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    Longe da guerra, sírio se torna referência de dados para Ocidente

    LEANDRO COLON
    DE LONDRES

    11/10/2015 02h30

    O sírio Rami Abdul Rahman, 44, está agitado, fala freneticamente, o telefone não para de tocar, e ele pede licença por uns segundos: "Estão me avisando que mais civis foram mortos na Síria".

    Rahman diz ter mudado hábitos recentemente, como não receber visita em casa, na cidade inglesa de Coventry, de onde monitora o conflito no seu país. Conta que prefere marcar conversas em lugares públicos, por motivos de segurança.

    Leandro Colon/Folhapress
    Rami Abdul Rahman, fundador do Observatório Sírio de Direitos Humanos, em Londres
    Rami Abdul Rahman, fundador do Observatório Sírio de Direitos Humanos, em Londres

    Ele alega ser alvo do regime do ditador Bashar al-Assad, mesmo vivendo em território britânico há 15 anos. "Assad é um assassino", diz.

    Uma esquina em frente ao Big Ben, em Londres, foi escolhida por ele para um encontro com a Folha na quinta-feira (8). Estava engravatado, para depois se reunir com líderes do Parlamento britânico.

    O nome de Rahman é referência na mídia europeia e americana como fonte de informação sobre mortos e feridos na guerra civil que atinge a Síria desde 2011.

    PENSADOR GLOBAL

    No ano passado, entrou na lista dos cem "pensadores globais" da revista americana "Foreign Policy". Foi porta-voz de recentes relatos de mortes causadas por ataques de forças russas, que se aliaram recentemente a Assad no combate à milícia radical Estado Islâmico.

    "A Rússia tem dado apoio a um regime ditatorial, matando o povo sírio. Deveria trabalhar com os EUA para atacar o EI", diz.

    Ele criou em 2006 o Observatório Sírio de Direitos Humanos, por onde publica notícias do conflito. Seu nome de registro é Osama Suleiman, mas diz ter adotado o pseudônimo Abdul Rahman desde os tempos de Síria.

    Nascido na cidade de Baniyas, Rahman diz que fugiu do país em 2000 depois de ser preso três vezes pelo regime. Recebeu abrigo do governo do Reino Unido, do qual diz não receber nenhum suporte financeiro ou político.

    Não se sabe exatamente quão verdadeiras são as informações que divulga e se realmente tem influência na Síria, um país que não visita desde 2000.

    O observatório virou fonte por causa dos detalhes dos relatos, mas também em razão da dificuldade em confrontá-los, já que jornalistas e entidades como as Nações Unidas enfrentam obstáculos para penetrar no país e obter dados precisos.

    "A credibilidade é importante. Nós conhecemos todas as pessoas que estão conosco. Se temos dúvidas, não publicamos", afirma. Ele estima que pelo menos 310 mil pessoas tenham morrido no conflito sírio desde 2011.

    UM HOMEM SÓ

    Rahman é o único "membro" do observatório no Reino Unido e o restante, diz, está na Síria. Ele afirma: "Tenho 230 pessoas nos ajudando sigilosamente por lá, inclusive do regime de Assad, nos escritórios do governo".

    Simpatizantes de Assad o acusam de ser "laranja" das potências ocidentais antirregime -na visão deles, um homem sozinho, apenas com um computador e um celular, não seria capaz de montar uma estrutura desse porte (se é que ela existe).

    Ele nega, mas deixa escapar: "Alguns dos nossos recebem ajuda de setores da União Europeia, mas é para suporte da vida deles, não para informação. Ninguém atua para nós por dinheiro".

    Rahman diz que dorme à 1h e acorda às 5h todos os dias. Por Skype, da Síria, um grupo de "editores" o ajuda na publicação, segundo ele. "Em 2011, 16 colaboradores morreram, mas não publicamos para não dar pistas e, desde então, pedimos que nunca revelem que atuam pelo observatório", diz.

    Ele tenta adotar tom neutro, "em nome dos direitos humanos", mas não esconde o foco: "Os governos, inclusive o do Brasil, deveriam buscar uma solução política sem Assad. Não podemos ter um assassino na Síria".

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