• Mundo

    Saturday, 18-May-2024 08:01:55 -03

    Análise: Ataques israelenses miram a infraestrutura em Gaza

    IAN BLACK
    DO "GUARDIAN"

    30/07/2014 12h09

    O ataque de Israel contra a usina elétrica da Faixa de Gaza, na terça-feira (29), provavelmente vai alimentar especulações de que a infraestrutura civil do enclave seria um alvo intencional na guerra contra o Hamas.

    O Exército israelense disse que instalações críticas não militares não fazem parte de seus alvos, insistindo que seu objetivo é destruir alvos terroristas como os túneis e foguetes. Não comentou imediatamente o ataque à usina elétrica, que teria sido lançado desde tanques. Um representante disse ao "Guardian" que não se sabia o que tinha acontecido.

    A escala da crise humanitária na Faixa de Gaza assusta as organizações de defesa dos direitos humanos. Na semana passada, ONGs israelenses avisaram que mais de metade dos 1,2 milhão de habitantes da Faixa de Gaza estão sem acesso adequado a água e serviços de saneamento; esgoto não tratado está vazando de tubulações danificadas para as ruas. Centenas de milhares de palestinos estão sem eletricidade, outras centenas de milhares enfrentam falta aguda de necessidades básicas.

    Entre cinco e oito das dez linhas de transmissão que levam eletricidade de Israel à Faixa de Gaza foram desabilitadas, algumas delas por disparos de foguetes do Hamas. As equipes de manutenção não conseguem chegar até elas para fazer os reparos necessários. Os serviços hospitalares e de refrigeração estão quase no limite e também serão atingidos. O sofrimento dos civis deve intensificar a indignação internacional com a crise. "Sem eletricidade, sem água, sem esperança", tuitou a atriz Mia Farrow. "Pobre Faixa de Gaza, pobre população."

    Se o ataque à usina elétrica foi proposital, isso pode assinalar a aplicação da chamada "doutrina Dahiya" –a ideia de que Israel vai usar sua tecnologia e seu poder de fogo avassaladores para destruir muito mais do que apenas alvos estritamente militares. Se foi acidental, vai colocar em xeque as alegações de Israel de que mira contra alvos precisos.

    O conceito ganhou seu nome devido aos subúrbios da zona sul de Beirute (Dahiya, em árabe) onde o Hezbollah tinha seus redutos e que foram atingidos por bombardeios israelenses intensos na guerra de 2006, quando a organização militante xiita libanesa disparou foguetes contra Israel. A ideia é usar a força desproporcional para danificar bens e infraestrutura civis, na esperança de enfraquecer o apoio popular ao grupo armado que controla a área. O correspondente militar do "Haaretz" Amos Harel lembrou-se do exemplo libanês quando contemplou a devastação na Faixa de Gaza.

    Políticos israelenses influentes já pediram que o fornecimento de energia elétrica a Gaza fosse cortado, no passado. Zeev Elkin, presidente do comitê de Relações Exteriores e Defesa do Knesset, perguntou a Benjamin Netanyahu sobre a possibilidade de cortar a água e eletricidade enviadas por Israel ao território. Netanyahu respondeu que os assessores jurídicos do governo não o permitiriam. Mas Israel atacou a usina elétrica de Gaza em 2006 e 2009.

    A Faixa de Gaza produz uma parte considerável dos alimentos que consome, e a entrada de produtos de necessidade básica é permitida, apesar do bloqueio geral. Mas vários produtos estão em falta crescente porque os estoques foram reduzidos com o fim do Ramadã. Os bancos estão fechados. Há pouco dinheiro vivo circulando.

    As três semanas de combates limitaram o número de caminhões que entram na Faixa de Gaza vindos de Israel. De acordo com a ONG Gisha, que monitora o acesso, uma média de 81 caminhões carregados de mercadorias vem entrando em Gaza por dia, contra 194 por dia em junho –uma redução de 58%. Israel restringiu a passagem de mercadorias permitidas, autorizando a entrada apenas de alimentos, remédios e combustíveis, além de suprimentos humanitários.

    O Programa Mundial de Alimentos diz que mais de 115 mil pessoas na Faixa de Gaza precisam de assistência alimentar urgente. Desde que a crise começou a organização já levou rações de emergência para 100 mil pessoas, mas seus estoques de comida pronta para o consumo estão terminando.

    De olho no futuro, após a crise imediata, já se começa a falar em reconstrução. A ONU anunciou um plano de US$115 milhões de reconstrução de casas, escolas e hospitais na Faixa de Gaza. O custo certamente vai continuar a subir enquanto os combates prosseguirem.

    Tradução de CLARA ALLAIN

    Fale com a Redação - leitor@grupofolha.com.br

    Problemas no aplicativo? - novasplataformas@grupofolha.com.br

    Publicidade

    Folha de S.Paulo 2024