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    Em encíclica, papa pede redefinição de progresso para proteger ambiente

    DE SÃO PAULO
    DAS AGÊNCIAS DE NOTÍCIAS

    18/06/2015 09h59 - Atualizado às 15h51

    Após ter seu rascunho vazado por um jornalista, a encíclica do papa Francisco sobre questões ambientais foi publicada oficialmente nesta quinta-feira (18) pelo Vaticano.

    No documento, o papa diz ser preciso buscar uma "nova definição de progresso" que não se baseie apenas no desenvolvimento tecnológico e econômico.

    Ele pede, também, que os países ricos aceitem "um certo decréscimo" de seu consumo a fim de frear o impacto humano sobre o ambiente.

    Batizada de "Laudato Si (Louvado Sejas, em italiano medieval) —Sobre o cuidado da casa comum", a carta de 192 páginas está disponível em cinco línguas: português, inglês, espanhol, italiano e alemão.

    No documento, Francisco considera as mudanças climáticas como "um dos principais desafios para a humanidade", sendo agravadas pelo "desflorestamento para finalidade agrícola" e "pelo modelo de desenvolvimento baseado no uso intensivo de combustíveis fósseis".

    Esse tipo de intervenção humana estaria levando a Terra a parecer-se cada vez mais com um "imenso depósito de lixo".

    O pontífice aponta também para a gravidade do consumismo e das desigualdades entre ricos e pobres, afirmando que "alguns se arrastam numa miséria degradante" enquanto outros "deixam atrás de si um nível [impraticável] de desperdício (...) como se tivessem nascido com maiores direitos".

    "Por isso, chegou a hora de aceitar um certo decréscimo do consumo em algumas partes do mundo, fornecendo recursos para que se possa crescer de forma saudável em outras partes", afirma o papa, defendendo que os países ricos sejam responsabilizados em grande parte pelas mudanças climáticas.

    No que diz respeito às propostas de solução para os problemas ambientais, o líder da Igreja católica afirma que muitos esforços "acabam, com frequência, frustrados não só pela recusa dos poderosos, mas também pelo desinteresse dos outros".

    Rejeitando a ideia de "regresso à Idade da Pedra", Francisco critica aqueles que "defendem a todo custo o mito do progresso", como se os problemas ambientais fossem se resolver "simplesmente com novas aplicações técnicas, sem (...) mudanças de fundo".

    Além disso, o papa condena "a salvação dos bancos a todo o custo" e diz que a crise econômica de 2007 e 2008 era uma uma oportunidade para reformar o sistema financeiro, mas que não houve mudanças significativas.

    "Não é suficiente conciliar, a meio termo, o cuidado da natureza com o ganho financeiro, ou a preservação do meio ambiente com o progresso. Neste campo, os meios-termos são apenas um pequeno adiamento do colapso. Trata-se simplesmente de redefinir o progresso. Um desenvolvimento tecnológico e econômico, que não deixa um mundo melhor e uma qualidade de vida integralmente superior, não se pode considerar progresso."

    Para Francisco, a solução para os problemas ambientais passa por "linhas de diálogo e de ação" que envolvam todas as pessoas a nível individual e a nível da política internacional.

    REPERCUSSÃO

    A encíclica de Francisco foi bem recebida por ativistas e cientistas, no sentido em que traz elementos morais para a discussão sobre as mudanças climáticas.

    "As mudanças climáticas não são mais apenas um problema científico, são cada vez mais um problema moral e ético", disse Yolanda Kakabadse, presidente da organização ambiental WWF.

    Christiana Figueres, chefe do secretariado das Nações Unidas para a mudança climática, disse que a encíclica pressiona os governos a apoiar um acordo forte na conferência global sobre o tema a ser realizada em Paris, entre 30 de novembro e 11 de dezembro.

    "Esse chamado de clarim [a encíclica] deve guiar os líderes mundiais rumo a um acordo climático forte e durável em Paris no fim do ano", afirmou Figueres em um comunicado.

    PROVOCAÇÃO

    Em conversa com a imprensa nesta quinta-feira (18), o presidente da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil), dom Sérgio da Rocha, criticou o que avalia como "cultura do descartável" e "consumismo exagerado" da sociedade atual.

    "Esperamos que essa encíclica possa repercutir nas instâncias que temos no Brasil. () Não basta conhecer [o documento], a gente tem que se deixar interpelar", afirmou ele. "Não somos senhores da natureza, somos administradores", completou.

    Para dom Leonardo Steiner, secretário-geral da entidade, o papa "está nos provocando a ter uma nova relação". "Não só entre nós, mas também com a natureza, para ter relações mais harmoniosas e respeitosas", disse.

    Colaborou FLÁVIA FOREQUE, de Brasília

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