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    Análise: Origem comum explica amor e ódio entre russos e ucranianos

    ANGELO SEGRILLO
    ESPECIAL PARA A FOLHA

    10/04/2014 03h00

    Para entender as razões do conflito na Ucrânia é preciso entender alguns dilemas de identidade do país.

    Ao contrário do Brasil e países ocidentais, onde a nacionalidade é determinada pelo local de nascimento (jus soli ou "direito do solo"), nos países eslavos é determinada pelo jus sanguinis ("direito do sangue"). A nacionalidade de uma pessoa é a de seu pai ou sua mãe.

    Os russos da Ucrânia, assim, se sentem no direito de ter escolas e documentos em sua própria língua, por serem uma nação diferente dentro de um mesmo Estado.

    O jus sanguinis complexifica processos de integração do que no Brasil chamamos de etnias, mas que lá são consideradas nações diferentes.

    A relação de amor/ódio dos ucranianos com a Rússia tem a ver com sua origem histórica comum. Originalmente, russos, bielorrussos e ucranianos eram um povo só, no chamado Estado Kievano (dos séculos 9 ao 12).

    Nos séculos 13-15, ao longo do domínio mongol na região, os três povos foram se diferenciando e, depois disso, os rumos de ucranianos e russos foram bem diferentes.

    Os russos formaram o estado moscovita czarista, um dos maiores impérios da história. A Ucrânia teve destino mais trágico, sendo dividida ao longo dos séculos entre Polônia, Rússia e Áustria.

    Apesar de os ucranianos como nação existirem há séculos, a Ucrânia só passou a existir como país independente estável em 1991, após a desintegração da URSS.

    Juntando-se a complexidade da determinação da nacionalidade pelo jus sanguinis com os ziguezagues das relações entre ucranianos e russos, pode-se entender melhor porque as relações internas na Ucrânia estão esgarçadas.

    Unindo isso ao fato de que externamente tanto a Rússia quanto os países ocidentais estão fazendo uma espécie de cabo de guerra para puxar o país à sua órbita, temos uma situação preocupante.

    O centenário da Primeira Guerra Mundial este ano relembra que conflitos localizados (principalmente na presença de alianças militares) podem descambar para consequências inesperadas.

    ANGELO SEGRILLO é professor de História Contemporânea da USP e autor de "Os Russos" (ed. Contexto)

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