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    Tunísia perde sua vida judaica

    CARLOTTA GALL
    DO "NEW YORK TIMES", EM DJERBA (TUNÍSIA)

    22/07/2014 02h00

    Numa manhã recente de sábado, apenas cinco homens recitavam orações no santuário da sinagoga Ghriba, a mais antiga no norte da África e o lugar mais sagrado dos judeus ortodoxos que vivem na ilha turística de Djerba.

    Era o fim de semana da peregrinação anual a Ghriba, quando centenas de judeus vindos de Israel, da França e dos Estados Unidos visitam a sinagoga para celebrar a festa de Lag b'Omer. Mas naquele sábado, quando apenas os judeus que vivem perto da sinagoga estavam presentes, a verdade ficou clara: o vilarejo ao lado da sinagoga encolheu para apenas cinco famílias de judeus, cerca de 40 pessoas.

    A Tunísia está no centro da vida judaica pelo menos desde os tempos romanos, mas hoje restam apenas 2.000 judeus no país, sendo que em 1948 havia 100 mil. Mais de mil deles vivem em Djerba, em dois vilarejos onde administram 14 sinagogas e uma escola talmúdica para cem alunos.

    Dizem que as fundações da sinagoga de Ghriba foram deitadas em 586 a.C., com uma pedra carregada do templo de Salomão. Mas a comunidade judaica está em declínio no país, fustigada por choques políticos, incluindo um ataque suicida mortal lançado por militantes islâmicos em 2002 e atos de violência após o levante popular de 2011 na Tunísia.

    Três ou quatro famílias partiram após a revolução que depôs o presidente Zine el-Abidine Ben Ali. Youssef Gamoun, que tem uma joalheria em Houmt Souk, disse: "Os empregos diminuíram e a criminalidade aumentou. Os turistas deixaram de vir."

    SAMUEL ARANDA PARA THE NEWYORK TIMES
    Hoje restam 2.000 judeusna Tunísia. Uma fiel na sinagoga de Ghriba
    Hoje restam 2.000 judeusna Tunísia. Uma fiel na sinagoga de Ghriba

    O atentado de 2002, em que foram mortas 21 pessoas, incluindo 14 turistas alemães, indicou que a sinagoga estava virando um alvo. O governo de Ben Ali abafou o ataque -as paredes chamuscadas foram repintadas em questão de horas-, e as ligações da Tunísia com a Al Qaeda nunca foram plenamente explicadas. Essa falta de abertura é o que impede turistas alemães de voltarem, disse Rene Trabelsi, agente turístico judeu.

    Mesmo assim, desde o ataque o governo tunisiano providenciou uma guarda policial permanente para proteger a sinagoga. Muitos tunisianos gostam de ressaltar sua história cosmopolita, mas o país é predominantemente muçulmano e foi afetado pelos choques vindos do Oriente Médio.

    Quando o novo ministro do Turismo, Amel Karboul, decidiu promover a peregrinação a Ghriba este ano para incentivar o turismo e exibir a minoria judia como exemplo de tolerância e pluralidade tunisianas, membros da Assembleia Nacional Constituinte ameaçaram censurá-lo por emitir documentos de viagem a turistas israelenses.

    "Quisemos deixar claro que pessoas com passaportes israelenses não devem ingressar no país", disse Issam Chebbi, membro da Assembleia que votou a favor da moção de não confiança. O furor político afastou visitantes judeus, mas alguns saudaram o fato de a questão ser discutida.

    Em dezembro, pela primeira vez, um judeu, René Trabelsi, foi aventado como candidato a ministro do Turismo. Ele não ganhou o cargo, mas muitos tunisianos puderam ver pela primeira vez um judeu falando árabe fluente, e reagiram positivamente.

    "Talvez os judeus vivessem escondidos antes disso, e hoje as pessoas acham a questão judaica importante", disse René Trabelsi. "Os tunisianos querem mostrar que são tolerantes."

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