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    Expectativa de vida em Ruanda dobra nos últimos 20 anos

    SARAH BOSELEY
    DO "GUARDIAN"

    08/04/2014 10h55

    Vinte anos após o genocídio que deixou até 1 milhão de mortos, convertendo Ruanda num dos países mais miseráveis e doentes do mundo, a expectativa de vida dos ruandeses dobrou e o país está a caminho de tornar-se o primeiro na África a alcançar as metas de saúde dos objetivos de desenvolvimento do milênio definidas pela ONU.

    Essa análise dos avanços dramáticos obtidos ao longo de 20 anos foi feita pelo professor Paul Farmer, da universidade Harvard, e a ministra da Saúde de Ruanda, Agnes Binagwaho, com uma equipe de especialistas em saúde pública.

    Alexander Joe - 27.mai.94/AFP
    Menina ruandesa deixa a capital do país, Kigali, um mês após o genocídio que matou até um milhão
    Menina ruandesa deixa a capital do país, Kigali, um mês após o genocídio que matou até um milhão

    De acordo com o estudo, publicado no periódico médico "Lancet", "após um dos piores espasmos de violência em massa na história registrada, poucos imaginavam que Ruanda algum dia pudesse servir de exemplo a outros países engajados com a meta da igualdade de saúde."

    "Em 1994, o genocídio dos tutsis dizimou 1 milhão de pessoas em Ruanda (quase 20% da população do país na época) e levou ao deslocamento de milhões de outras. Nos cem dias seguintes à Páscoa de 1994, o país foi dilacerado por uma divisão pós-colonial acirrada, ligada aos construtos raciais eugênicos originários do século anterior -mas tristemente familiar àqueles que se recordam dos crimes nazistas. Quer fosse sobrevivente, perpetrador ou membro da diáspora, nenhum ruandês emergiu ileso."

    Os efeitos para a saúde foram duradouros. Estimadas 250 mil mulheres foram violentadas, e muitas delas se tornaram soropositivas.

    Uma epidemia de cólera surgiu nos campos de refugiados. Menos de um quarto das crianças em 1994 receberam a vacinação completa contra sarampo e pólio. O índice de mortalidade de crianças de até 5 anos era o mais alto do mundo, e a expectativa de vida era a mais baixa. Profissionais de saúde abandonaram o país, e hospitais e clínicas foram destruídos.

    Os autores do estudo observam que a assistência externa à saúde demorou a chegar. "Muitos viam Ruanda como uma causa perdida." Em 1995, o país recebeu US$0,50 per capita para a saúde, o valor mais baixo de qualquer país africano.

    AIDS

    A ajuda para enfrentar o flagelo da Aids que se espalhava pela África subsaariana representou uma virada. O ministério da Saúde aproveitou a oportunidade para reforçar o tratamento dos soropositivos em áreas rurais. Foi construído um sistema integrado de saúde primária, lado a lado com o tratamento do HIV. As redes de fornecimento de medicamentos contra a Aids foram usadas também para levar às clínicas todos os medicamentos essenciais de que elas precisavam.

    Em 2003 a Constituição de Ruanda passou a prever o "direito à saúde". Foram adotados planos de saúde comunitários, e verbas foram destinadas com base no desempenho dos planos.

    Cada vilarejo elege três profissionais de saúde comunitários, treinados e equipados com telefones celulares para conectar os pacientes com as clínicas e os hospitais.

    "Os resultados dessa abordagem ao sistema de saúde vêm sendo impressionantes num país que há apenas 20 anos estava em ruínas", diz o estudo.

    Hoje 97% das crianças ruandesas são vacinadas contra dez doenças, e os índices de mortalidade de crianças menores de 5 anos, mortalidade materna e mortes por tuberculose e malária caíram, juntamente com o índice de contaminação por HIV, embora ainda restem grandes desafios, entre os quais a subnutrição que afeta 44,7% das crianças.

    Farmer, co-fundador da organização Partners in Health, diz que há lições importantes a ser aprendidas. "Nos últimos dez anos, o índice de mortes por Aids e tuberculose caíram mais rapidamente em Ruanda que em qualquer outro país, em qualquer tempo."

    "Em meus 30 anos trabalhando com serviços de saúde para populações pobres e marginalizadas, nunca vi uma virada positiva tão dramática quanto a de Ruanda."

    Tradução de CLARA ALLAIN

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