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    Escalada da violência faz segurança privada explodir na Venezuela

    SAMY ADGHIRNI
    DE CARACAS

    13/06/2015 02h00

    Dono de uma empresa financeira em Caracas, Leo Mendoza circula com guarda-costas, carro blindado e gasta fortunas em vigias e câmeras no seu escritório.

    Mendoza é o típico cliente da indústria de segurança privada na Venezuela, um raro setor em expansão num país sufocado pela crise. "Não me sinto mais seguro, mas viro um alvo menos apetitoso para bandidos", diz o empresário que, há cinco anos, nem cogitava tais medidas.

    Miguel Gutierrez/Efe
    Membros da Polícia Científica da Venezuela fazem patrulha enquanto passa funeral em Caracas
    Membros da Polícia Científica da Venezuela fazem patrulha enquanto passa funeral em Caracas

    A escalada da violência fez da Venezuela um dos países mais perigosos do mundo, com uma taxa de homicídios é de 82 mortes para cada 100 mil habitantes, segundo ONGs. Só Honduras a supera (no Brasil, são 32 por 100 mil). Dados da ONU corroboram a colocação venezuelana entre os três países mais violentos.

    Os venezuelanos também sofrem com sequestros. Em 2013, foram mais de 2.000, ou mais de cinco por dia, segundo a empresa de segurança americana Chubb. Sem contar sequestros-relâmpago.

    Este cenário, somado à percepção generalizada de inépcia do Estado, favoreceu a proliferação de centenas de companhias dedicadas à demanda de uma população que vive em pavor. "A insegurança não arrefece, e isso cria mercado", diz Nestor Pinto, dono da Celtic Security, que oferece de transporte de valores a circuito de câmeras.

    Empresas do setor não quiseram revelar números, mas todas dizem que os negócios estão em alta, sobretudo nos últimos dois anos, num possível reflexo da deterioração do ambiente após a morte do presidente Hugo Chávez.

    A Santa Cruz Blindados tinha 12 clientes em 2011. Hoje, são mais de 100. "A demanda tem picos quando ocorrem crimes que comovem o país, como a morte da [ex-miss e atriz] Monica Spears [em janeiro de 2014]", diz o dono, Diego Bavio.

    A Blindacars Express, que comercializa laminados resistentes a balas, diz que só não vende mais porque o câmbio complica a importação.

    "Se eu pudesse importar mais, venderia mais", suspira um gerente que acaba de cancelar uma campanha publicitária por medo de não dar conta da demanda.

    DIÁRIAS

    Os maiores clientes são empresas, incluindo as multinacionais que restaram na Venezuela.

    Mas ninguém estranha ver guarda-costas, com roupa civil e pistola na cintura, na porta dos colégios particulares ou acompanhando clientes em alguma loja de luxo.

    O serviço básico de escolta armada sai por 80 mil bolívares ao dia, cerca de US$ 200 (R$ 625) no paralelo.

    Um dos produtos por diária requisitados até pela classe média é o aluguel de camionete blindada para buscar filhos em festas ou ir ao aeroporto. O trajeto curto custa 7.000 bolívares (US$ 17).

    Num sábado recente, uma família de empreiteiros que festejava o casamento de um filho em Caracas alugou 60 carros blindados para o transporte seguro dos convidados.

    A Blindacars Express vende até sirenes e jogos de luzes de para-brisas, em tese restritos ao uso oficial. "O bandido pensa que é carro de ministro e nem chega perto", diz um gerente. "O venezuelano é criativo e folgado."

    A indústria também cresce por efeito de contágio. "Meu vizinho põe cerca elétrica e câmera, então tenho que fazer igual para não mostrar que minha casa é mais vulnerável", diz o empresário David F. "Dizem que se paga pouco imposto na Venezuela, mas, num país normal, eu não teria esses gastos".

    Críticos alertam que o crescimento da segurança privada gera problemas, principalmente em relação aos guarda-costas. Muitos são ex-policiais que atuam no limbo jurídico de uma profissão sem contornos definidos.

    Também há preocupação com treinamento. "Hoje qualquer sujeito de óculos escuros e pistola se acha segurança profissional", diz um veterano consultor.

    O governo, que não atende a mídia estrangeira, é responsável por essa situação, segundo o consultor Fermin Garcia.

    "A revolução bolivariana tem instituições fracas e nunca priorizou a luta contra o crime."

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