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    Júri rejeita indiciar policial por morte de jovem negro nos EUA

    RAUL JUSTE LORES
    DE WASHINGTON

    25/11/2014 00h27

    O grande júri de Saint Louis decidiu não indiciar o policial Darrell Wilson, 28, que matou com seis tiros o jovem negro Michael Brown, 18, diante de uma loja de conveniência em Ferguson, Estado do Missouri, na tarde de 9 de agosto. Brown estava desarmado.

    Em entrevista coletiva na noite de segunda (24), o promotor de Saint Louis, Robert McCulloch, disse que o júri fez uma "investigação exaustiva" e que os jurados não encontraram motivos para indiciar o policial. Ele entregaria detalhes sobre o julgamento posteriormente.

    A família de Michael Brown emitiu comunicado dizendo-se "profundamente decepcionada" com a decisão. Durante a madrugada, manifestantes queimaram e depredaram veículos e saquearam lojas. Doze prédios ficaram em chamas e ao menos 29 pessoas foram detidas.

    O presidente Barack Obama disse em pronunciamento que "temos um grande desafio como nação, encarar a desconfiança entre policiais e as comunidades negras pelo legado da segregação". Pediu à polícia de Ferguson para demonstrar "cuidado" e "contenção", e "trabalhar com a comunidade, não contra a comunidade, só assim dá para se identificar quem quer protestos pacíficos, quem não".

    Citando o pai de Michael Brown, ele disse que destruir propriedade ou machucar terceiros não é a resposta. Disse que os EUA são um "país de leis, temos que aceitar a decisão, mesmo quem não concorde". Mas disse que ainda persiste "diferenças em como a Justiça trata os negros, a comunidade negra não inventa isso".

    A morte se tornou o caso mais famoso entre várias outras mortes de jovens negros neste ano causadas por policiais brancos. A Justiça local levou seis horas para fazer público o veredito. Especula-se que a demora foi provocada por receios de uma reação violenta à decisão, esperando a noite chegar para que escolas e estabelecimentos comerciais estivessem já fechados e a maioria da população em casa.

    O governador de Missouri, Jay Nixon, decretou estado de emergência no Estado mesmo antes do anúncio do veredito, com temor de protestos violentos.

    O juri, na vizinha (e mais rica) cidade de Clayton, de população de maioria branca, foi formado por nove brancos e três negros.

    Wilson jamais falou publicamente desde a morte de Brown, mas testemunhou para os jurados.

    Logo após a morte de Brown, a polícia mandou tanques, blindados e centenas de policiais usando uniformes camuflados para conter protestos seguidos de saques e vandalismo em Ferguson, o que também provocou um debate nacional sobre a excessiva militarização da polícia americana. Para analistas, a repressão aumentou a violência e reforçou o sentimento de discriminação daquela comunidade.

    A conduta das autoridades e da polícia de Ferguson foi criticada desde o início do caso. O corpo de Brown ficou quatro horas e meia estendido no chão diante de uma loja de conveniência após receber os seis tiros; a polícia demorou vários dias para divulgar a identidade do policial e o fez no mesmo dia em que divulgou um vídeo de Brown furtando a loja de conveniência, mas sem maiores explicações. Para muitos, a polícia estava querendo "culpar" a vítima.

    O presidente Barack Obama então mandou seu ministro da Justiça, Eric Holder, a Ferguson para se encontrar com os pais do jovem.

    A pequena Ferguson, cidade de 21 mil habitantes, com 70% da população negra, também serviu de símbolo de divisões raciais persistentes 50 anos depois do fim da segregação racial nos EUA. Dos 53 policiais locais, apenas três são negros. Quase todos moram em subúrbios de maioria branca fora de Ferguson. O prefeito da cidade, o republicano James Knowles 3º (branco), reclamou da "má imagem" que a cidade estava "sofrendo" na mídia.

    Já em Saint Louis, a maior cidade do Estado do Missouri, bastante segregada em linhas raciais, houve protestos organizados pela população branca a favor do policial. Comunidades em redes sociais foram criadas para arrecadar fundos para Wilson, com 30 mil membros e dizendo que ele atirou em Brown por "legítima defesa".

    Quando a Folha esteve em Ferguson, em agosto passado, pôde presenciar a mão pesada da polícia local. Repórteres eram constantemente empurrados para uma "área designada para a mídia", longe dos protestos; já os manifestantes, poucas dezenas durante o dia, centenas durante a noite, eram proibidos de formar qualquer aglomeração.

    Tinham que ficar caminhando sem parar de um lado para o outro, sob o sol forte e temperaturas acima de 30ºC. Um pequeno grupo de manifestantes, de 20 pessoas, que se sentaram para aproveitar a sombra da lanchonete McDonald's na avenida West Florissant, eram obrigadas a se levantar aos gritos de "circulando" pelos policiais.

    Com exceção de duas noites de saques, os protestos se repetiram pacificamente por várias semanas. Vários moradores revelaram à Folha que eram parados constantemente pela polícia, que sempre achava "que havíamos roubado algo", disse.

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