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    Quarenta anos após seu fim, Guerra do Vietnã continua presente

    RICARDO BONALUME NETO
    DE SÃO PAULO

    03/05/2015 02h00

    A complexidade da Guerra do Vietnã fica clara quando se vê que há uma data para o seu fim –1975, 40 anos atrás, com a queda da capital do Vietnã do Sul, pró-americanos. Mas não há consenso sobre o início do conflito.

    Entre 1950 e 1953, os EUA e seus aliados combateram para impedir que a comunista Coreia do Norte tomasse a capitalista Coreia do Sul. O resultado foi um empate, mas semeou as raízes do conflito seguinte na Ásia.

    Os EUA também auxiliavam então com armas e dinheiro a França, que colonizou os vários países da Indochina e teve que sair depois da fragorosa derrota militar em Dien Bien Phu, em 1954.

    Os franceses chegaram a discutir com os americanos a possibilidade de usar bombas nucleares táticas contra os insurgentes comunistas.

    Os EUA não queriam mais saber de empates, ou derrotas, na luta global contra o comunismo.

    O começo da guerra pode ter sido em 1955, quando os EUA oficializaram a presença de assessores militares no Vietnã do Sul; ou 1965, quando houve incremento das operações de combate por tropas americanas e o início de uma maciça campanha de bombardeio aéreo contra o Vietnã do Norte, comunista.

    A imagem clássica do final da guerra é a de helicópteros no teto da Embaixada dos EUA em Saigon retirando diplomatas, militares e refugiados em 1975. Havia tantos que, ao pousar nos porta-aviões americanos ao largo da costa, tinham que ser jogados no mar para dar espaço para os que chegavam.

    PAÍS DIVIDIDO

    A Guerra do Vietnã causou cerca de 58 mil mortes americanas de 1955 a 1975 –quase 17 mil no auge do conflito, em 1968. Apesar de terem morrido mais militares dos EUA na Segunda Guerra (1939-45), só a Guerra
    Civil (1861-65) afetou tanto a mentalidade da nação e das suas Forças Armadas. Também dividiu o país e a sociedade, incluindo conflitos raciais.

    "Nunca mais outro Vietnã" virou mantra pós-1975. Essa síndrome resistiu por algum tempo. Foi reforçada pela desastrosa tentativa de resgate de reféns americanos no Irã em 1980. O moral das forças americanas chegou ao fundo do poço.

    A eleição do republicano Ronald Reagan, que governou de 1981 a 1989, mudou o cenário. Ele iniciou um grande investimento nas Forças Armadas, e a nova corrida armamentista com a União Soviética foi um dos fatores que levaram à queda do comunismo no Leste Europeu.

    Reagan promoveu intervenções rápidas e pontuais, como a da ilha caribenha de Granada em 1983 ou o bombardeio da Líbia em 1986, que contribuíram para elevar o moral das tropas e resgatar o papel americano de "polícia do planeta".

    A "síndrome do Vietnã" teve seu enterro –precoce, hoje se vê– com a Guerra do Golfo, para expulsar invasores iraquianos do Kuait em 1990-91. Foi um conflito convencional, utilizando forças maciças e superiores em tecnologia e treinamento.

    Foi um quase passeio no deserto. Era o tipo de guerra que os americanos gostavam: rápida, com poucas perdas e pouca polêmica política.

    ATOLEIRO

    Editoria de Arte/Folhapress

    Mas, após os atentados do 11 de Setembro, em 2001, os EUA se arrastaram para duas guerras do modelo vietnamita, no Iraque e no Afeganistão. Começaram bem, como é praxe; e logo se atolaram.

    Ironicamente, os militares dos EUA foram estudar o que tinha ocorrido no Vietnã e outras guerras de contrainsurgência para lidar com os novos desafios. Velhos manuais foram desencaixotados e uma nova doutrina foi escrita.

    O comandante americano no Vietnã durante boa parte da guerra, general William Westmoreland, era um soldado sem imaginação que só raciocinava em termos de guerra convencional.

    Seu substituto, Creighton Abrams (cujo nome batiza o principal tanque americano hoje), era mais inteligente. Começou uma real estratégia de ganhar "corações e mentes" vietnamitas, com mais sucesso. Mas já era tarde.

    Exatamente o mesmo ocorreu no Iraque e no Afeganistão: só depois de anos de erros se criou uma estratégia sensata, obra de personagens como o general David Petraeus, um dos principais autores da renascida doutrina de contrainsurgência.

    Difícil prever o que vai acontecer nesses países ou em outros que podem vir a ser "policiados" (Síria? Coreia do Norte? Iêmen?).

    Mas uma previsão é certa: a síndrome do Vietnã ressuscitou e está bem viva.

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