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    Único observador para eleições na Venezuela, Centro Carter deixa o país

    SAMY ADGHIRNI
    DE CARACAS

    04/08/2015 22h26

    Um dos mais respeitados organismos de monitoramento eleitoral, o Centro Carter encerrou suas atividades na Venezuela, onde operava havia 13 anos, apurou a Folha.

    O escritório em Caracas foi fechado sem alarde em junho, apenas seis meses antes de uma eleição parlamentar na qual a oposição exige supervisão independente para evitar possíveis fraudes.

    O Centro Carter, fundado em 1982 pelo ex-presidente americano Jimmy Carter para "promover a paz", não respondeu a reiterados contatos feitos pela reportagem.

    Fontes ligadas ao órgão disseram que a decisão reflete a crescente dificuldade de operar na Venezuela desde a morte do presidente Hugo Chávez (1999-2013), em 2013.

    O maior obstáculo seria a deterioração dos laços com o sucessor de Chávez, Nicolás Maduro.

    Segundo as fontes, o Centro Carter tinha cada vez menos contato com autoridades, inclusive com o Conselho Nacional Eleitoral (CNE), órgão regulador das eleições.

    Não há relatos de pressão para forçar a saída, mas o CNE e demais órgãos oficiais teriam deixado de participar de iniciativas de diálogo político e atividades como workshops para a mídia estatal.

    Em maio, uma delegação do Centro Carter vinda da sede, em Atlanta (EUA), não foi recebida pela presidente do CNE, Tibisay Lucena, com quem tradicionalmente mantinha laços cordiais.

    Esse aparente enclausuramento é visto como reflexo das adversidades do governo, refém de conflitos internos e incapaz de reverter a queda da aprovação para 22%, causada em grande parte pela crise econômica e pelo desabastecimento de alimentos e produtos básicos.

    Procurado, o governo não comentou o episódio.

    CUSTO OPERACIONAL

    Uma segunda razão para a saída é a multiplicação de problemas logísticos, como o abismo entre a taxa de câmbio oficial, que encarece custos operacionais, e a livre, de contornos legais ambíguos.

    Outro fator é a recente mudança na diretoria do Centro Carter, que passou a priorizar Guatemala, Colômbia e países da Ásia.

    "O Centro Carter se deu conta de que o valor agregado que poderia trazer à situação venezuelana já não valia o esforço", diz um membro de uma ONG que operava com o organismo.

    Na prática, a saída abre caminho para eleições sem nenhum monitoramento capaz de dirimir suspeitas de irregularidades.

    Maduro já descartou observadores internacionais em dezembro, deixando no ar apenas uma possível missão de "acompanhamento" da Unasul, bloco criado por impulso de Chávez e do então presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 2008 para agrupar os países sul-americanos.

    "Acompanhadores", porém, não podem emitir declarações nem redigir relatórios.

    "É necessário que a Venezuela tenha presença de observadores internacionais para aumentar a confiança no processo", diz a analista Jennifer McCloy, que chefiou o programa venezuelano no Centro Carter até junho, quando deixou o órgão.

    A entidade acompanhou todas as eleições na Venezuela desde 1998. O escritório foi aberto em 2002.

    Chávez costumava citar o trabalho do centro para justificar a lisura das eleições no país. Mas o relatório do último pleito presidencial, de 2013, apontou indícios de irregularidades, como uso da máquina estatal e intimidação de eleitores.

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