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    Obama dividiu imigrantes ilegais em categorias, critica historiadora

    ISABEL FLECK
    DE SÃO PAULO

    23/11/2014 02h05

    Poucas horas após o presidente Barack Obama anunciar ações executivas que concederão alívio temporário para cerca de 5 milhões dos 11,4 milhões de imigrantes ilegais nos EUA, a historiadora americana e ativista dos direitos dos imigrantes Aviva Chomsky se dizia "feliz" e "com raiva" ao mesmo tempo.

    Feliz "pelos amigos em situação irregular que se beneficiarão das medidas" –em sua maioria pais de crianças que já são cidadãs americanas. Com raiva por todos os que ficaram de fora.

    "O tom de Obama foi definitivamente punitivo, dividindo os não documentados em duas categorias: os que merecem uma chance e aqueles que são criminosos'", disse ela, filha do linguista Noam Chomsky e autora de "Undocumented: How Immigration Became Illegal" (Não documentados: Como a imigração se tornou ilegal), de 2014.

    À Folha, de Boston, ela disse temer que essa "divisão" justifique a persistência de elevadas taxas de deportação e discriminação em relação aos não contemplados pela ação de Obama. Leia a entrevista a seguir.

    Folha - As ações anunciadas por Obama contribuem, de fato, para resolver o problema da imigração?

    Aviva Chomsky - Obama fez algumas mudanças que vão proporcionar um alívio temporário para algumas pessoas. É um número significativo, mas ainda é menos do que a metade.

    Ele também mandou uma mensagem dúbia aos americanos sobre as pessoas em situação irregular. Começou falando sobre "segurança das fronteiras" –o que, na verdade, significa a militarização para aumentar o sofrimento e as mortes de quem tenta atravessar–, mas também falou, de forma positiva, sobre imigrantes em situação irregular. Ele realmente parece estar jogando para os dois lados.

    Obama também estabeleceu "prioridades de deportação". Isso pode representar um problema ainda maior para quem não foi beneficiado?

    É difícil saber agora como as novas políticas serão aplicadas. Mas o tom do discurso de Obama foi definitivamente punitivo, dividindo os não documentados em duas categorias: os que merecem uma chance e aqueles que são "criminosos". E isso poderia realmente justificar a persistência de elevadas taxas de deportação e discriminação contra aqueles que estão excluídos dessas ações.

    A definição de "criminoso" de Obama é um conceito muito amplo, porque também incluiu aqueles que são culpados apenas por violações de imigração e que não representam uma ameaça.

    A permissão de trabalho para pais de crianças que já são cidadãs será temporária. O que isso significa para um imigrante?

    Essa ação vai adiar o temor de deportação. Tivemos programas semelhantes no passado, que seguem até hoje, como o oferecido a cidadãos de certos países em situação de guerra. Sob esse status, eles não têm alguns direitos. Não podem, por exemplo, viajar para fora do país ou fazer planos para o futuro, porque o seu estado pode ser alterado a qualquer momento.

    É melhor do que não ter um status legal, mas está longe de ser uma garantia de estabilidade ou segurança.

    O projeto de lei rejeitado na Câmara teria sido uma melhor opção para os imigrantes em situação irregular?

    As propostas de reforma imigratória que circularam no Congresso nos últimos anos têm sido tão punitivas e limitadas que é difícil enxergar algo positivo nelas.

    Ainda assim, elas ao menos concederiam, para as pessoas beneficiadas, um status legal completo e um caminho para se tornarem cidadãs, ao invés de apenas um estado semilegal temporário, revogável.

    Portanto, para aqueles elegíveis, uma reforma global teria sido melhor. Para os não beneficiados, seria ainda pior, por causa das restrições, e punições adicionais.

    Qual deve ser o próximo passo para corrigir o falido sistema de imigração', como prometeu Obama?

    Para resolver o chamado "problema da imigração", é preciso olhar para as políticas externa e econômica dos EUA, que são a causa da migração. A maioria dos migrantes ficaria em seus países se pudessem sustentar suas famílias e ter acesso a cuidados de saúde e educação lá.

    Também poderíamos reduzir o programa de militarização de fronteira, que não diminuiu a entrada, mas contribuiu para um aumento significativo no número de pessoas em situação irregular no país que, sem poder cruzar várias vezes pela fronteira, se estabeleceram no país.

    Muitos Estados e municípios já estão tomando medidas em áreas em que têm jurisdição, como permitindo a quem não tem documentos tirar carteira de motorista.

    Como os republicanos devem lidar com a questão da imigração agora, inclusive mirando as eleições de 2016?

    Eles devem mudar sua posição sobre a imigração, se estamos falando de um imperativo moral.

    Mas a maioria dos democratas e republicanos estão de olho em suas perspectivas eleitorais. Os democratas estão apostando no voto latino, os republicanos, no voto anti-imigrante.

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