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    Candidatos argentinos 'esquecem' direitos humanos

    SYLVIA COLOMBO
    ENVIADA ESPECIAL A BUENOS AIRES

    MARIANA CARNEIRO
    DE BUENOS AIRES

    22/10/2015 02h00

    Uma das principais bandeiras de propaganda da gestão Cristina Kirchner, o julgamento de repressores da ditadura militar argentina (1976-83) está prestes a chegar a uma etapa diferente.

    Com o fim do governo kirchnerista, em dezembro, espera-se que o tema dos direitos humanos entre em um período de mais lentidão.

    Nenhum dos candidatos que concorrem à Casa Rosada se comprometeu até agora em manter a política de punição de militares envolvidos em torturas e assassinatos da ditadura, menos ainda em estender os julgamentos a empresários supostamente aliados da repressão –novíssima bandeira de Cristina.

    Patricio Murphy - 31.ago.2015/Xinhua
    Membros do grupo Avós da Praça de Maio anunciam 'descoberta' de netos que ditadura tirou dos pais
    Membros do grupo Avós da Praça de Maio anunciam 'descoberta' de netos que ditadura tirou dos pais

    Num primeiro momento, após a posse de Néstor Kirchner, em 2003, foram anulados indultos concedidos nos anos 1980/90, o que permitiu a abertura de mais de 2.000 processos e a condenação de mais de 300 responsáveis por crimes, incluindo oficiais de alto escalão.

    O caso mais exemplar foi o do ex-ditador Jorge Rafael Videla (1925-2013), que morreu cumprindo pena de prisão perpétua, em cárcere militar.

    RETA FINAL

    Agora, estão na reta final os chamados "megacasos", processos abertos contra agentes e ex-militares que atuaram juntos. O primeiro é relacionado a torturas e homicídios praticados na Esma (Escola de Mecânica da Armada), em que 59 repressores são acusados de 789 crimes.

    O outro é o chamado "caso Condor", no qual 18 pessoas respondem por associação ilícita e crimes cometidos em Chile, Uruguai e Argentina. Ambos devem estar concluídos ainda neste ano.

    "São processos inéditos, em que geraremos jurisprudência para casos parecidos. Esperamos que as sentenças do Condor sejam proferidas até janeiro", disse à Folha o promotor responsável pela causa, Pablo Ouviña.

    Apesar de o impulso aos julgamentos ter sido uma política de Estado do governo Kirchner, associações de direitos humanos, juízes veteranos e historiadores recusam a versão governista de que a Justiça com relação aos crimes da ditadura tenha tido início no kirchnerismo.

    "Esse ciclo que se encerra agora começou em 1983, com a redemocratização do país e o Julgamento das Juntas [no governo de Raúl Alfonsín]", afirmou Ouviña.

    A ex-governadora Graciela Fernández Meijide, 84, uma das líderes da Comissão Nacional sobre o Desaparecimento de Pessoas (criada em 1983), concorda com Ouviña.

    Mãe de Pablo, assassinado pela repressão militar em 1977, ela afirmou em entrevista recente à Folha que, nos anos 80, o casal Kirchner não tinha nenhuma opinião sobre o tema, não militava nem se engajava na questão.

    "Tanto os Kirchners não sabiam do assunto que, para se eleger governador de Santa Cruz, província com forte presença de bases militares, Néstor suspendeu a lei que lembra a ditadura no dia 24 de março. Com isso, conseguiu 4.500 votos da família militar. Esses eram os Kirchners com os direitos humanos."

    Para o historiador norte-americano John Dinges, especialista no estudo das ditaduras latino-americanas, o modo como a Argentina vem lidando com os crimes dos anos 1970 é "exemplar".

    "Hoje vemos que outros países estão também trilhando esse caminho, como o Chile e o Uruguai. O Brasil, infelizmente, não fez quase nada nessa área", disse, em entrevista à Folha.

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