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    Comunidade judaica brasileira faz críticas ao governo Dilma

    MORRIS KACHANI
    DE SÃO PAULO

    01/08/2014 08h00

    Lideranças e personalidades da comunidade judaica no Brasil diferem no tom, mas concordam que as críticas do Itamaraty à ofensiva de Israel sobre Gaza custarão caro à presidente Dilma Rousseff –inclusive em votos.

    Há cerca de 120 mil judeus que vivem no país, uma comunidade pequena numericamente, mas influente sobretudo em Estados importantes como Rio e São Paulo.

    Para Claudio Lottenberg, presidente da Conib (Confederação Israelita do Brasil), principal entidade judaica do país, a polêmica nota do governo, que condenou o uso desproporcional de força por Israel e não citou os foguetes lançados pelo Hamas, "não vai passar despercebida".

    "Evidentemente que isso tudo tem seu peso. Embora os interesses da comunidade judaica sejam maiores que o episódio atual, é claro que há uma preocupação com a política externa, pois o Estado de Israel está ligado aos judeus" afirma Lottenberg, ex-secretário de Saúde de São Paulo na gestão de José Serra (PSDB).

    "Pergunto o que é desproporcional. Não se trata de uma população indefesa, ela está armada até os dentes e preparada para cometer atos terroristas", declara.

    Para Mario Fleck, presidente da Federação Israelita de São Paulo, a diplomacia do Itamaraty "é uma coisa que não dá para entender". "Mandam chamar o embaixador brasileiro de Tel Aviv, mas não se pronunciam sobre um conflito muito mais grave em termos de direitos humanos, a guerra na Síria."

    O historiador Michel Gherman, pesquisador do Núcleo de Estudos Judaicos da UFRJ, acredita que o posicionamento do governo deve ter um impacto negativo no voto dos judeus cariocas. "Em São Paulo o voto no PSDB sempre foi hegemônico. No Rio é diferente, um pouco mais dividido. Mas muita gente que achava que o governo Dilma era mais próximo dos israelenses do que o governo Lula começa a se decepcionar."

    Para Gherman, o episódio demonstra falta de conhecimento, tanto por parte da diplomacia brasileira como da israelense. Em resposta à nota do Itamaraty, o porta voz da chancelaria israelense mencionou a derrota sofrida pelo Brasil contra a Alemanha por 7 a 1, na Copa.

    "Vincular elementos da cultura brasileira como o futebol só atrapalha o entendimento e gera antipatia com o povo judeu. Será que o porta-voz agiu de maneira sionista? Em minha opinião, não."

    Embora todos critiquem o Itamaraty, os pontos de vista sobre a ação israelense em Gaza não convergem. A comunidade é diversa e reage de forma diversa.

    O posicionamento mais comum é de apoio irrestrito a Israel, especialmente entre os mais velhos e religiosos.

    Mas há uma corrente de esquerda que critica abertamente o governo Netanyahu, como o próprio Gherman.

    "A lógica propagada de que não há com quem conversar é confortável tanto para a direita sionista como para o Hamas, que estava enfraquecido, endividado e com poucos aliados externos."

    Gherman lembra que tanto a esquerda israelense, que ganhou maior representatividade no Parlamento nas últimas eleições, como o presidente da Autoridade Palestina, Mahmoud Abbas, que conseguiu costurar um governo de unidade nacional com o Hamas, vinham se fortalecendo e ganhando legitimidade antes do conflito.

    Em nota, a diretoria do centro cultural Casa do Povo, entidade judaica associada ao debate crítico, tendo exercido papel de resistência à ditadura militar, afirma:

    "A carência de lideranças que apoiem caminhos de diálogo e compromissos concretos possibilitou o fortalecimento de grupos internos, de lado a lado, que turvam o debate e favorecem a violência e os confrontos armados. É preciso romper esse ciclo, fortalecendo as vozes que buscam o entendimento".

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