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    Colômbia lembra 25 anos do assassinato de presidenciável

    SYLVIA COLOMBO
    DE SÃO PAULO

    17/08/2014 02h00

    Fazer comícios, acenar sorridente para o público e posar com bebês. São coisas que qualquer candidato a presidente faz.

    Porém, nos sombrios anos 1980, quando a Colômbia se enfrentava com os poderosos cartéis da droga, Luis Carlos Galán, então aos 45 anos, se acostumara também a outra atividade: ir a funerais.

    O candidato do partido Liberal às eleições de 1986 e de 1990 enterrara o amigo e então ministro da Justiça, Rodolfo Lara Bonilla, o dono do jornal "El Espectador", Guillermo Cano, chefes da polícia, magistrados, jornalistas e congressistas. Todos mortos em atentados do tráfico.

    Os crimes tinham o objetivo de forçar o governo a eliminar a extradição de criminosos aos EUA. "Prefiro uma tumba na Colômbia do que uma prisão nos EUA", dizia Pablo Escobar Gavíria (1949-1993), líder do Cartel de Medellín.

    Mesmo em penitenciárias colombianas, os senhores da droga continuavam controlando o tráfico. Numa prisão dos EUA, isso era impossível.

    Ameaçado de morte, e tendo sobrevivido a atentados anteriores, Galán sabia que estava entre os próximos da lista de Escobar. Sua mulher e filhos pediram que interrompesse a campanha eleitoral. Galán recusou-se.

    Em 18 de agosto de 1989, contrariando orientações, Galán fez um discurso no município de Soacha, próximo a Bogotá. As imagens do candidato sendo alvejado por tiros assombraram o país.

    ATUALMENTE
    O aniversário de 25 anos do magnicídio, lembrado agora na Colômbia com lançamentos de livros, debates políticos e acadêmicos, coincide com a retomada das negociações de paz entre governo e as Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia), herdeiras do "negócio" deixado por Escobar.

    Iniciadas há 20 meses, as conversas agora têm a participação das vítimas, que pedem restituição de terras e indenização por seus mortos.

    As Farc, que apoiaram o presidente Juan Manuel Santos na campanha pela reeleição, voltaram nas últimas semanas a cometer atentados.

    Na terça (12), os guerrilheiros pediram que Santos deixe de pagar juros da dívida externa para ressarcir vítimas. O presidente ameaçou interromper as conversas se a violência continuar.

    "A filosofia de que tudo vale, própria dos mafiosos, se implantou em alguns setores da sociedade e da política. A morte de Galán continua sendo um trauma nacional. O assassinato mostrou ao país como são perigosos os criminosos, e provocou uma profunda reação de repúdio, indignação e medo", diz à Folha o escritor e ex-colega de Galán na universidade de direito, Daniel Samper Pizano.

    A violência na Colômbia já causou mais de 250 mil mortes e o deslocamento de mais de 5 milhões de pessoas de suas casas.

    Para especialistas, a questão está na divisão entre a elite bogotana e o campo. Apesar de ter uma das melhores taxas de crescimento na América Latina, com expectativa de chegar a 4,7% em 2014, a Colômbia é um dos países mais desiguais da região.

    O 1% mais rico tem 20% da renda, e a classe média é uma das mais enxutas do hemisfério, representando apenas 25% da sociedade.

    "Se amanhã desaparecer a violência do narcotráfico, ainda assim a desigualdade econômica e educativa seguirá produzindo tensões" diz Pizano. "Galán era dos que tentavam colocar a serviço da mudança e da democracia o poder que herdou de seus ilustres antepassados."

    Fundador do partido do Novo Liberalismo, Galán havia sido ministro da Educação e defendia uma ofensiva pela via institucional para acabar com o narcotráfico. Após sua morte, seu então assessor, Cesar Gavíria, o sucedeu (1990-1994) e liderou a operação que resultou na execução de Escobar.

    CRIME
    O julgamento dos assassinos de Galán não está concluído. Um dos autores intelectuais do crime, o rival político Alberto Santofímio Botero, só em 2011 começou a cumprir pena de 24 anos.

    Já o comandante da polícia acusado de ter deixado os sicários atuarem ainda responde a processo. Os autores materiais do crime cumpriram penas leves.

    No Congresso, os herdeiros de Galán apoiam Santos. Juan Manuel, 42, e Carlos Fernando, 40, são senadores. O primeiro lidera um grupo de congressistas que defende a legalização da maconha.

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