para fundos que investem em ativos mais arriscados e que podem dar retorno maior que os conservadores, engordando ainda mais o montante -ou reduzindo-o, a depender, claro, do sucesso da aposta.

    E uma decisão que muitas tomam -se não, todas- é colocar parte do dinheiro no exterior, para diminuir a exposição ao risco-Brasil.

    Além de cuidar dos investimentos, essas consultorias têm como tarefa auxiliar as famílias em outros aspectos. Costumam cuidar do pagamento de empregados, gerenciar os imóveis, ajudar no planejamento tributário e até evitar brigas de herdeiros, segundo Bortoloto, da Aditus.

    No caso da gestora independente de patrimônio Wright Capital, a intenção é convencer cada vez mais famílias a destinar uma parte do dinheiro a investimentos com impacto social.

    Isso é feito por meio de um fundo que, por sua vez, aplica em fundos que captam recursos para projetos que buscam melhorar a educação infantil, levar saneamento a áreas pobres ou construir moradia para quem não tem onde morar.

    BAIXANDO A RÉGUA

    Algumas dessas casas já começam a olhar para quem não tem tanto dinheiro, mas se vê com uma soma vultosa nas mãos, decorrente, por exemplo, da venda de um apartamento. É o caso da Fiduc, que trouxe um modelo de atuação que prioriza quem tem pelo menos R$ 100 mil disponível para investir.

    "Aqui, esse planejamento financeiro é restrito para milionários, e o impacto é muito pequeno, porque são poucas pessoas. A ideia é popularizar, como já acontece nos Estados Unidos, no Canadá, no Reino Unido e na Austrália", diz Pedro Guimarães, presidente da Fiduc.

    Os consultores cobram um percentual de 1,5% dos ativos sob gestão pelo trabalho.

    "Temos objetivos alinhados com os do cliente. Quanto mais ele ganha, mais nós ganhamos. Nosso interesse não é vender produtos, como o de bancos. É ingenuidade pensar que o modelo de negócios dele não vai imperar", afirma Guimarães.

    Em outras consultorias ou mesmo nos bancos, o atendimento para esse público muda. "Ter um cliente com R$ 300 mil para investir não compensa financeiramente no nosso caso", diz Bortoloto, da Aditus. "Esse perfil vale a pena para quem quer escala. Mas a estrutura oferecida é diferente."

    É a mesma avaliação do planejador Rodrigo Assumpção. "É um trabalho menos complexo, não envolve esse atendimento jurídico, tributário e sucessorial", diz.

    GRANDES BANCOS

    Na última década, os principais bancos do país passaram a entrar com força no segmento dos mais ricos. Como parte da estratégia, lapidaram a área private, destinada aos mais endinheirados, e destacaram equipes para oferecer serviços parecidos com os dos "family offices" e atender com mais cuidado esse público.

    Bradesco, Itaú e Santander enveredaram por esse caminho, aprimorando o atendimento personalizado que já ofereciam ao público private.

    No Bradesco, esse foco teve início em 2009 e é direcionado para clientes com pelo menos R$ 300 milhões em recursos para investir.

    O banco tem cerca de 70 "family offices", únicos ou múltiplos -várias famílias debaixo de uma mesma estrutura de gestão. "Quando cuidamos bem do 'family office', ele atrai outros clientes", diz João Albino Winkelmann, diretor da instituição.

    Como parte desse relacionamento, a vantagem para o banco está em criar vínculos com os donos dessas fortunas e oferecer financiamentos, empréstimos, seguros de vida ou automóveis, emitir fianças ou criar produtos de investimento exclusivos.

    O trabalho dos bancos com esses clientes passa pelo planejamento de investimento, sucessório e até fiscal, mas serviços complementares que "family office" realiza (pagamento de contas, por exemplo) ficam de fora do pacote.

    Nos investimentos, os "family offices" têm perfil de conservador a moderado, afirma Winkelmann. "O dinheiro do banco é a poupança para a próxima geração. Ele não quer correr muito risco, porque já enfrenta isso no próprio negócio", diz.

    O diretor do Bradesco diz que essas famílias buscam alocar entre 40% e 60% do patrimônio no exterior, para diluir o risco-Brasil, que já está contemplado no negócio.

    No Santander, a área é mais recente: cerca de três anos. A ideia é assessorar famílias com ao menos R$ 100 milhões de patrimônio.

    "Temos uma equipe que entende da parte macroeconômica, de crédito, usamos a assessoria patrimonial para desenhar a melhor estrutura de produtos para os clientes", diz Gustavo Schwartzmann, superintendente-executivo de private banking.

    Segundo ele, a avaliação é feita com isenção. "A gente olha para o patrimônio do cliente de forma agregada, vamos ver o que cada um dos bancos oferece de melhor e manter o relacionamento com cada uma das casas com as quais ele já se relaciona."

    Para o planejador Rodrigo Assumpção, da associação Planejar, a independência é justamente a questão. "A questão é saber se os bancos vão conseguir trabalhar de forma isenta, se vão conseguir sugerir produtos de outros bancos. Os clientes buscam essa independência."

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