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    Presidente colombiano credita escândalo a 'forças obscuras'

    JULIANA VINES
    COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, EM BOGOTÁ

    05/02/2014 20h00

    Após saber do envolvimento do Exército em um suposto esquema de espionagem das negociações do governo colombiano com as Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia), o presidente do país, Juan Manuel Santos, disse que "forças obscuras" interessadas em acabar com o processo de paz podem estar por trás do escândalo.

    O esquema, revelado pela revista "Semana" na última terça-feira, envolve setores de inteligência militar, que, escondidos sob a fachada de um restaurante e escola de informática, monitoravam e-mails e aplicativos de trocas de mensagens de representantes do governo nas negociações, que acontecem em Havana, Cuba.

    Os principais alvos seriam o chefe negociador do governo, Humberto de la Calle, o alto comissário de Paz, Sergio Jaramillo, e o diretor da Agência Colombiana para a Reintegração (ACR), Alejandro Eder, além de líderes da guerrilha.

    Para as Farc, as "forças obscuras" contra a paz têm nome e sobrenome: o ex-presidente Álvaro Uribe, que publicamente se posiciona contra as negociações e é candidato ao Senado pelo partido de oposição Centro Democrático.

    Ontem, o número dois da guerrilha e chefe da negociação, Luciano Marin Arango, conhecido como "Ivan Márquez", afirmou que Uribe "é o inimigo público número um para a paz na Colômbia" e que, se confirmada, a espionagem é "muito séria".

    Em resposta, Uribe publicou em seu Twitter: "Eu não preciso recorrer a serviços clandestinos de inteligência, a mim me basta a confiança dos cidadãos". E criticou a posição do governo, que, na noite de terça-feira, afastou dois generais do serviço de inteligência do Exército –Mauricio Zúñiga Campo e Jorge Zuluaga López.

    "É ruim para a pátria que militares sejam abatidos como bodes expiatórios em favor da cumplicidade do governo com as Farc", afirmou o ex-presidente.

    LÍCITO OU ILÍCITO?

    As investigações para desvendar o esquema já começaram e Santos deu até sexta-feira da próxima semana para o exército apresentar as conclusões.

    Ontem, em pronunciamento no Ministério da Justiça, o presidente deu um voto de confiança aos militares e levantou a hipótese de a atividade de espionagem ser lícita.

    "Serviços de inteligência de fachada existem em todas as partes do mundo. Ainda não se conhece o conteúdo dos computadores que estavam no local. O Exército afirmou que a atividade é legal. Cabe à investigação separar o que é lícito do que é ilícito."

    Para a cientista política Sandra Borda, professora da Universidad de Los Andes, em Bogotá, o esquema parece estar relacionado com setores do Exército que estão descontentes com as negociações. "Aparentemente é um grupo pequeno, sem muito peso, mas que está se sentido fora da mesa de negociações, apesar de os militares terem um representante em Havana."

    Borda não acredita na participação da oposição no esquema, mas a cientista política Arlene Beth Tickner, autora do livro "Relaciones internacionales y Política Exterior de Colombia" (relações internacionais e política externa da Colômbia), acha provável que pessoas próximas de Álvaro Uribe tenham alguma relação com a espionagem.

    "É algo que já se suspeitava, que setores militares estão descontentes com o processo de paz e podem estar associados com a oposição", afirma.

    Para as duas especialistas, a revelação do esquema não terá impacto negativo nas negociações de paz, que se estendem desde 19 de novembro de 2012.

    "Um dos princípios da mesa de negociações é a confidencialidade e a espionagem pode dificultar que a confidencialidade se mantenha. Mesmo assim, não creio que vá prejudicar o processo. Ao que tudo indica, não se trata de um grande complô", afirma Borda.

    De acordo com ela, o impacto maior seria na campanha para as eleições presidenciais de maio, influenciadas diretamente pelo que acontece em Havana. "Pode ajudar na reeleição de Santos", afirma.

    O presidente não está com a popularidade muito alta –os números da última pesquisa apontam que 27% dos eleitores votariam em branco e 25% votariam em Santos. "Se o governo conseguir promover o discurso de que há uma conspiração contra a paz, e, que para combater a conspiração é preciso continuar no poder, o escândalo pode ajudar."

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