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    Descendentes de americanos celebram EUA do século 19 no interior de SP

    ESTÊVÃO BERTONI
    ENVIADO ESPECIAL A SANTA BÁRBARA D'OESTE (SP)

    04/07/2015 02h00

    Todo ano, ao final de cada Festa Confederada, em Santa Bárbara d'Oeste (135 km de São Paulo), Nanci Padoveze, 64, repete aos amigos a frase: "Em algum lugar daqui eu vou estar no ano que vem. Ou deste ou daquele lado".

    A incerteza de Nanci é sobre se participará da confraternização na área social -onde os participantes dançam vestidos como no século 19 e cantam canções tradicionais- ou se estará no cemitério anexo, ao lado do pai.

    Edilson Dantas/Folhapress
    Descendentes de americanos vindos para o Brasil depois da Guerra da Secessão se instalaram na região e se reúnem todos os anos
    Descendentes de americanos vindos para o Brasil depois da Guerra da Secessão se instalaram na região e se reúnem todos os anos

    A festa reúne descendentes daqueles que deixaram os EUA após a derrota do sul agrário e escravista para o norte industrial na Guerra de Secessão (1861-1865). Com incentivo do governo brasileiro, Santa Bárbara recebeu cerca de 3.000 americanos de 1866 a 1868. A imigração acabou dando nome à cidade vizinha de Americana.

    Mais que celebrar o passado, o evento, cuja 27ª edição reuniu 2.300 pessoas em abril, angaria fundos para manter o Cemitério do Campo, central na vida dessa comunidade.

    Segundo a Fraternidade Descendência Americana, associação fundada em 1954 e que organiza a festa, o cemitério foi criado por um coronel que, em 1867, não pode enterrar a mulher, protestante, nos cemitérios católicos da região. O local "une gerações", diz o engenheiro agrônomo Marcelo Dodson, 41, que preside a fraternidade. Para Alcides Gussi, antropólogo que pesquisou, na Unicamp, a comunidade de Santa Bárbara, trata-se de um espaço em que a morte não se opõe à festa.

    BANDEIRA

    A recriação da atmosfera da época durante a festa é feita com o uso de fantasias. Responsável por elaborar as roupas, Nanci, que nunca foi aos EUA, diz ter se baseado em filmes como "... E o Vento Levou" (1939).

    Os descendentes dos sulistas também usam em suas festas a controversa bandeira dos Estados Confederados.

    Alvo de polêmica histórica, a peça, que para muitos americanos não pode ser dissociada do período escravista, voltou a ser discutida após aparecer em fotos de Dylann Roof, o atirador branco que matou nove pessoas numa igreja da comunidade negra em Charleston, Carolina do Sul.

    A Fraternidade Descendência Americana se esforça para evitar o estigma racista.

    Desde 2011, quando um grupo de neonazistas foi à Festa Confederada e provocou uma briga, a entidade passou a controlar com mais rigor a entrada de pessoas no evento. Mas não cogita abandonar a bandeira.

    "Ela representa, para nós, a redenção e o recomeço dos nossos ancestrais. É o elo com o nosso passado. Não temos vergonha disso", diz Dodson.

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