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    Milícia que lutou contra os EUA se mobiliza no Iraque

    SAMY ADGHIRNI
    ENVIADO ESPECIAL A NAJAF E BAGDÁ (IRAQUE)

    20/06/2014 03h00

    Um pelotão vestindo calça e camisa preta marcha em passo ritmado num bairro residencial de Najaf, capital religiosa do Iraque. Um comandante com farda militar aponta para eles e, orgulhoso, diz à Folha: "Estes são os homens que correram os americanos para fora daqui".

    Seis anos após ser oficialmente desmantelada, a milícia Exército Mahdi, famosa por combates implacáveis contra os EUA durante a ocupação, assumiu outra vez seu autoproclamado papel de defensora dos xiitas iraquianos.

    Desta vez, o inimigo não é uma força ocupante, mas um grupo sectário ultrarradical: o sunita Estado Islâmico no Iraque e no Levante, que tomou várias cidades e promete destruir santuários xiitas.

    O Exército Mahdi, porém, se opõe frontalmente ao apelo por ajuda dos EUA lançado por Maliki, também xiita, evidenciando rachas que ameaçam minar a frente de combate ao EIIL. "Temos 15 mil combatentes treinados e preparados. É suficiente. Não precisamos da ajuda de ninguém", diz o comandante.

    Alaa Al-Marjani/Reuters
    Milicianos do Exército Mahdi marcham durante treinamento em Najaf, no Iraque; grupo xiita se mobiliza contra os rebeldes sunitas
    Milicianos do grupo xiita Exército Mahdi marcham durante treinamento na cidade de Najaf, no Iraque

    A posição ecoa a hostilidade aos EUA dos moradores de Najaf, ainda traumatizados com o ataque americano que, em 2004, destruiu parte da majestosa mesquita que abriga o túmulo do imã Ali, primo e genro do profeta Maomé.

    O xeque Qassem Al Taee, um dos mais importantes clérigos de Najaf, rejeita qualquer plano de ajuda americana, sob pretexto de que foi Washington quem semeou a discórdia entre muçulmanos.

    "Foi a maneira que os americanos encontraram para enfraquecer o islã, única força capaz de resistir às suas ambições hegemônicas", afirma o xeque, reproduzindo ponto de vista comum no país.

    Mas a cidade sagrada tem vozes dissonantes, entre as quais a do clérigo Ali Basheer al-Najafi: "Se o Iraque precisar de apoio, devemos aceitar ajuda externa, desde que isso seja feito por meio de acordos internacionais".

    Em Bagdá, onde o clima de insegurança é maior do que em Najaf, parece haver mais simpatia por uma eventual intervenção americana. Um dos apoios mais expressivos é o da milícia xiita Asaeb Ahl al-Haq -surgida como dissidência do Exército Mahdi-, que se aliou a Maliki e é uma das mais ativas no combate aos sunitas ultrarradicais.

    "Se a coalizão de governo concordar, não vejo problema em pedir ajuda estrangeira", disse Ahmad al-Kinani, porta-voz da organização, ao receber a Folha num escritório repleto de homens à paisana com pistolas na cintura.

    Ironicamente, a mesma milícia é considerada próxima da Guarda Revolucionária do Irã, facção militar de elite envolvida em ações clandestinas em todo o Oriente Médio.

    "O Irã também pode nos ajudar, mas não queremos soldados estrangeiros pisando em nosso solo. Envio de armas é do que realmente precisamos", afirma Kinani.

    O jornalista Driss Jawad, próximo do poder, apoia uma intervenção estrangeira, desde que seja restrita aos EUA.

    Para Jawad, o governo pediu ajuda por saber que não pode depender só de forças regulares e unidades criadas para treinar cidadãos comuns.

    Entre civis sunitas há um sentimento de mal-estar, já que muitos são acusados pelos xiitas de ser cúmplices do avanço do EIIL. Mas o desempregado Hamman al-Karkuli destoa do estereótipo e defende o envolvimento americano.

    "Sou favorável a bombardeios pesados, mas não quero nem pensar em ver os EUA novamente instalados aqui."

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