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    Análise

    Tensão racial expõe ressaca dos EUA com anos de 'Tropa de Elite'

    RAUL JUSTE LORES
    ENVIADO ESPECIAL A MIAMI

    28/04/2015 15h28

    Nos últimos quatro anos, a polícia de Baltimore perdeu cerca de US$ 11 milhões em processos e indenizações a cidadãos que entraram com processos contra a brutalidade policial.

    Entre as cem vítimas que venceram na Justiça, após braços e pernas quebrados ou hematomas distribuídos pelo corpo, estão uma avó de 87 anos e uma grávida de 26, ambas testemunhas de altercações com terceiros, segundo o jornal local "Baltimore Sun".

    Os EUA vivem a ressaca de anos de síndrome de Tropa de Elite. Com violência em níveis latino-americanos nos anos 80 e 90, no auge da epidemia de crack, a polícia americana foi equipada, treinada e militarizada para combater o crime a qualquer custo.

    Os resultados chegaram: a violência despencou a níveis europeus de Nova York a Los Angeles, e a polícia usufrui de altíssima popularidade no país e de uma imagem de que é honesta e bem treinada.

    Mas diversos casos recentes, em que a onipresença de celulares permitiu o registro que desmente versões oficiais, mostram que os métodos envolvem mais mão pesada e abusos que apenas a "tolerância zero" —ainda que o número de balas disparadas por policiais seja uma fração comparada aos colegas de Rio ou São Paulo.

    Para quem mora em bairros mais pobres, onde minorias raciais são maioria, os enfrentamentos são frequentes.

    De Ferguson a Nova York, de North Charleston a Cleveland, quase todo mês surge uma nova vítima negra morta por policiais durante discussões banais.

    Com a violência já controlada em boa parte do país, surge um debate positivo sobre exigir da polícia mais autocontrole, melhor treinamento e transparência.

    Baltimore é uma exceção na pacificação à americana: embora bem menos violenta que nos anos retratados pelo brilhante seriado "The Wire", que mostra a guerra às drogas em seus subúrbios, a cidade ainda tem um índice de homicídios que é três vezes o de São Paulo.

    Mas, ao contrário de Ferguson, Missouri, onde protestos violentos estouraram em agosto, quando um jovem desarmado de 18 anos foi morto por um policial depois de furtar cigarros de uma loja de conveniência (e onde quase todos os policiais são brancos), os negros de Baltimore têm bem mais representatividade.

    A cidade teve três prefeitos negros nos últimos 25 anos, sendo um deles por 12 anos, e as outras duas negras nos últimos oito anos.

    A polícia tem avançado nessa área, mas ainda longe da integração total. Até 1938, negros não podiam ser policiais em Baltimore, mas tiveram de esperar até 1943 para poder usar o uniforme.

    Para poder usar as viaturas policiais tiveram de esperar até 1966 —as equipes eram separadas entre brancos e negros até então.

    Mesmo hoje, apenas 43% dos policiais da cidade são negros —que correspondem a 63% da população de Baltimore.

    Para parte da mídia americana, o quebra-quebra de segunda-feira e os saques de lojas e farmácias reforçarão estereótipos racistas, mas os motivos da raiva e o debate sobre os métodos policiais vieram para ficar.

    Editoria de Arte/Folhapress
    Negros mortos por policiais nos EUAAlguns casos emblemáticos

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