• Mundo

    Friday, 17-May-2024 06:59:34 -03

    Pais ajudam a acabar com brinquedos 'para meninos' em lojas do Reino Unido

    ESTHER ADDLEY
    DO "GUARDIAN"

    08/03/2014 18h21

    Kerry Brennan e sua filha de 2 anos, Frances, passeavam pelo setor de brinquedos da filial local da loja de departamentos Debenhams, um ano atrás, quando a menina viu alguns de seus brinquedos favoritos de temática espacial. "Ela apontou para a placa na estante e falou 'veja, a placa diz que são planetas'", comentou Brennan. "Mas a placa dizia 'meninos'."

    "Achei chato que daqui a dois anos ela começaria a ler e de repente se veria diante dessa mensagem absurda imposta pela loja, de que algumas das coisas que ela gosta –como o espaço, dinossauros e caminhões de bombeiro– não são para ela, porque ela é menina."

    Dias depois, Brennan entrou no Mumsnet (um site sobre criação de filhos) e encontrou uma discussão em curso entre outros pais que repudiavam a divisão de gênero nas estantes de brinquedos. "Então eu iniciei outra discussão: 'Alguém quer participar de um esforço para convencer varejistas a parar de rotular brinquedos como sendo para meninos ou meninas?'. Houve muito interesse."

    Um ano depois, o grupo de pais que se formou a partir dessa conversa, agora operando sob o nome Let Toys be Toys (algo como "brinquedos são apenas brinquedos"), já teve um impacto maior sobre o comércio varejista britânico do que qualquer um de seus integrantes poderia ter imaginado.

    Depois de terem sido procuradas pela campanha e ouvido que limitar as escolhas das crianças com base no gênero delas é antiquado e inaceitável, 12 redes varejistas importantes (incluindo a Toys R Us, The Entertainer, Hobbycraft e Next) concordaram em rever o modo como expõem brinquedos em suas lojas.

    A rede Sainsbury's escreveu dizendo que concorda com a direção da campanha e vai eliminar aos poucos as placas que classificam os brinquedos por gênero. A Marks & Spencer disse que vai mudar os rótulos de alguns brinquedos classificados como "coisas de menino" ou "de menininha".

    A rede Boots se disse "desalentada porque nossos esforços para ajudar os fregueses a comprar em nossas lojas não funcionaram do modo como pretendíamos".

    A companhia reconheceu que sua decisão de expor brinquedos do Museu de Ciências de Londres sob uma placa dizendo "brinquedos para meninos" foi equivocada (enquanto isso, um conjunto de chá, brinquedos Fuzzy Felt e um conjunto Hello Kitty estavam no setor "brinquedos para meninas"). "Sempre nos orgulhamos de apoiar as carreiras de mulheres nas ciências e, especialmente, na farmacêutica", disse a rede em carta. "Nunca foi nossa intenção estereotipar certo tipo de brinquedo."

    O grupo Let Toys be Toys afirma que, em 2012, metade das lojas que avaliou usava rótulos de gênero nas prateleiras de brinquedos, proporção que teria caído para um quinto em 2013.
    Megan Perryman nunca tinha participado de uma campanha até interessar-se pela questão dos brinquedos de gênero, devido à discussão online. Ela acha que a campanha teve êxito porque o grupo decidiu ser focado em seus objetivos.

    "Falar de igualdade de gênero em crianças é uma questão enorme. Então decidimos desde o início que precisávamos limitar nossos objetivos a algo bem específico." No primeiro ano da campanha, eles combinaram que pediriam às redes de lojas que exibissem os brinquedos por tema, não por gênero.

    Esta não é a primeira tentativa de acabar com a rotulagem sexista. Em 2011, a rede de lojas de brinquedos Hamleys cedeu a pressões e acabou com a separação por gêneros de andares inteiros de sua loja principal em Londres. Mas nenhuma campanha anterior teve impacto tão grande.

    INTERESSE

    Não há dúvida de que a campanha Let Toys be Toys suscitou interesse enorme, segundo Billy Langsworthy, vice-editor da revista especializada "Toy News". Uma matéria no site da revista sobre a decisão da Toys R Us de deixar de classificar brinquedos por gênero foi compartilhada online mais de 7.000 vezes, quando um artigo popular normalmente é compartilhado 15 ou 16 vezes, disse Langsworthy.

    "O que chama a atenção na campanha é a rapidez, o fato de ter decolado com tanto sucesso", ele diz. "A decisão da Toys R Us foi um grande momento para o perfil da rede varejista. Fez outras redes olharem para ela e pensarem 'talvez esta questão também mereça nossa atenção'."

    Mike Coogan, diretor de marketing e comércio eletrônico da Toys R Us, comentou: "Sabemos que as crianças têm interesses diversificados e procuramos constantemente retratar esses interesses em nossas estantes e em nossos materiais publicitários. Sempre estamos interessados em ouvir nossos consumidores, e é positivo ter um diálogo com eles."

    Um porta-voz da rede Next disse que sua linha de brinquedos, parte da qual era rotulada como "coisas para meninos", este ano saiu com um título unissex, The Little Gift Co.

    "Nossas embalagens, nossos rótulos e as indicações em nossas lojas visavam a ajudar os consumidores a escolher presentes apropriados, mas entendemos que essas classificações podem ser enganosas", disse o porta-voz.

    COMPROMISSOS

    Os organizadores da campanha dizem que sua batalha está longe de ter sido ganha. Eles destacam a importância de cobrar das redes de lojas o cumprimento dos compromissos assumidos. Dizem que em 2015 pretendem levar a discussão aos fabricantes de brinquedos e editoras de livros. Então por que, na opinião deles, tiveram um impacto tão grande em apenas 12 meses?

    "Acho que foi em parte porque trouxemos à tona algo que já preocupava as pessoas", diz Perryman. "Mas é também porque estamos sendo razoáveis. Não estamos pedindo às redes de lojas que prometam mundos e fundos. Entendemos que elas são movidas pela busca do lucro e que não podem mudar tudo do dia para a noite. Mas pedir que digam 'esta é uma boneca e este é um carro', em vez de dizer 'isto é para meninas e aquilo é para meninos', é um pedido razoável."

    Tradução de CLARA ALLAIN

    Fale com a Redação - leitor@grupofolha.com.br

    Problemas no aplicativo? - novasplataformas@grupofolha.com.br

    Publicidade

    Folha de S.Paulo 2024