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    EUA nos fizeram ultrapassar limites, diz chanceler palestino

    ISABEL FLECK
    DE SÃO PAULO

    02/01/2015 02h00

    A última tentativa palestina de estabelecer prazos para a retirada dos assentamentos israelenses e para a retomada das negociações de paz falhou com a rejeição de uma resolução pelo Conselho de Segurança da ONU na terça (30).

    Para o chanceler palestino, Riyad al-Maliki, o texto não foi aprovado por pressão imposta pelos EUA sobre dois países –Nigéria e Coreia do Sul, que se abstiveram.

    Mohamed Adel/Efe
    Chanceler palestino, Riyad al-Maliki, em reunião da Liga Árabe, em setembro de 2014
    Chanceler palestino, Riyad al-Maliki, em reunião da Liga Árabe, em setembro de 2014

    "O governo americano ultrapassou todos os limites, e isso nos permite também ultrapassá-los", disse Maliki à Folha, ao chegar ao Brasil para a posse da presidente Dilma Rousseff.

    O primeiro "limite ultrapassado", segundo o chanceler, foi a adesão do governo palestino ao TPI (Tribunal Penal Internacional), na quarta (31). Com isso, eles poderão acusar Israel por "crimes contra o povo palestino".

    *

    Folha - Como o senhor recebeu a derrota da resolução palestina na ONU?

    Riyad al Maliki - A intervenção e mesmo coerção do governo americano forçaram a abstenção de pelo menos um país que votaria a favor, o que é inaceitável. O governo americano ultrapassou todos os limites, e isso nos permite também ultrapassá-los. Os americanos não queriam usar seu poder de veto, então eles trabalharam até o último minuto para que fracassássemos.

    Que limites os palestinos estão dispostos a ultrapassar?

    O meu presidente assinou nossa adesão ao TPI, e isso nos abre uma oportunidade para processar Israel pelos crimes contra o povo palestino. Ainda é preciso esperar 60 dias para que seja confirmada nossa adesão, e, nesse período, vamos preparar ações para a Corte começar a analisar, como sobre o ataque contra Gaza em julho.

    A decisão de aderir ao TPI pode prejudicar a retomada das negociações de paz?

    Pode, mas não foi uma escolha nossa. [O secretário de Estado americano John] Kerry disse que em seis meses conseguiríamos um acordo de paz. Em nove meses, nada aconteceu, e vemos os assentamentos engolindo o território palestino. Então como nos defender? Fomos obrigados.

    Segundo os EUA, os prazos estabelecidos na resolução para as negociações de paz foram arbitrários. O grupo islâmico Hamas diz que o texto previa muitas concessões. É possível equilibrar?

    Não acho que temos obrigação de equilibrar nada. Só olhamos o interesse da comunidade palestina e agimos. A ocupação começou em 1967. Se, mesmo 47 anos depois, colocar prazos para o fim da ocupação ainda é algo arbitrário, então não entendo a lógica americana. Quando se trata dos nossos direitos fundamentais, não podemos ceder. Não temos de nos equilibrar entre a pressão americana e do Hamas.

    O Hamas também diz defender os interesses palestinos.

    Nem sempre defende. Quando deram um golpe contra as autoridades legítimas palestinas em 2007, não representaram o interesse palestino. Nem quando tentaram se desassociar do resto do projeto nacional palestino, tirando Gaza desse contexto. Na democracia você tem opiniões diferentes, e nós respeitamos a voz do Hamas, só que é uma voz minoritária.

    Israel acusa seu governo de incentivar os recentes ataques de palestinos contra israelenses. Como é possível reduzir as tensões?

    Os ataques são uma resposta dos palestinos a algo feito antes pelos israelenses. Israel decidiu bloquear o acesso a lugares sagrados em Jerusalém, e isso foi uma provocação. Muitos anos atrás, criamos, com Israel e EUA, um comitê trilateral antiprovocações, que funcionou apenas por dois encontros. Queríamos reativar esse comitê, mas os israelenses se opõem.

    Um representante do governo israelense chamou o Brasil de anão diplomático' após criticar sua ação em Gaza. Como o senhor vê a atuação do Brasil?

    Respeitamos o Brasil por essa posição corajosa, apesar da reação que poderia vir de Israel ou de outros países. O Brasil é um país importante não só na sua região, mas em todo o mundo, e precisa agir e se comportar como tal.

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