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    Cuba vive onda de empreendedorismo

    SAMY ADGHIRNI
    ENVIADO ESPECIAL A HAVANA

    23/07/2015 02h00

    Após se graduar em economia, há três anos, Iván Torres montou uma oficina para consertar impressoras. Em 2014, abriu a segunda loja no mesmo ramo. Agora, está prestes a inaugurar um novo negócio: um hotel para cães.

    "Sou um capitalista", diverte-se Iván, 26, expoente da geração que vem aproveitando a abertura econômica para se lançar na iniciativa privada. "Sabe quem é meu maior cliente? O governo."

    Autoridades dizem que Cuba já tem meio milhão de empreendedores, quase 10% da população ativa. São os chamados "cuentapropistas" –trabalham por conta própria.

    A maioria é dono de restaurantes, taxista ou dono de quartos para alugar. Mas há também barbeiros, carpinteiros e outras 200 profissões livres para exercício privado.

    Marlene Bergamo - 2.jan.2015/Folhapress
    Restaurante em Centro Havana; autônomos cubanos abrem negócios à espera de dinheiro dos EUA
    Restaurante em Centro Havana; autônomos cubanos abrem negócios à espera de dinheiro dos EUA

    A nova realidade destoa radicalmente do cenário pós-revolucionário dos anos 60, quando o então ditador Fidel Castro condenava toda forma de propriedade privada.

    As permissões especiais foram concedidas a conta-gotas como forma de revitalizar o país em épocas de crise, como a que ocorreu nos anos 1990 após o colapso soviético, mas a abertura só se consolidou quando Raúl Castro assumiu o governo no lugar do irmão Fidel, em 2008.

    Hoje em dia, alguns empresários movimentam quantias na casa dos milhões de dólares e empregam muita gente. Um deles, que não quis se identificar, está lucrando com construção imobiliária.

    "As coisas estão indo bem e devem ficar ainda melhores", diz o empresário, de camisa polo rosa e óculos escuros, numa referência aos investimentos que Cuba espera receber no embalo da normalização com os EUA.

    Outros empresários operam de forma precária, como o pintor de carros Carlos Pedro, 50. Há quatro anos, ele abandonou emprego no governo para trabalhar por conta. Hoje ganha cerca de US$ 400 por mês, o equivalente a 20 vezes um salário padrão.

    Pedro tem um funcionário, Lázaro, 22, que diz trabalhar duro para satisfazer necessidades de consumo. "Preciso poder comprar um tênis bacana e uma cervejinha. Se não, nenhuma mulher vai me querer", diz o rapaz, ecoando a cultura de ostentação que se alastra pela ilha.

    Sinais de riqueza são onipresentes. Numa tarde recente, um reluzente Audi A4 verde limão estava estacionado em frente ao hotel Meliá Habana. "Pertence a um cantor de reggaeton, um desses cubanos que ficaram muito ricos", disse um funcionário.

    Inaugurada em março no Galerias del Paseo, centro comercial com ares soviéticos, a primeira loja Nike em Cuba tem fila. Poucos modelos saem por menos de US$ 100.

    Antes frequentados essencialmente por diplomatas e turistas, bares e restaurantes mais sofisticados de Havana estão cheios de cubanos.

    "Quando cheguei, há 34 anos, era difícil até achar carpinteiro. Hoje há de tudo", diz o espanhol Jordi Escarrá, dono do restaurante VIPs.

    DESIGUALDADE

    Muitos se queixam de que o capitalismo acirra desigualdades e infla preços. "Minha renda aumentou muito, mas tudo está tão caro que, antes, eu vivia melhor com menos dinheiro", diz Pedro, o pintor.

    Pequenos empresários afirmam que a abertura estimula a extorsão policial e as práticas ilegais. "A lei me permite comprar madeira, mas não existem lojas nem licenças de compra. Então preciso adquirir mercadoria roubada ou corromper alguém", explica um carpinteiro que vive há 40 anos no mesmo cortiço.

    Uma garçonete vê desrespeito a direitos trabalhistas. "Se adoeço e preciso faltar, o patrão não vai me pagar e não terei a quem recorrer."

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