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    Visita do papa a presídio boliviano expõe mazelas do sistema carcerário

    FABIANO MAISONNAVE
    ENVIADO ESPECIAL A SANTA CRUZ DE LA SIERRA (BOLÍVIA)

    11/07/2015 02h00

    A visita do papa Francisco ao maior e mais violento presídio da Bolívia, nesta sexta (10), expôs as mazelas da administração carcerária sob o governo Evo Morales, iniciado em 2006.

    Os problemas incluem o uso abusivo da prisão preventiva, a superlotação e o orçamento diário com comida de apenas R$ 2,75 por preso.

    "Os que cozinham para nós são grandes economistas", disse o preso Andrés Céspedes, 22, ao dar seu testemunho ao papa. "Pois eles cozinham café, almoço e jantar com a quantia de 6 bolivianos (R$ 2,75) ao dia, quando, do lado de fora, um almoço custa pelo menos 10 (R$ 4,60)."

    Na visita, o papa afirmou que "reclusão não é o mesmo que exclusão" e criticou os presídios bolivianos.

    "São muitos os elementos que jogam contra este lugar", disse Francisco, diante de centenas de presos e familiares.

    "Sei muito bem: a superlotação, a lentidão da Justiça, a falta de terapia ocupacional e de políticas de reabilitação, a violência e a falta de facilidade de estudos universitários, pelo qual se faz necessária uma rápida e eficaz aliança interinstitucional para encontrar respostas."

    Organizador da visita do papa ao presídio Palmasola, em Santa Cruz de La Sierra, o padre acriano Leonardo Costa, 41, afirma que o café da manhã se resume a um pão francês, enquanto o cardápio mais comum do almoço e do jantar é um sopão com osso ou miúdos de frango.

    "Com um detalhe: se o preso é pobre e tem dois filhos com ele, então os seis bolivianos são para os três", diz Costa, coordenador nacional da Pastoral Carcerária, que trabalha desde 2007 no local.

    Pela lei boliviana, filhos de até 6 anos que não têm com onde ficar podem viver com um dos pais nos presídios.

    O padre brasileiro afirma que muitos presos conseguem melhorar a alimentação com doações de entidades, como a Igreja Católica. O Consulado do Brasil em Santa Cruz, por exemplo, distribui regularmente cestas básicas aos 60 brasileiros na prisão.

    PRISÃO PREVENTIVA

    A poucos metros da entrada de Palmasola, a dona de casa Melissa Escobar, 42, chamava a atenção por carregar uma cruz de 2,5 metros e por não parar de chorar. Ela queria que que o papa a ajudasse a soltar sua irmã, acusada de tráfico de pessoas e presa sem julgamento há dois anos.

    "Aqui é fácil destruir uma pessoa", disse, sobre a irmã, mãe de sete filhos e que alega inocência.

    Presos sem julgamento não são uma exceção. De acordo com a Pastoral Carcerária, 84% dos detentos em presídios bolivianos esperam julgamento.

    A lei prevê, no máximo, 36 meses de prisão preventiva, mas é comum o prazo se estender. Costa diz que, em 2013, foi encontrado um detento em Palmasola esperando julgamento havia 21 anos.

    O padre brasileiro afirma que o massacre ocorrido durante uma briga de presos em agosto de 2013 ilustra bem a situação: dos 35 mortos, apenas dois haviam sido condenados, e as duas crianças que morreram não estavam oficialmente registradas.

    A morosidade da Justiça contribui para a superlotação. Com capacidade para 800 presos, Palmasola está com cerca de 5.500 pessoas.

    Durante e após a visita do papa, nenhum representante do governo comentou sobre a situação dos presídios.

    Um dia antes da chegada do pontífice, o Congresso, de maioria governista, aprovou uma anistia para mulheres grávidas e detentos com deficiência física, entre outros casos específicos.

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