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    Volta de Uribe ameaça Santos na Colômbia

    SYLVIA COLOMBO
    DE SÃO PAULO

    15/03/2014 03h24

    Fã do livro "Team of Rivals ""The Political Genius of Abraham Lincoln", Juan Manuel Santos, 62, decidiu fazer o mesmo que o presidente dos EUA (1809-1865) ao assumir o cargo de mandatário da Colômbia, em 2010. Cercou-se de rivais no governo, colocando-os em cargos importantes.

    O ex-candidato do Partido Liberal, Rafael Pardo, virou seu ministro do Trabalho. Germán Vargas, que concorrera pelo Cambio Radical, passou por vários ministérios. Até os "verdes", tradicionais opositores da direita colombiana, negociaram acordos com Santos. "Eu me inspirei em Lincoln mesmo", admitiu o presidente em entrevista ao jornal "El País".

    O que Santos não podia prever pela leitura do livro de Doris Kearns Goodwin (que deu origem ao filme "Lincoln", de Steven Spielberg) é que o controle da oposição escaparia de suas mãos e seria agarrado justamente por seu padrinho político e antecessor no cargo, o ex-presidente Álvaro Uribe, 61.

    Nas eleições legislativas do último domingo, o partido recém-criado por Uribe, o Centro Democrático, obteve 19 cadeiras no Senado com os votos de 2 milhões de colombianos. Uma delas será ocupada pelo próprio ex-presidente.

    De seu posto no Senado, Uribe pretende dificultar o que parecia ser uma fácil reeleição de Santos no pleito presidencial de maio. O ex-presidente apoia o candidato Óscar Iván Zuluaga, que busca amealhar os votos dos conservadores, hoje divididos.

    "Não se pode dizer que Santos saiu derrotado: sua base ainda tem maioria na câmara baixa e 47 senadores [o total é de 102]. Mas Uribe posicionou-se com força e pode mudar o quadro eleitoral", disse à Folha o analista político Darío Acevedo Carmona, da Universidad Nacional.

    Para ele, a ascensão do ex-presidente está relacionada às negociações de paz com as Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia), que Santos leva a cabo em Cuba e das quais se espera um desenlace até o fim do ano.

    "Apesar de os colombianos apoiarem um acordo, incomoda muito a falta de transparência nas tratativas entre governo e guerrilha. E principalmente o fato de que Santos se dispõe a permitir que as Farc disputem cadeiras no Parlamento", completa.

    Uribe diz considerar absurdo negociar um benefício como esse enquanto a guerrilha segue atuando em território colombiano. Por meio de sua ativa conta de Twitter e entrevistas a vários meios, prega o fim da negociação e defende a ação bélica contra as Farc.

    Já Santos diz que a negociação irá adiante e que o segredo é necessário, argumentando que o quadro final agradará aos colombianos. "Você não pode ver uma obra de arte antes de terminada, vai achá-la feia. É preciso ver o quadro pronto", resume.

    ECONOMIA EM ALTA

    Antes favorito para vencer com folga num primeiro turno, Santos vê crescer dificuldades com a provável inscrição do popular Enrique Peñalosa (Partido Verde) como também candidato ao pleito.

    Jogam a favor de Santos, porém, outros fatores. O país obteve avanços econômicos e se posicionou entre os preferidos dos investidores externos na América Latina. Estima-se que o crescimento em 2014 será de 4,5%, enquanto o desemprego caiu de 10% para 8,5% no ano passado.

    "São números excelentes. Mas hoje na Colômbia o assunto mais importante é a paz. A economia costuma justificar a popularidade de um governo, mas nem sempre. A Colômbia parece um pouco o Chile –bons índices não garantem nada", diz Carmona, referindo-se à vitória da esquerda chilena apesar do bom desempenho econômico da gestão de Sebastián Piñera.
    Outros fatores que tornam o quadro incerto são o número de indecisos, que ronda os 50%, e a abstenção, que no último domingo foi de 56%.

    Apesar disso, diz Juan Gabriel Tokatlian, da Universidade Torcuato di Tella (Buenos Aires), um acordo com as Farc apoiado pelas urnas será uma vitória importante. "Abrirá o país para um caminho inédito: aprofundamento de uma democracia real."

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