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    Universidades dos EUA buscam meios de substituir raça como critério de seleção

    TAMAR LEWIN
    DO "NEW YORK TIMES"

    23/04/2014 13h59

    Os líderes do ensino superior dos Estados Unidos, incomodados com a decisão da Corte Suprema, na terça-feira, de sustentar a proibição imposta pelo Estado do Michigan a preferências raciais nas admissões universitárias, declararam que a decisão os conduziria a novos avanços na procura de meios alternativos de promover a diversidade nos corpos discentes.

    A raça continua a ser elemento permissível nas admissões de Estados que não proibiriam esse critério, e muitos educadores elogiaram a opinião dissidente da juíza Sonia Sotomayor, que enfatizou que a raça continua a ser importante. Ainda assim, eles afirmaram que a ação afirmativa parece ter um futuro limitado.

    "A maioria de nós começou a considerar outras variáveis que não a raça, especialmente alunos de primeira geração filhos de imigrantes e alunos de baixa renda", disse Muriel Howard, presidente da Associação Americana de Faculdades e Universidades estaduais. Em debates que estão acontecendo em diversas partes do país, muitos educadores argumentaram que métodos como esses produzem diversidade, mas de maneira muito menos efetiva.

    O Senado estadual da Califórnia, tentando ampliar a representação das minorias nos campi das universidades estaduais, aprovou este ano um projeto de lei que eliminaria a Proposição 209, uma decisão adotada por referendo estadual em 1996 para proibir preferências raciais de admissão. O projeto tinha o apoio de muitos latinos, mas foi combatido por muitos grupos asiáticos. No mês passado, o presidente da Assembleia estadual devolveu o texto ao Senado sem que qualquer ação quanto a ele tivesse sido adotada.

    Este mês, dando início ao que pode se provar uma nova rodada de processos quanto à ação afirmativa, o Project for Fair Representation, da Virgínia, criou sites com fotos de estudantes asiáticos, em um esforço por encontrar queixosos para processos por discriminação racial contra Harvard, a Universidade da Carolina do Norte e a Universidade de Wisconsin.

    Richard Kahlenberg, pesquisador sênior da Century Foundation, argumentou que as universidades podem criar diversidade sem levar raça em consideração, por meio de medidas como a admissão dos melhores alunos de cada escola secundária do Estado, a consideração da renda familiar e o fim dos privilégios para os filhos de ex-alunos.

    "As universidades não querem fazê-lo porque preferem montar uma classe de alunos ricos de todas as cores", ele afirmou.

    Alguns dos defensores das proibições estaduais à preferência racial nas admissões afirmaram que elas podem avançar como resultado da decisão da Corte Suprema.

    Roger Clegg, presidente do Centro pela Oportunidade Igual, uma organização conservadora, disse que esperava ver uma proliferação de proibições, quer por iniciativa dos legislativos estaduais, quer por propostas aprovadas em referendo.

    "Nem todos os Estados admitem propostas populares para referendos, mas nos casos em que elas não estejam disponíveis, os legislativos estaduais devem agir", ele afirmou. "E nos casos em que os legislativos estaduais não agirem, é preciso haver ação em nível local".

    Mas alguns dos principais proponentes das proibições disseram que não esperam que o número de Estados em que elas vigoram dispare - em parte porque acreditam que a luta contra as preferências raciais tenha no geral resultado em vitória.

    "Creio que a questão está em geral decidida", disse Ward Connerly, presidente do Instituto Americano dos Direitos Civis. "A maioria dos norte-americanos chegou à conclusão de que o governo não deve tratar as pessoas diferentemente com base em sua raça, e estão impacientes por continuarmos emaranhados quanto a isso".

    Connerly, antigo dirigente educacional na Califórnia que levou sua luta contra as preferências raciais a oito Estados, disse que não planejava trabalhar para organizar referendos em outros Estados, e que se surpreenderia caso alguma outra organização dedicasse recursos significativos a isso.

    "Creio que a direção em que avançaremos será a de as universidades tentarem desenvolver políticas de admissão que considerem fatores socioecônomicos, e isso não gerará muita oposição, desde que elas não criem diretrizes que cheirem demais a fatores raciais", disse Connerly.

    E Jennifer Gratz, queixosa em um processo contra a Universidade de Michigan e membro da XIV Foundation, disse que embora ela apoie novos esforços para estender as proibições a novos Estados, seu interesse agora era deixar a disputa no passado.

    "A essa altura, creio que precise existir um processo para iniciar um diálogo com as pessoas que acreditam precisar de preferências raciais para se sair bem, e dizer a elas que, nos dias de hoje, ninguém precisa de uma preferência governamental baseada na cor de sua pele", ela afirmou.

    Muita gente que apoiava o uso continuado de raça como critério de admissão disse que o foco crescente em fatores sociais e econômicos é uma questão de política prática.

    "O motivo para que estejamos caminhando na direção da ação afirmativa baseada em renda é que isso é politicamente viável, e permite uma coalizão que não vemos desde Bobby Kennedy entre os brancos de classe trabalhadora e as minorias", disse Anthony Carnevale, diretor do Centro para a Educação e a Força de Trabalho da Universidade de Georgetown. "Mas isso não resolverá o problema, porque nosso sistema de ensino superior hoje reproduz fielmente as diferenças de raça e classe existentes, de geração a geração".

    Desde 1994, ele diz, o ensino superior vem se dividindo claramente em duas categorias, com 85% dos estudantes brancos ingressando em faculdades com cursos de quatro anos e listadas no ranking das 500 melhores escolas do país e 75% dos estudantes negros e latinos ingressando em escolas de admissão aberta. "No fim, é impossível evitar a questão da raça", ele afirma.

    Kati Haycock, presidente do Education Trust, uma instituição progressista, disse que não nega que a maioria das pessoas que acompanham as tendências da Corte Suprema sabe que as políticas de admissão com base racial têm seus dias contados.

    "Mas continuo a desejar que as pessoas que dedicam tanto tempo a eliminar as preferências raciais no ensino superior dediquem igual esforço a eliminar as diferenças raciais no ensino básico e secundário, o que explica porque precisamos de preferências raciais [nas universidades]", ela diz.

    Tradução de PAULO MIGLIACCI

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