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    Eleições acirradas reforçam divisão entre artistas contra e pró-Kirchner

    SYLVIA COLOMBO
    ENVIADA ESPECIAL A BUENOS AIRES

    23/10/2015 11h14

    "Eu adoro cultura. Sou amigo do Ricardo Montaner, do [duo] Pimpinela, do Julio Iglesias."

    A frase do candidato governista Daniel Scioli, fazendo referências a artistas comerciais considerados pertencentes ao universo cafona, em vez de se referir a grandes cineastas ou autores argentinos, fez intelectuais e o mundo da cultura entrarem em polvorosa.

    O diretor da Biblioteca Nacional, Horacio Gonzalez, disse na quinta-feira (22): "espero que sua política cultural não seja moldada por seus gostos particulares".

    Eitan Abramovich - 22.out.2015/AFP
    Buenos Aires governor and presidential candidate for the ruling Frente para la Victoria (Front for Victory) party, Daniel Scioli (C), and his wife Karina Rabolini (L), look at Argentine-born Venezuelan singer Ricardo Montaner (R) as he performs during the closing rally of the campaign in Buenos Aires, on October 22, 2015. General elections will be held on October 25 in Argentina. AFP PHOTO/Eitan Abramovich ORG XMIT: EAS312
    Ricardo Montaner canta em comício do candidato kirchnerista, Daniel Scioli, na noite desta quinta (22)

    Na mesma entrevista, porém, concedida à revista "Ñ", caderno de alta cultura do jornal "Clarín", Scioli não deu indícios de que mudaria o direcionamento propagandístico das políticas culturais de Cristina Kirchner. Afirmou que ampliaria Tecnópolis (parque temático de ciência e história que celebra os avanços do kirchnerismo) e indicou que continuaria a promover os festejos das datas pátrias e as manifestações folclóricas nacionais.

    No ato de encerramento de sua campanha, na quinta, o argentino-venezuelano Ricardo Montaner, um dos maiores vendedores de discos do pop latino-americano, cantou em homenagem "ao meu amigo Daniel". O curioso é que, em Caracas, onde vive, Montaner é um férreo opositor ao chavismo, tendo feito campanha para seu principal rival, Henrique Caprilles.

    CARTA ABIERTA

    "Vou votar em Scioli, sim, mas triste. E nosso grupo não vai se expressar sobre a eleição em conjunto. Cada um atuará por sua conta", completou Horacio González. Suas declarações podem encerrar as atividades do grupo Carta Abierta, fundado em 2008 para apoiar o governo Cristina Kirchner quando este se enfrentava com os ruralistas e começava a perder popularidade.

    Formado por intelectuais e acadêmicos argentinos reconhecidos, como González, Ricardo Foster e Horacio Verbitsky, entre outros, o Carta Abierta ajudou Cristina a formular seu discurso sobre a "batalha cultural", expressão usada para referir-se a luta contra os meios independentes e pela difusão de sua versão da história recente argentina.

    Se perde um apoio mais engajado de intelectuais de prestígio, Scioli segue popular entre figuras do cinema e da música pop.

    Declararam voto nele os atores Pablo Echarri, Juan Minujín e Mercedes Morán, além do cantor Fito Páez.

    RICARDO DARÍN

    Ausente da Argentina nesse período eleitoral por estar apresentando uma peça em Madri, Ricardo Darín não anunciou voto nessa eleição.

    Yves Herman - 17.mai.2014/Reuters
    Cast member Ricardo Darin attends a news conference for the film "Relatos salvajes" (Wild Tales) in competition at the 67th Cannes Film Festival in Cannes May 17, 2014. REUTERS/Yves Herman (FRANCE - Tags: ENTERTAINMENT HEADSHOT) ORG XMIT: SAA77
    O ator Ricardo Darín, que não se posicionou

    Em 2013, o ator enfrentou-se com Cristina Kirchner, acusando-a de provocar uma divisão na sociedade.

    Sobre a votação de domingo, a única declaração que deu foi ao jornalista Nelson Castro, em seu programa de rádio.

    O ator pediu que os argentinos votem "olhando para a frente, e que aprendamos a conviver. E que todos baixemos os decibéis, porque não existem apenas dois lados."

    Ao contrário do desejo de Darín, porém, a disputa acirrada pelo cargo de presidente tem reforçado o clima de Fla x Flu entre entre artistas e intelectuais K e anti-K.

    Na lista dos apoiadores do opositor Mauricio Macri estão alguns nomes de peso: o sociólogo Juan Jose Sebreli, o ensaísta e poeta Santiago Kovadloff e o filósofo Alejandro Rozitchner. Estes encabeçaram um abaixo-assinado de apoio ao candidato do PRO.

    Ao enumerar seus gostos culturais, Macri também saiu-se um pouco melhor: disse ser admirador da veterana do teatro e do cinema Norma Aleandro (espécie de Fernanda Montenegro local) e do filme "O Segredo de Seus Olhos", vencedor do Oscar em 2009.

    O diretor dessa obra, Juan José Campanella (o mesmo de "O Filho da Noiva"), aliás, também é um dos entusiastas eleitores de Macri.

    Campanella tem chamado o voto para o oposicionista via Twitter. "Existem apenas duas melodias. Kirchnerismo e Mudemos (nome da aliança de Macri). Vote no primeiro turno como se fosse o segundo", disse, pedindo o voto útil para o prefeito de Buenos Aires. Campanella vinha até agora apoiando Margarita Stolbizer (Progressistas), mas decidiu mudar porque considera importante impedir a vitória de Scioli num primeiro turno.

    O prefeito de Buenos Aires também tem um pé na chamada "farândula", o mundo do espetáculo local. Uma de suas eleitoras mais ardentes é a apresentadora Susana Gimenez.

    Macri tem criticado a proliferação de espaços culturais em Buenos Aires usados para propaganda do governo, como o Centro Cultural Kirchner, imenso espaço para shows e exposições num edifício histórico no centro da cidade, e o Museo do Bicentenário.

    "Não vou acabar com eles, agora que já estão aí, trataremos de aproveitar da melhor maneira possível. Mas Buenos Aires já tem muita oferta, o teatro Colón, o San Martín. Melhor seria construir algo assim em outra província."

    Eleições na Argentina

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