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    paris sob ataque

    Eventos como Olimpíada são ímãs para terroristas, diz especialista

    DANIELA KRESCH
    COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, DE TEL AVIV

    19/11/2015 11h42

    Divulgação/International Institute for Counter-Terrorism
    Boaz Ganor, presidente da Academia Internacional de Contraterrorismo
    Boaz Ganor, especialista de Israel que é presidente da Academia Internacional de Contraterrorismo

    Para Boaz Ganor, um dos maiores especialistas em contraterrorismo de Israel, o Brasil não está menos vulnerável do que a Europa a ataques terroristas.

    Diretor-executivo do Instituto de Contraterrorismo do Centro Interdisciplinar de Herzelyia e presidente da Academia Internacional de Contraterrorismo, Ganor diz acreditar que o Ocidente não deve ter ilusões sobre a lógica dos jihadistas e encontrar um equilíbrio entre antiterrorismo e valores democráticos.

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    Folha - A presidente Dilma Roussef afirmou que o Brasil está "muito longe" do foco de terroristas. Ela admitiu que o Brasil não está "completamente protegido", mas afirmou que o terrorismo está mais concentrado na Europa...

    Boaz Ganor - Estou chocado com isso. Não é apenas uma concepção errada, mas perigosa. O Brasil é vulnerável ao terrorismo de grupos jihadistas não menos do que Paris, ou até mais. O fato de que esses atentados não aconteceram no Brasil até agora é porque as prioridades dos jihadistas, no momento, são outras.

    Há perigo de atentados durante a Olimpíada do Rio, em 2016?

    Claro. O Brasil não faz parte da coalizão que está atacando as bases do Estado Islâmico na Síria e no Iraque. Mas, quando representantes de EUA, França, Alemanha estiverem no Rio para a Olimpíada, tudo será diferente. Os atentados em Paris tinham como alvo também um jogo de futebol. Eventos esportivos são ímãs para terroristas. Se a concepção for a de que o Brasil está seguro, temo o perigo de decepção e choque profundo.

    O que aconteceu na França era esperado?

    Sim e não. Não é uma surpresa que houve atentados. A França, nos últimos anos, se tornou uma incubadora de fundamentalistas. A surpresa foi modus operandi dos atentados. Até agora, havia o que chamo "ataques de iniciativa pessoal", cometidos por lobos solitários ou células pequenas inspiradas no EI. Mas o que aconteceu em Paris foi um "atentado organizacional". O EI tomou a iniciativa, recrutou e treinou os terroristas, foi responsável pela confecção dos explosivos, a compra de armas, a coleta de informações. Essa é a novidade, um modus operandi que imita o da Al-Qaeda.

    Mas por que o EI decidiu, agora, tomar essa iniciativa contra a França? Não previa que os franceses e sua coalizão fossem retaliar?

    O Ocidente pensa que os terroristas ou são malucos, não têm lógica, ou são totalmente racionais. Errado. Eles são sim racionais, mas sua lógica é diferente da ocidental. Um dos motivos do atentado foi atuar contra países que estão atacando o EI no Iraque e na Síria. Houve um atentado no Sinai contra o avião russo, em Beirute contra o Hezbollah, e em Paris. O EI quer passar uma mensagem de dissuasão contra quem atua contra eles, a coalizão iraniana-xiita-russa e a americana-europeia-ocidental. A segunda explicação é mais no plano psicológico. O EI precisa demonstrar sucessos perante seus seguidores e crentes para continuar recrutando-os. Como, nos últimos meses, não registram sucessos militares, precisam realizar atentados desse tipo. O massacre de centenas de civis ocidentais numa capital europeia é uma enorme vitória.

    Quais os passos que a Europa deve tomar?

    O primeiro é entender a lógica dos terroristas. O Ocidente se encontra numa espécie de ilusão e evita encarar o problema. Até pouco tempo, a luta de pessoas como eu era chamada de "contraterrorismo". Mas o presidente americano, Barack Obama, decidiu mudar o nome para "Contra extremismo violento". Por quê? Porque teme usar a terrível palavra "terrorismo" e ofender alguém. Não se trata, ao meu ver, de culpar o Islã. A maioria absoluta dos muçulmanos não apoia o terrorismo. Mas, não se pode ignorar o fato de que há aqui um aspecto religioso profundo na base desse fenômeno. Você pode lidar com isso através de apaziguamento, sendo "politicamente correto", não fazendo uma ligação entre as palavras "terrorismo" e "islamismo". Mas estará colocando a cabeça dentro da terra.

    Como mudar isso?

    É um problema geral. Os terroristas se infiltraram, sob a cobertura do multiculturalismo, em quase todos os países do mundo. É preciso fazer "engenharia reversa" e construir uma política de imigração diferente. Não digo não receber imigrantes, mas inserir elementos como o critério da boa vontade em aceitar os valores, a cultura e a língua locais. É preciso mudar a legislação e permitir a luta constante contra elementos incitadores. Criar agências de inteligências, combate e negociação internacionais.

    Mas isso não afetaria os valores liberais europeus?

    Tudo isso precisa acontecer sob o que chamo de "exercício do dilema democrático". Como lidar com duas tendências contraditórias, a eficiência na luta contra o terrorismo e o resguardo dos valores democráticos? A arte da luta contra o terrorismo é encontrar o equilíbrio. Aqui é medida a capacidade de um líder. Alguns governos tendem a pular do liberalismo total para o radicalismo total nas leis antiterrorismo. Acadêmicos e intelectuais têm que dizer: "Alto lá, mesmo nesta época difícil, vamos encontrar o equilíbrio correto".

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