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    Agressão a centros reacende debate sobre ditadura na Argentina

    SYLVIA COLOMBO
    ENVIADA ESPECIAL A BUENOS AIRES

    22/11/2015 10h55 - Atualizado às 11h47

    Dois centros dedicados à memória dos crimes de lesa-humanidade cometidos durante a ditadura militar (1976-83) foram alvo de agressões na última sexta-feira (20).

    A Mansión Seré, um conhecido centro clandestino de tortura, amanheceu com a pichação: "No dia 22 se acaba o curral".

    Na/AFP
    Pichação na parede da Mansion Sere, um conhecido centro clandestino de tortura que virou centro em memória às vítimas
    Pichação na parede da Mansion Sere, um conhecido centro clandestino de tortura que virou memorial

    A frase faz referência ao termo utilizado pelo candidato Mauricio Macri (Mudemos) para referir-se aos benefícios recebidos pelos grupos de defesa de direitos humanos que são alinhados ao governo de Cristina Kirchner.

    O local ficou famoso após o lançamento do filme "Crônica de uma Fuga" (Adrián Caetano, 2006), que conta a história de como um grupo de prisioneiros, encabeçado por Claudio Tamburrini, conseguiu escapar dali em plena ditadura. Na época goleiro do time de futebol Almagro, Tamburrini escreveu o livro que deu origem ao filme. Depois da fuga, mudou-se para a Suécia, onde vive até hoje.

    "Levamos um susto com o grafite. Não sabemos se é alguém do bairro, mas sem dúvida se trata de alguém que quer a derrota da Scioli", disse Laura Federico, moradora de Castelar (província de Buenos Aires), onde está localizada a Mansión Seré. Curiosos compareceram para tirar fotos do local.

    Pouco depois, foi a vez do centro cultural Haroldo Conti, que funciona no prédio da antiga e temida Esma (Escola Superior de Mecânica da Marinha), principal centro clandestino de detenção do regime militar, em Buenos Aires, onde se cometeram torturas, execuções e roubos de bebês. Hoje, a ex-Esma é um local de exposições e shows. Na sexta à noite, se apresentou aí o conjunto de Ignacio de Carlotto, neto da fundadora das Avós da Praça de Maio, e a presença da ativista, de 85 anos, estava confirmada.

    O centro recebeu uma ligação anônima no começo da tarde, afirmando que havia uma bomba ali. O local ficou fechado por quatro horas, enquanto os bombeiros buscaram o explosivo, não encontrado.

    "Esse foi um ataque contra a pessoa de Estela e contra o que representa esse espaço e nossa luta", disse o diretor do espaço, Eduardo Jozami, pouco antes do início do concerto.

    Carlotto foi muito aplaudida ao entrar, e condenou as agressões. "São um ataque contra as vítimas, contra a luta dos movimentos de direitos humanos e contra as políticas que vêm sendo realizadas nos últimos anos."

    Aos que a cumprimentavam ao final do show, dizia: "Ainda temos um dia de esperança", referindo-se à possibilidade de o governista Daniel Scioli virar o jogo e sair-se vencedor.

    Carlotto vem acusando o candidato da oposição, favorito nas pesquisas, de não valorizar os direitos humanos e de sinalizar que pode colocar freio nos julgamentos de repressores, tidos como política de Estado desde que Néstor Kirchner assumiu, em 2003. "Macri só fala em olhar para a frente. Vai soltar os repressores", disse Carlotto.

    Macri vem afirmando que não mudará a atual política de direitos humanos, mas evita dar detalhes sobre o que vai ocorrer com processos em curso. Pessoas de seu círculo de poder, como Diego Guelar, já se pronunciaram a favor de uma anistia. Além disso, Macri tem o apoio de advogados que pertencem a uma associação que reivindica o fim dos julgamentos.

    À Folha, sua equipe declarou que o Mudemos "não se responsabiliza por quem nos apoia". Porém, uma lista de intelectuais que continha o nome de um desses advogados foi divulgada pelo próprio Macri em sua conta de Facebook, junto a uma carta de agradecimento.

    Com relação ao assunto, o governista Daniel Scioli se posiciona a favor da "continuidade" nas políticas de direitos humanos, mas o tema tampouco foi muito recorrente em sua campanha.

    Várias figuras importantes do kirchnerismo se pronunciaram contra os ataques, como o secretário Daniel Filmus. Já o centro cultural Haroldo Conti divulgou uma carta condenando os atos.

    Durante a ditadura, mais de 20 mil pessoas desapareceram.

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