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    Opositor se 'peroniza' às vésperas da eleição na Argentina

    MARIANA CARNEIRO
    DE BUENOS AIRES
    SYLVIA COLOMBO
    ENVIADA ESPECIAL A BUENOS AIRES

    20/10/2015 02h00

    Na última semana da corrida eleitoral argentina, o principal candidato opositor, Mauricio Macri, quis encerrar a campanha em um bairro pobre da periferia da capital.

    Em Villa Soldati, extremo sul da cidade, Macri, da coligação Mudemos, visitou um restaurante popular gratuito.

    Centros como esse se multiplicaram na crise de 2001. Passados 14 anos, a Fundação Margarita Barrientos, que mantém o local, informa que serve 1.800 refeições diárias a moradores da vizinhança de casas sem reboco e ruelas.

    Luciana Granovsky/AFP
    Principal candidato da oposição, Mauricio Macri abraça morador da periferia de Buenos Aires
    Principal candidato da oposição, Mauricio Macri abraça morador da periferia de Buenos Aires

    Macri não é o candidato que representa os mais pobres nesta eleição presidencial. Nas camadas de eleitores com renda até 5.000 pesos por mês (R$ 1.300), ele perderia de lavada para o peronista Daniel Scioli, candidato de Cristina Kirchner.

    "Analisando os votos por sexo ou por idade, não se nota diferença entre os eleitores de Macri e Scioli. A distância aparece por classes sociais. Macri venceria a eleição no primeiro turno se dependesse dos que ganham mais de 25 mil pesos, mas não consegue penetrar nos estratos mais baixos", avalia o analista Jorge Giacobbe Filho.

    A cinco dias da eleição presidencial, neste domingo (25), o candidato tenta capturar votos dos seus "não-eleitores" para forçar um segundo turno contra Scioli. As pesquisas sugerem que o peronista poderia vencer já, mas o número elevado de indecisos deixa uma interrogação.

    "O placar está apertado com probabilidade levemente maior de Scioli vencer no primeiro turno, mas eu não poria todas as fichas aí", diz o analista Ricardo Rouvier.

    Eleições na Argentina

    "POBREZA ZERO"

    Diante da incerteza, Macri passou nos últimos dias por um banho de peronismo. Maior corrente política argentina, o movimento tem adeptos de diferentes matizes, abarcando militantes da extrema esquerda comunista à extrema direita cristã.

    O discurso de Macri, até então voltado a princípios republicanos e respeito às instituições, girou para a proposta de programas sociais. Adotou a bandeira da "pobreza zero" e prometeu criar renda mínima para os mais velhos.

    Na economia, deixou de lado assessores mais liberais, como Carlos Melconiam e Federico Sturzenegger, e passou a aparecer com o desenvolvimentista Afonso Prat-Gray.

    Antes feroz crítico das estatizações promovidas pelo kirchnerismo, Macri passou também a garantir que manteria o atual status da Aerolíneas Argentinas e da YPF.

    O auge da "peronização" de Macri ocorreu quando o candidato inaugurou uma estátua de Juan Domingo Perón no centro de Buenos Aires, dia 8. No discurso, arriscou frases famosas do mítico político, como "mais importante que prometer é fazer", e disse que Perón o inspirou.

    "O peronismo não é prepotência nem soberba, é justiça social. Esse é o peronismo que reivindico", discursou, dando um nó nos peronistas tradicionais como o ex-presidente Eduardo Duhalde.

    INTENÇÃO DE VOTO NA ARGENTINA - Dados de pesquisas por três institutos (em %)

    "Macri não é peronista", disse o ex-mandatário, que foi ao evento, mas afirmou que não iria votar em Macri.

    A transformação do candidato, diz o economista Marcelo Elizondo, da consultoria DNI, indica que, se eleito, ele poderia adequar parte do discurso à prática. À campanha de Macri, Elizondo recomendou, por exemplo, que os benefícios sociais do kirchnerismo sejam substituídos gradativamente por um programa de empregos.

    "Não poderia se pensar em acabar com programas de assistência social, não só porque isso teria impacto político negativo, mas porque prejudicaria a economia como ela está constituída, prejudicando os menos favorecidos."

    Em Villa Soldati, onde passou menos de uma hora, Macri fez mais uma promessa, para a certeza de aplausos.

    "Pretendemos conceder 750 mil escrituras em todo o país para que as famílias saibam que são donas do lugar em que vivem", prometeu.

    Mas a promessa, já feita em sua campanha à administração local sem ser cumprida, não conquistou a todos.

    "Voto no candidato de Cristina", disse o motorista Leandro (ele omitiu o sobrenome).

    Para a lavadeira Hermelinda Giménez, ainda indecisa, "a vida melhorou muito com Cristina". Ela diz que a rua foi asfaltada, e o centro de saúde comunitário mantido em conjunto com o governo da cidade, funciona. Sua filha, porém, está em escola particular. "Há escolas públicas [sob gestão do governo Macri], mas faltam professores."

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