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    Madrugada de protestos em Ferguson termina com seis feridos e 31 detidos

    RAUL JUSTE LORES
    ENVIADO ESPECIAL A FERGUSON (MISSOURI, EUA)

    19/08/2014 06h45

    Bombas de efeito moral e muito gás lacrimogêneo foram utilizados contra menos de cem manifestantes, um grupo modesto diante de estimados 200 jornalistas e centenas de policiais na nona noite de protestos violentos em Ferguson, Missouri, nesta segunda (18).

    A população local tem ido à rua dia e noite protestar contra a violência policial, depois do assassinato do adolescente negro Michael Brown, 18, por um policial branco, Darren Wilson, 28, em meio a um longo histórico de tensões raciais.

    Apesar da intervenção da Guarda Nacional, da Polícia Rodoviária e dos pedidos do presidente Barack Obama por "calma" e críticas ao "uso excessivo de força", a cidade de 20 mil habitantes na região metropolitana de Saint Louis continuou a viver outra noite de caos, com 31 manifestantes detidos e apreensão de duas armas de fogo.

    Duas pessoas que participavam no protesto foram feridas por tiros dos manifestantes, anunciou o chefe de polícia de Fergurson, Ronald Johnson. Ele afirmou que os agentes não abriram fogo. Outros quatro policiais ficaram feridos no ato.

    Por ordem policial, a principal avenida local foi isolada para o tráfico de veículos e os manifestantes tinham que "circular" o tempo inteiro, andando de um lado para o outro durante o dia, para evitar aglomerações.

    Michael B. Thomas/AFP
    Policiais disparam bombas de gás durante nova noite de violência em Ferguson, no Estado americano de Missouri
    Policiais disparam bombas de gás durante nova noite de violência em Ferguson, no Estado do Missouri

    À noite, depois de um dia inteiro de caminhadas e protestos, o número de vizinhos com cartazes era bem pequeno, com dizeres como "Não atire", "Primavera Negra" e "Ferguson - Gaza Unidos". Alguns gritavam "Tiras assassinos, vão embora!".

    Pequenos grupos violentos, segundo a polícia, atiraram coquetéis molotov contra as viaturas e deram tiros para o alto. Os grupos violentos acabaram esvaziando um protesto numeroso, ate então pacifico, que tinha acontecido ao longo do dia com centenas de pessoas.

    No final da noite, uma lojinha de bebidas e cigarros de uma família de imigrantes do Kuwait foi saqueada e parcialmente destruída.

    Oficialmente não houve toque de recolher, ao contrário de noites anteriores, mas vizinhos contavam que a polícia pedia para pedestres voltarem para casa. Colunas de policiais marchavam de um lado para outro. O gás que atingia narinas e olhos em segundos esvaziou rapidamente a área.

    Centenas de jornalistas, em sua maioria de redes de televisão, com grandes vans e equipamento, ficaram confinados em uma "área designada para a mídia", no estacionamento de um centro comercial térreo, que é o centro da vida da cidade. Policiais sem identificação no uniforme repetiam que os jornalistas não podiam circular "por razões de segurança". Diziam a todo momento "vão embora, vão pra casa".

    Vários repórteres usavam máscaras de gás e fotógrafos andavam com coletes antibala. Para chegar à "área designada" a jornalistas, longe dos manifestantes, a reportagem da Folha passou por quatro postos de controle, com viaturas policiais fechando cruzamentos, e tinha que apresentar sua credencial de imprensa cada vez. "É inseguro lá", diziam. Painéis eletrônicos de trânsito diziam "Só veículos de emergência".

    De dentro de tanques blindados, policiais usavam altos falantes dizendo que "mídia sem credenciais precisa ir embora imediatamente". Dezenas de blogueiros e "repórteres-cidadãos" locais se sentiam intimidados com as mensagens.

    CASO

    A polícia levou quase uma semana para revelar a identidade do policial que deu os seis tiros em Brown.

    Junto com a revelação, a polícia divulgou um vídeo em que mostrava o adolescente roubando cigarros na loja de conveniência diante da qual morreria minutos depois.

    No fim de semana, protestando que a polícia tratava de culpar a vítima por seu homicídio, centenas de pessoas engrossaram os protestos. Moradores se queixam de racismo policial –em uma cidade onde 2/3 da população é negra, apenas 3 dos 56 policiais locais são negros.

    Na madrugada desta terça (19), um capelão militar fez orações por "entendimento e paz" antes do início de uma entrevista coletiva do capitão Johnson, chefe da Polícia Rodoviária que está no comando da segurança local.

    Para Johnson, minorias violentas, com pessoas vindas de Nova York e da California, estão por trás da violência.

    Ele justificou as medidas extremas e disse que a população local já quer "voltar à normalidade". Desculpou-se da prisão de jornalistas. "É fácil distinguir alguém que carrega uma câmara de US$ 50 mil, mas tem muita gente aqui apenas com um celular".

    Por volta das 2 da manhã, apenas jornalistas e policiais ocupavam a principal avenida.

    Na segunda, as tropas da Guarda Nacional foram mobilizadas em Ferguson por ordem do governador de Missouri, Jay Nixon.

    Obama, o primeiro presidente afro-americano da história dos Estados Unidos, anunciou que enviará o secretário de Justiça, o também afro-americano Eric Holder, a Ferguson.

    A polícia alega que Brown tentou retirar a arma do agente no momento dos tiros. Mas testemunhas afirmam que quando recebeu os tiros, o jovem estava com as mãos para o alto, sem opor nenhuma resistência.

    Os resultados de autópsias feitas por autoridades federais e locais ainda não foram divulgados. Uma autópsia particular feita pela família de Brown mostrou que ele foi baleado pelo menos seis vezes, incluindo duas vezes na cabeça.

    O policial Wilson, 28, está em licença remunerada e sob investigação criminal.

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