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    Falta de papel ameaça jornais na Venezuela

    SYLVIA COLOMBO
    DE SÃO PAULO

    26/01/2014 03h03

    "Em menos de dois meses, seremos um país sem jornais impressos, algo que nunca se viu no mundo." A frase é de Miguel Otero, diretor do "El Nacional", um dos mais importantes jornais venezuelanos, com sede em Caracas.

    Na última semana, o "Nacional" anunciou em editorial que, devido a travas burocráticas impostas pelo governo Nicolás Maduro, só tem papel para imprimir jornal nas próximas seis semanas.

    Desde outubro último, dez diários do interior fecharam, e 21 anunciaram que podem fazer o mesmo caso recursos para a compra de insumos não sejam liberados pela Cadivi (Comissão de Administração de Divisas). O "El Universal", rival do "El Nacional", também disse passar pelas mesmas dificuldades.

    Miguel Gutiérrez- 20.jan.2014/Efe
    Reunião de TVs como vice venezuelano, Jorge Arreaza (centro, de óculos), e a ministra Delcy Rodríguez (Comunicações)
    Reunião de TVs como vice venezuelano, Jorge Arreaza (centro, de óculos), e a ministra Delcy Rodríguez (Comunicações)

    Os jornais venezuelanos dependem de papel importado, principalmente do Canadá (cerca de 80%). Para obtê-lo, as empresas devem pedir ao órgão permissão para comprar dólares.

    Além disso, é necessário obter uma autorização que justifique a compra de produto importado.

    "São trâmites demorados, que requerem muita antecedência. O governo demora a liberar a compra. Uma vez aprovada, não libera o recurso. Nessa espera, os jornais fazem reformas, acabam com suplementos, para resistir até quando puderem. Muitos não vão conseguir", afirmou à Folha Carlos Carmona, proprietário e diretor do jornal "El Impulso", de Barquisimeto.

    Desde 2003, há um controle estatal do câmbio que impede a livre compra e venda de divisas, administradas exclusivamente pela Cadivi.

    Nos últimos meses, o "Nacional" eliminou os suplementos de moda e de literatura. O "Impulso" passou de quatro cadernos para dois. Em editorial, o jornal, o mais antigo da Venezuela, anunciou que só tem como circular até o começo de fevereiro.

    "É um ataque por via indireta, porém óbvia. Equivale a cortar o suprimento de água de um pequeno vilarejo", disse em entrevista à Folha o jornalista americano Jon Lee Anderson (autor de "Che ""Uma Biografia"). "Maduro está imitando a China comunista, o stalinismo. Não entendo bem o que quer fazer. Associado ao fato de ser inábil para lidar com a economia, isso não leva a Venezuela a um futuro promissor", completa.

    O governo do país defende-se dizendo que a liberação de divisas para comprar insumos obedece a uma hierarquização de importações.

    Desde 2012, o papel-jornal não é considerado "prioritário" na hora de obter autorização para a compra. A deputada governista Tania Díaz, vice-presidente da Comissão de Poder Popular e Meios de Comunicação da Assembleia Nacional, disse que "os jornais que estão reclamando são os que mais receberam insumos nos últimos meses".

    Otero refuta, dizendo que desde maio o "Nacional" não obtém autorização para comprar papel ou mesmo tinta.

    "É um avanço final. O Estado já eliminou a oposição nas TVs, com expropriações e outras táticas; agora vai para os jornais. Não é novo, Perón já fez isso nos anos 40. E o kirchnerismo repete a estratégia do asfixiamento econômico da mídia hoje, impedindo anúncios nos jornais de oposição", diz Cláudio Paolillo, da SIP (Sociedade Interamericana de Imprensa).

    Segundo Otero, as manobras contra a imprensa oposicionista se agravaram na gestão Maduro. "Nos 14 anos de Chávez nunca tivemos esse problema. As autorizações saíam com normalidade. Maduro aprova a compra de divisas, mas não as libera", diz.

    REDES SOCIAIS E TVS

    Na última semana, Maduro nomeou um vice-ministério para cuidar exclusivamente das mídias sociais. José Miguel España terá como atribuição incrementar a produção de conteúdo de propaganda em contas de Twitter e Facebook ligadas ao governo e observar o que se publica na rede por contas independentes e de oposicionistas.

    A medida alinha-se a decisão recente do equatoriano Rafael Correa, que anunciou uma emenda incluindo as mídias sociais no monitoramento previsto pela Lei de Mídia, em vigor desde junho.

    Além disso, o governo tem se reunido com representantes das TVs para pedir que revisem sua programação, acusada de incentivo à violência.

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