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    Favorito na Argentina, peronista quer melhorar relação com Brasil

    MARIANA CARNEIRO
    DE BUENOS AIRES
    SYLVIA COLOMBO
    ENVIADA ESPECIAL A BUENOS AIRES

    27/09/2015 22h24

    Favorito a assumir a Presidência da Argentina em dezembro, com o fim do mandato de Cristina Kirchner, Daniel Scioli quer colocar em ação uma nova relação com o Brasil, principal parceiro comercial do país.

    Em entrevista no intervalo de uma partida de futebol de salão, o candidato afirmou que Brasil e Argentina têm que parar de pensar apenas em vender um para o outro e buscar novos mercados.

    "Não se trata de quem vende mais para quem, mas do que podemos produzir juntos e vender a outros países", afirmou Scioli, que tem 39,3% das intenções de voto, segundo pesquisa da Management & Fit, contra 31,2% do o direitista Mauricio Macri (para se eleger, precisa de 40% com 10 pontos de vantagem para o segundo colocado ou 45%).

    Vestindo o uniforme do time que criou e patrocina, o Villa La Ñata, que também leva as cores de seu material de campanha (laranja e branco), o candidato peronista falou com jornalistas enquanto se aquecia, com uma bola entre os pés, para entrar no jogo no segundo tempo.

    Apesar de ter ocupado o cargo de vice-presidente de Néstor Kirchner (entre 2003 e 2007) e de ser o apadrinhado de Cristina nesta eleição, Scioli sempre guardou diferenças com o kirchnerismo.

    Por exemplo, parece reconhecer que, sob o atual governo, a relação com o Brasil esfriou. Só neste ano, até agosto, o comércio bilateral encolheu 17%. Desde 2011, quando Cristina foi reeleita e Dilma assumiu a Presidência, o intercâmbio comercial entre os dois países vizinhos recuou em US$ 11 bilhões.

    As razões incluem as medidas protecionistas e a limitação de dólares que derrubou as importações do lado argentino, a desaceleração econômica de ambos países e a maior presença da China em certas áreas de investimentos. Aos jornalistas, porém, Scioli disse que o Mercosul será prioridade.

    "O importante é que fortaleçamos o bloco, a partir daqui, da região", disse. "Quiseram nos dividir, nos confrontar, com o objetivo de nos subordinar. Mas há uma grande consciência disso e já falei sobre isso com Lula e com Dilma", disse Scioli.

    O ex-presidente brasileiro é um dos "líderes mundiais" cujas réplicas Scioli encomendou a um artista local.

    Num lado das arquibancadas do ginásio de Villa La Ñata, assistindo de camarote às partidas, estão Churchill, Mandela, Clinton, Obama, Che Guevara, Perón e Evita, Néstor, Raúl Alfonsín, Gandhi e o líder petista.
    mais abertura

    Scioli tem defendido uma maior abertura da economia argentina a investimentos estrangeiros e sinaliza predisposição para negociar com credores externos –o país está fora do mercado de crédito desde 2014.

    "A Argentina não terá mais problemas de dólares", diz.

    Questionado sobre uma provável necessidade de ajuste e de desvalorização do peso, Scioli disse que não fará nada repentino ou pontual.

    "Isso é o que quer o outro partido [o PRO, de Maurício Macri]. Nós propomos um gradualismo nessas medidas, sem prejudicar o consumo popular e a distribuição de renda. Vamos sustentar e acelerar a atividade econômica. Cuidaremos de nossos setores produtivos. A ideia é industrializar mais o país e alentar investimentos no setor energético."

    Para Scioli, a tentativa de antecipar a entrega da proposta de abertura comercial do Mercosul com a União Europeia, expressada pelo governo brasileiro na última semana, é uma "conjectura". "Estamos sempre buscando trabalhar com o Brasil."

    Ao ser questionado sobre a crise brasileira, o candidato afirmou que "tem confiança de que será superada". Porém, reconheceu que se preocupa com a situação do Brasil. "É um mercado importante, um sócio fundamental."

    POLÍTICA INTERNA

    O presidenciável tentou dissipar diferenças que apareceram nos últimos dias entre ele e o kirchnerismo.

    Apoiadores de Cristina sugeriram que Scioli representaria uma espécie de "presidente-tampão", apenas ganhando tempo para que Cristina voltasse à Presidência, em 2019. "Os que afirmam isso são os mesmos que não me queriam como candidato, que me subestimaram."

    Recusou-se, também, a discutir termos como "kirchnerismo" e "sciolismo", indicando que a Argentina poderia encerrar um ciclo político e iniciar outro. "Não concordo com esses termos. A Argentina vai se desenvolver em plenitude, como um país desendividado e reindustrializado e com políticas em marcha para desenvolvimento."

    A uma jornalista espanhola que dizia ter "dificuldade de localizá-lo" entre a esquerda ou a direita, Scioli sorriu e ficou alguns instantes sem dizer nada. Mais uma vez, porém, desconversou. "Sou um trabalhador incansável. Há soluções que não são nem de direita, nem de esquerda. São apenas soluções aos temas que surgem e exigem sensibilidade e firmeza."

    Sugeriu, porém, que combinaria continuidade com algumas políticas kirchneristas e inovações próprias.

    "Há coisas que têm de ter continuidade e outras que precisam mudar. É isso o que as pessoas pensam hoje na Argentina", afirmou.

    "Elas não querem uma mudança total e querem que interpretemos bem as novas demandas. Sou o candidato que, pela experiência que tenho, transmite tranquilidade, previsibilidade, coerência e confiança."
    segundo tempo

    Tranquilidade, porém, não foi o que Scioli demonstrou quando o treinador do Villa La Ñata o tirou do jogo, no meio do segundo tempo, quando a equipe adversária começou a pressionar.

    Assim que Scioli saiu da quadra, o Banfield marcou o gol que empataria o jogo. Scioli levantou o braço e reclamou com o técnico.

    "Ele achou que se tivesse continuado no jogo, isso não teria acontecido", disse o treinador aos jornalistas depois.

    A raiva de Scioli, porém, passou rápido. Seu time virou e venceu por 6 a 3.

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    RAIO-X
    DANIEL SCIOLI

    Nascimento: 13.dez.1957

    Carreira pregressa: dedicou-se à motonáutica nos anos 80 e 90, quando foi oito vezes campeão mundial; em 1989, sofreu um acidente e perdeu o braço direito (ele usa prótese)

    Família: De origem afluente, casou-se com a modelo Karina Rebolini em 1991 (o casal esteve separado de 1998 a 2003); a filha, Lorena, nascida em 1978, precede essa relação

    Carreira política: Começou no fim dos anos 90, sempre no partido Justicialista (peronista); foi deputado, secretário de Esporte e vice-presidente sob Néstor Kirchner (2003-07), hoje governa a Província de Buenos Aires

    Chances: O mais votado nas primárias, recebeu 38,67% dos votos válidos

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