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    No Brasil, Brics tentam deixar de ser só uma sigla

    PATRÍCIA CAMPOS MELLO
    DE SÃO PAULO

    13/07/2014 02h00

    Os líderes de Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul se reúnem a partir de terça (15) em Fortaleza para tentar provar que os Brics não são apenas uma sigla que junta países emergentes com muito pouco em comum.

    Com a criação do Novo Banco de Desenvolvimento, idealizado para ser uma alternativa ao Banco Mundial, e o Arranjo Contingente de Reservas, espécie de "FMI do B", os Brics querem mostrar que têm algo concreto que os une.

    Mas toda essa união de propósitos na área econômica não se repete em espinhosos temas políticos, tais como as ações da Rússia na Ucrânia e a reforma do Conselho de Segurança da ONU, que serão abordados de forma cuidadosa.

    Editoria de Arte/Folhapress

    O banco dos Brics terá capital de US$ 50 bilhões, que pode ser ampliado para US$ 100 bilhões, para financiar projetos de infraestrutura e sustentabilidade em países emergentes, sem se submeter às imposições dos países ricos no Banco Mundial.

    Já o arranjo contingente irá funcionar como um fundo de emergência de US$ 100 bilhões que pode ser sacado pelos países do bloco em crises de balanço de pagamentos.

    "A legitimidade dos Brics depende da realização desses projetos concretos, depois de seis anos de existência do grupo que estava apenas na retórica", diz Adriana Abdenur, professora de Relações Internacionais da PUC-Rio.

    No comunicado que está sendo elaborado, com cerca de 60 parágrafos, o clube destaca a "preocupação com a não implementação das reformas" nas organizações multilaterais, segundo a Folha apurou.

    A reforma para aumentar o poder dos países emergentes no FMI, uma grande bandeira dos Brics, foi vetada pelo Congresso dos EUA.

    Editoria de Arte/Folhapress

    A mudança acordada em 2010 ajudaria a refletir a maior importância que o grupo passou a ter no mundo.

    EM ABERTO

    Algumas questões estão em negociação. A China faz pressão para ter dominância no banco e queria ter mais capital que os outros países.

    Por enquanto, prevaleceu a ideia de participações iguais. Mas a chinesa Xangai faz lobby fortíssimo para sediar o banco.

    Segundo uma fonte ligada ao governo chinês, seria um importante "símbolo político" a China sediar um banco multilateral.

    Mas a África do Sul também está na disputa, reivindicando a sede como forma de estimular o desenvolvimento no país mais fraco do bloco.

    Outra aresta a ser aparada refere-se à Organização Mundial de Comércio. Índia e África do Sul ameaçam desistir do acordo de facilitação de comércio fechado na reunião de Bali, em dezembro.

    O acordo pode desburocratizar o comércio mundial e, embora modesto, salvou a OMC da irrelevância. O governo brasileiro luta para que os parceiros não recuem.

    Índia e África do Sul argumentam que vão ter que arcar com os custos de implementação e o acordo só ajuda os países ricos a venderem para os pobres. O assunto será discutido por ministros nesta segunda (14).

    A delicada situação de isolamento da Rússia, alvo de sanções e fuga de capital após a anexação da Crimeia, é outro abacaxi.

    Os russos querem que o comunicado da cúpula inclua um repúdio às sanções impostas ao país.

    A presidente Dilma Rousseff terá reunião com Putin e não quer desagradá-lo.

    O Brasil tem interesses comerciais. A Rússia é o segundo maior importador de carne bovina brasileira e pode comprar ainda mais para reduzir suas importações de EUA e UE.

    Segundo a Folha apurou, o comunicado deve condenar "sanções econômicas que violem o direito internacional". As punições de UE e EUA contra a Rússia não tiveram aval da ONU.

    REPRESSÃO RUSSA

    Mas a condenação está em um parágrafo separado daquele que menciona a crise na Ucrânia, que será abordada com o habitual cuidado diplomático, sublinhando a necessidade de diálogo e de evitar uma escalada.

    Todo esse esforço para não melindrar a Rússia deve desagradar entidades de direitos humanos. "Queremos que Dilma apoie a sociedade civil russa, que tem sofrido enorme repressão no governo Putin", diz Maria Laura Canineu, diretora da Human Rights Watch no Brasil.

    A linguagem sobre a reforma do Conselho de Segurança da ONU também deve ser bastante neutra, porque a China e Rússia já são membros permanentes e têm restrições à entrada de países como Índia e Japão.

    O evento teve de ser dividido, o primeiro dia em Fortaleza e o segundo, em Brasília, porque a capital cearense não tinha suítes presidenciais suficientes para abrigar os chefes de Estado da América do Sul que vêm no dia 16.

    No dia 16 de manhã, Dilma terá encontro com Narendra Modi, novo primeiro-ministro da Índia. No dia 17, o presidente chinês, Xi Jinping, faz visita de Estado.

    Devem ser assinados mais de 40 atos. Entre eles, exportação de 40 aeronaves da Embraer para a China.

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