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    Análise: Mesmo com missão no Haiti, objetivo de projetar Brasil no exterior ainda está distante

    CARLOS EDUARDO LINS DA SILVA
    ESPECIAL PARA A FOLHA

    31/05/2014 02h00

    Há dez anos, em 18 de agosto, a seleção brasileira, com Ronaldo e Ronaldinho Gaúcho, venceu o Haiti por 6 a 0, em Porto Príncipe, no "jogo da paz", com o então presidente Lula na plateia.

    O evento simbolizou a presença brasileira à frente da missão da ONU desde 2004.

    A decisão de Lula de aceitar essa missão tinha a ver com sua ambição de projetar o país no cenário internacional como ator de primeira grandeza mesmo em temas fora de suas áreas naturais de interesse geopolítico.

    Entre os objetivos dessa agenda estava a conquista de assento permanente no Conselho de Segurança da ONU.

    Aos olhos da administração americana de George W. Bush, a disposição de Lula de assumir a responsabilidade pela Minustah foi muitíssimo bem recebida.

    O Haiti, país extremamente instável e pobre, foi motivo de preocupação para Washington, por sua localização geográfica, desde a sua independência em 1804.

    Dezenas de vezes tropas dos EUA foram enviadas para lá e o país ficou sob intervenção americana.

    Em 2004, comprometido com ações militares no Iraque e no Afeganistão, Bush queria muito outra nação para tomar conta do Haiti.

    O Brasil, com seu poderoso "soft power", do qual o futebol é parte significativa, servia perfeitamente a esse desejo dos EUA, e Bush expressou sua gratidão a Lula por ter assumido a missão.

    Mas o reconhecimento nunca evoluiu para nenhum tipo de apoio público à reivindicação brasileira da cadeira permanente no Conselho nem por parte de Bush nem de seu sucessor, Barack Obama, o qual, no entanto, em 2010, declarou que os EUA eram a favor do mesmo pleito por parte da Índia.

    A ação do Brasil no Haiti pode ter lhe rendido créditos de diversas espécies, apesar de a meta ainda estar tão distante quanto há uma década.

    O Exército brasileiro tem cumprido bem as tarefas de um efetivo de estabilização nacional, apesar dos enormes desafios que o Haiti tem enfrentado, inclusive o terremoto de 2010, e certamente acumulou experiência para ações similares e até missões específicas no Brasil.

    A reputação do Brasil como agente construtivo em ações de paz também se solidificou. Mas seu status mundial não cresceu como alguns esperavam, em especial após reveses como a tentativa de resolver a questão nuclear iraniana.

    E é discutível se o dinheiro e a energia ali investidos não poderiam ter sido mais bem empregados, inclusive no próprio Brasil. Além disso, como alguns céticos previam, a Minustah não melhorou muito as condições de vida do povo haitiano.

    CARLOS EDUARDO LINS DA SILVA é editor da revista "Política Externa" e Global Fellow do Woodrow Wilson Center

    Alex Argozino/Editoria de Arte/Folhapress

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