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    Tamanho dos países atrapalha democracia africana

    CLÓVIS ROSSI
    COLUNISTA DA FOLHA

    29/07/2015 07h00

    Pegue a área somada de Bélgica, Itália, Suíça, Alemanha, Reino Unido, Áustria, Grécia e Dinamarca. Dá um total de 1.233.070 quilômetros quadrados.

    Todos esses países juntos caberiam em apenas um país africano de tamanho médio africano, como é Angola, com sua área de 1.246.700 quilômetros quadrados.

    É um gráfico com esses números que Ian Spears, especialista em África da Universidade Guelph (Ontário, Canadá), exibe a seus alunos para explicar que o grande tamanho dos países africanos é um dos possíveis motivos pelos quais a África é um continente de relativamente poucas democracias.

    Aliás, a Freedom House, instituição norte-americana especializada na promoção da democracia, criticou duramente o presidente Barack Obama por ter citado as eleições legislativas na Etiópia como exemplo de democracia.

    France Presse
    Orla marítima de Luanda, capital de Angola
    Orla marítima de Luanda, capital de Angola

    "Chamar o governo da Etiópia de democraticamente eleito reduz os padrões para a democracia e mina o trabalho corajoso de tantos etíopes que lutam para estabelecer uma sociedade justa e democrática", reclamou Mark Lagon, presidente da Freedom House.

    A Etiópia entra no ranking 2015 da Freedom House como "não livre", categoria em que caem 21 países da África subsaariana.

    Dezoito são "parcialmente livres", e apenas 10 são "livres", sempre segundo o ranking.

    Se, no entanto, se quiser um olhar mais positivo, constate-se que a maioria dos habitantes da África (60% exatamente) vive em países parcialmente livres (48%) ou livres (os outros 12%).

    É claro que o tamanho não é o único obstáculo para o florescimento da democracia. Se fosse, nem Estados Unidos nem o Brasil seriam democráticos.

    Na África, jogam dois fatores complicadores.

    Primeiro, a imensa diversidade. Dependendo do que se considere como grupo étnico, os países africanos podem ter de várias dezenas a várias centenas de grupos étnicos.

    A Nigéria, por exemplo, tem cerca de 250 diferentes grupos linguísticos, lembra Ian Spears.

    Completa o especialista: "Países como Brasil e Canadá são também grandes, mas tendem a ser dominados por uma única tradição política e a ter instituições mais fortes. Na maioria dos países africanos, pode haver grupos dominantes, mas não há uma única tradição política com a qual todos concordem".

    Um terceiro fator complicador é apontado por Steve McDonald, diretor do Programa África do Wilson Center: "Os governos coloniais dificultaram as coisas na época da independência na medida em que quase sempre passaram o domínio para seus homens preferidos ou para grupos tribais que achavam que podiam controlar".

    Mais de um antropólogo aponta para um elemento cultural: nos tempos pré-coloniais, o voto para decidir o que fazer era um instituto desconhecido pelas tribos.

    Preferiam a assembleia dos anciãos, que se reunia até chegar a um consenso.

    "Essa visão romântica de anciãos reunidos sob uma árvore tornou-se um problema real quando as aldeias ganharam escala e se tornaram do tamanho dos Estados contemporâneos modernos", diz Ian Spears.

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