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    Quanto pior a crise econômica, melhores as piadas na Venezuela

    PETER MURPHY
    DA REUTERS, EM CARACAS

    30/07/2014 14h53

    O gênio da lâmpada que um menino venezuelano atônito tem nas mãos declara: "Você pode pedir o que quiser - menos papel higiênico".

    A inflação mais alta do mundo e a escassez de produtos básicos como o leite e o papel higiênico não são causa de alegria para os venezuelanos, mas eles encontram consolo na comédia, que vem florescendo com sátiras aos problemas de governo causadores das dificuldades econômicas.

    Jorge Silva - 17.mai.2013/Reuters
    Venezuelanos formam fila para comprar papel higiênico; escassez do produto virou piada no país
    Venezuelanos formam fila para comprar papel higiênico; escassez do produto virou piada no país

    Por meio de charges como a do gênio, humor stand-up e sátira online, o humor se tornou uma forma proeminente e pungente de crítica, em um momento no qual a mídia convencional vem exercitando mais autocensura.

    "A despeito do petróleo a US$ 100 por barril, a Venezuela vive a pior crise econômica de sua História - é o toque de Midas invertido", disse o humorista stand-up Laureano Marquez antes de se apresentar diante de uma plateia de 600 pessoas em um teatro de Caracas.

    Sua apresentação de 90 minutos é uma crítica bem humorada a problemas como as filas para a compra de comida e a escassez de remédios, passando pela corrupção do governo e por tribunais parcialíssimos. O humorista descreve seu show como uma forma de protesto, por conta dos temas sérios que ele satiriza.

    "O humor pode ser a mais séria atitude da humanidade, porque o empregamos para dizer coisas muito dolorosas", diz Marquez, 50, que começou esquentando a plateia com piadas sobre as dificuldades enfrentadas pelos venezuelanos nas compras semanais, e diante das filas e discussões causadas pela escassez.

    Depois da apresentação, um dos espectadores a definiu como "terapia".

    Os imponentes arranha-céus de Caracas são um testamento a décadas de riqueza petroleira, e agravam a sensação de incompreensão diante das prateleiras vazias e das pilhas de dinheiro com valor cada vez menor.

    Na rua, os venezuelanos brincam constantemente sobre a situação. "Cuidado para não ser roubado! Esconda tudo!", gritam as pessoas quando veem um consumidor carregando farinha, óleo ou açúcar. "Bem-vindos a Havana", os transeuntes de vez em quando brincam ao passar pelos compatriotas esperando em fila.

    "Ironicamente, quanto pior fica o país, melhor fica o humor", disse o cartunista Eduardo Sanabria, ou Edo, que desenha charges para o diário "El Mundo" há sete anos.

    Edo imaginava que talvez fosse difícil encontrar inspiração para o seu trabalho depois da morte de Hugo Chávez, vítima do câncer, em março de 2013, mas diz que o governo de seu sucessor, Nicolás Maduro, oferece material abundante. Maduro vem se apegando ferrenhamente à maioria das políticas da era de Chávez.

    "Pode-se sentir que esse governo é mais sensível a críticas", disse o cartunista Edo. "Chávez conseguia conviver com críticas bem humoradas, porque tinha carisma".

    Ainda que a maioria dos humoristas conhecidos pareçam favorecer a oposição, os partidos inimigos do governo não escapam ao ridículo.

    As divisões na coalizão oposicionista Mesa de Unidade Democrática, por exemplo, são alvo de zombaria em uma charge que mostra uma confusão de placas com os diferentes objetivos dos oposicionistas, ostentando setas que apontam em todas as direções.

    Tradução de PAULO MIGLIACCI

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