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    Epidemia de ebola expõe erros de presidente liberiana

    HELENE COOPER
    DO "NEW YORK TIMES"

    11/11/2014 02h00

    MONRÓVIA, Libéria - A presidente esperou até seus familiares estarem acomodados em volta da mesa do jantar para anunciar, sem fanfarra, a deserção mais recente de um membro de seu gabinete. "Perdi meu ministro da Justiça hoje", disse.

    Enquanto pipocavam perguntas em volta da mesa, a presidente, tendo dito tudo o que pretendia, terminou seu almoço de "corned beef" enlatado e arroz -o equivalente na Libéria a um prato de miojo- e se levantou.
    "Estamos atrasados", anunciou, sem mencionar o fato de que todos a tinham esperado por quatro horas. "Vamos andando."

    Nos últimos oito anos, a presidente Ellen Johnson Sirleaf, 76, vem percorrendo uma corda bamba política precária. Como a primeira líder eleita da Libéria, após uma guerra civil devastadora, ela tem tido que manobrar inimigos e aliados enquanto impulsiona o país em sua primeira trajetória de crescimento econômico em décadas.

    Agora o ebola interrompeu muitos desses avanços. Os investidores estrangeiros que cortejaram Johnson Sirleaf, ex-burocrata do Banco Mundial, fugiram. Empresas foram fechadas, funcionários foram embora e a construção de rodovias parou.

    Num país onde menos de 50% das crianças em idade escolar estavam matriculadas na escola primária, as escolas públicas estão fechadas há meses. O Banco Mundial avisa que o ebola pode fazer a frágil economia da Libéria despencar quase 12%. Todas menos duas linhas aéreas estrangeiras suspenderam seus voos ao país.

    "No momento, toda a atenção internacional está voltada ao ebola", disse a presidente, aludindo aos críticos, entre os quais figura a ONU, que dizem que ela tem estado mais preocupada com a economia que com a catástrofe de saúde. "Se não nos concentrarmos sobre nossa economia, não poderemos sustentá-la quando essa atenção acabar."

    Johnson Sirleaf é a primeira mulher a ser eleita presidente de um país africano, é ganhadora do Nobel da Paz e provavelmente a líder mais conhecida do continente. Depois de ocupar um cargo burocrático de baixo nível, ela se tornou uma das poucas altas funcionárias liberianas não executada por pelotão de fuzilamento no golpe militar de 1980.

    Mas o ebola ameaça acabar com esse legado. A epidemia expôs deficiências avassaladoras no sistema de saúde público liberiano, infraestrutura decrépita que não foi modernizada mais de uma década depois da guerra e corrupção endêmica que, não obstante as declarações de "tolerância zero" feitas por Sirleaf, continuam a caracterizar as interações entre os liberianos e o governo.

    Karin Landgren, representante especial na Libéria do secretário-geral da ONU, disse: "O ebola mostrou as muitas coisas que não foram feitas adequadamente. Coisas muito concretas, como o sistema de saúde."

    Quando Johnson Sirleaf assumiu o poder, em 2006, o índice de desemprego era tão alto que ninguém mais se dava ao trabalho de calculá-lo. Não havia água corrente ou luz elétrica, porque milicianos tinham bombardeado a usina elétrica do país. As crianças morriam de doenças curáveis como tuberculose, malária e sarampo. Mesmo entre as que não adoeciam, poucas frequentavam a escola. A dívida da Libéria chegava a US$ 4,7 bilhões.

    De acordo com todos os indicadores econômicos, o país avançou muito desde então.

    Muitos liberianos, incluindo alguns críticos de Johnson Sirleaf, dizem que a Libéria não tem outro líder político que seja capaz de conduzir o país para fora da crise do ebola. Quando ela, em 9 de setembro, escreveu uma carta ao presidente Obama, pedindo ajuda, a resposta chegou dias depois e superou de longe as expectativas: 4.000 militares americanos para construir 18 unidades de tratamento do ebola.

    Agora a presidente está tentando fazer uso do ebola para levar adiante projetos econômicos mais amplos, como o conserto da pista de pouso do aeroporto. "O apoio que está chegando ao país não pode ser todo voltado ao ebola", disse Sirleaf.

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