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    Aniversário da morte de Yitzhak Rabin levanta questões em meio à violência

    IAN BLACK
    DO "THE GUARDIAN", EM JERUSALÉM

    27/10/2015 11h14

    Em meio a um clima desagradável e reflexivo, os israelenses marcam o 20º aniversário do assassinato de Yitzhak Rabin –o primeiro-ministro que deu um passo histórico em direção à paz com os palestinos–, ligando o homicídio dele por um nacionalista de direita à mais recente onda de violência entre árabes e judeus e às perspectivas sombrias de um fim definitivo para o conflito.

    Rabin foi homenageado na segunda-feira (26) em cerimônias no cemitério do Monte Herzl, em Jerusalém, e no Knesset (o Parlamento israelense), depois que o presidente Reuben Rivlin prometeu solenemente que o assassino impenitente de Rabin, Yigal Amir, jamais seria libertado da prisão. Muitos outros eventos devem ocorrer em todo o país nos próximos dias.

    Em setembro de 1993, Rabin assinou o acordo de Oslo com o líder da OLP (Organização para a Libertação da Palestina), Yasser Arafat, quando o presidente Bill Clinton assistiu ao famoso aperto de mão hesitante no gramado da Casa Branca. Foi um marco na guerra centenária pela Terra Santa, embora controverso, pois gerou forte oposição em ambos os lados.

    Marc Israel Sellem - 26.out.2015/Xinhua
    (151026) -- JERUSALEN, octubre 26, 2015 (Xinhua) -- El primer ministro israelí Benjamin Netanyahu reacciona durante la ceremonia oficial memorial por el fallecido primer ministro israelí, Yitzhak Rabin, llevada a cabo en el Monte Herzel, en Jerusalén, el 26 de octubre de 2015. Jerusalén y Tel Aviv conmemoraron el 20 aniversario del asesinato del fallecido primer ministro israelí, Yitzhak Rabin. Yitzhak Rabin fue asesinado después de asistir a una manifestación masiva en favor de la paz en Tel Aviv el 4 de noviembre de 1995, después de meses de incitación y de protestas de extremistas de derecha y una oleada de ataques terroristas. (Xinhua/JINI/POOL/Marc Israel Sellem) (da) (sp)
    O premiê Binyamin Netanyahu participa de cerimônia que marcou os 20 anos da morte de Rabin

    Mas seu assassinato em um comício pela paz em Tel Aviv, em 4 de novembro de 1995 (o aniversário é marcado segundo o calendário hebraico), foi amplamente visto como um golpe nas esperanças de que o acordo interino, envolvendo uma retirada parcial israelense e a criação de uma Autoridade Palestina, poderia de fato liderar o caminho para uma paz justa e duradoura.

    "Infelizmente, não tenho nenhuma novidade", disse, com tristeza, a filha de Rabin, Dalia, no túmulo de seu pai na segunda-feira –os discursos de homenagem foram transmitidos ao vivo na TV. "Não há processo de paz. Estamos enfrentando terrorismo. Sangue está sendo derramado novamente. Não tenho nenhum outro país e meu país mudou."

    Rabin é lembrado como um soldado –expulsou palestinos em massa durante a guerra de 1948 e como chefe de gabinete durante a vitória 1967, quando Israel ocupou a Cisjordânia, Jerusalém Oriental e a Faixa de Gaza. Mas o general que virou pacificador também foi o primeiro líder político israelense a ser assassinado –e, surpreendentemente, por outro judeu; não, como sempre pareceu mais provável, por um árabe.

    O 20º aniversário de sua morte viu uma enxurrada de comentários contra um contexto excepcionalmente turbulento: alta tensão no local do Monte do Templo, como é conhecido pelos israelenses, ou Esplanada das Mesquitas, como é chamado pelos palestinos, em Jerusalém Oriental, e a morte de 50 palestinos e dez israelenses nas últimas semanas. Seja isso ou não uma nova intifada, veio como um lembrete cruel da natureza intratável do conflito e a persistência da ocupação –sem mencionar o ódio e o desespero que podem irromper quando morrem as esperanças de encontrar uma solução.

    Binyamin Netanyahu, o primeiro-ministro, do partido Likud, fez uma conexão imediata com a violência atual. "Eu não concordava em tudo com Yitzhak Rabin", disse no encontro no Monte Herzl.

    "Rabin queria acabar com o conflito e trabalhou pela a paz, mas também foi forçado a lidar com a onda cruel de terror. Nenhuma faca, nenhuma pedra, nenhuma bomba de gasolina ou mina vai nos parar. Nunca nos renderemos ao terrorismo."

    Em meados da década de 1990, Netanyahu, então na oposição e crítico feroz ao acordo de Oslo, foi responsabilizado por contribuir para uma atmosfera de incitamento. Ativistas de direita retrataram Rabin com uniforme da SS enquanto rabinos extremistas, pró-assentamentos, decidiram que, conversando com a OLP e cedendo território para Arafat, Rabin era um traidor –opiniões que Amir usou para justificar seu crime.

    Grande parte do discurso atual em torno da morte de Rabin é sobre o perigo do extremismo na sociedade israelense. "Os tiros que o mataram miravam a própria essência do Estado soberano judeu", disse o professor Yedidia Stern ao jornal "Haaretz" esta semana. "O sangue na calçada era o sangue da própria democracia." As escolas pararam as aulas em nome do assassinato político e da importância da tolerância.

    No entanto, críticos questionam a forma como Rabin é visto. "As principais forças políticas em Israel hoje são os colonos extremistas, e a memória de Rabin não tem nada a ver com eles", disse Tom Segev, um dos principais historiadores de Israel.

    "Rabin se tornou o garoto-propaganda do que o sionismo e Israel perderam. Ele era o oposto dos fanáticos. Era secular, pragmático e sensato. Foi o último dos belos israelenses ."

    Muitos são claramente favoráveis a um primeiro-ministro mais decisivo do que Netanyahu, sejam quais forem as suas opiniões. "Israel precisa de um líder com o DNA de Rabin, que atuará com fé e determinação para chegar a um acordo", disse Uzi Baram, um ex-ministro do Trabalho.

    Os palestinos estão céticos. Em 1987, quando a primeira Intifada irrompeu, Rabin era o ministro da Defesa, que ameaçou "quebrar os ossos" dos jovens atiradores de pedras que confrontavam a ocupação. "Rabin nunca quis um Estado palestino", disse Mahdi Abdel-Hadi do centro de estudos Passia. "Ele fez política e trabalhou com um Arafat isolado e corrupto. Queria conter a OLP, domar a megera. Oslo era uma ilusão. Israelenses que acreditam que o acordo teria levado a uma verdadeira paz estão se iludindo".

    Mas, se a memória contém elementos de mito, continua a ser poderosa. Na segunda-feira à noite, o Canal 2 da TV israelense transmitiu uma entrevista sobre Rabin com Clinton, que descreve sua devastação quando a notícia impressionante chegou ao Salão Oval. "Meus primeiros pensamentos não foram nem mesmo sobre o processo de paz", disse o ex-presidente dos EUA, lembrando. "Foram apenas sobre o meu amigo. Em seguida, imediatamente pensei, 'isso poderia matar todos os sonhos dele.'"

    Depois de 20 anos da morte de Rabin, israelenses e palestinos concordam em pouca coisa. Mas muitos em ambos os lados estão certos de que Oslo está morto, ou em seus últimos dias de vida –com dúvidas crescentes se seu legado institucional, a Autoridade Palestina na Cisjordânia sob o sucessor de Arafat, Mahmoud Abbas, pode sobreviver muito mais tempo.

    "Rabin provavelmente tinha mais chances de forjar uma reconciliação duradoura entre israelenses e palestinos do que qualquer outro líder, antes ou depois", escreveu Dan Ephron em "Killing a King" (Matando um Rei, em tradução livre), um novo livro fascinante sobre o primeiro-ministro e seu assassino. "Uma das consequências exasperantes do assassinato é que nunca saberemos o quão próximo ele teria chegado."

    Tradução de MARIA PAULA AUTRAN

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