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    Traficante 'El Chapo' deu entrevista a Sean Penn enquanto fugia

    MARCELO NINIO
    DE WASHINGTON

    10/01/2016 02h19 - Atualizado às 23h19

    Reprodução/Rolling Stone
    Imagem divulgada pela revista "Rolling Stone" do ator Sean Penn com o megatraficante Joaquín "El Chapo" Guzmán
    Imagem divulgada pela revista 'Rolling Stone' de Sean Penn com o megatraficante Joaquín 'El Chapo'

    "El Chapo fala: Visita secreta ao traficante mais procurado do mundo."

    Sob esse título, a revista "Rolling Stone" publicou na madrugada deste domingo (10) entrevista assinada pelo ator norte-americano Sean Penn com Joaquín Guzmán Loera, em mais um episódio cinematográfico da trajetória do narcotraficante mexicano.

    Na antevéspera, as autoridades do México haviam anunciado a prisão de Chapo Guzmán, seis meses após sua espetacular fuga de uma prisão de segurança máxima.

    Em um longo texto, Penn (conhecido tanto por seu ativismo à esquerda, como o apoio a Hugo Chávez, como por filmes como "Sobre Meninos e Lobos" e "Milk: A Voz da Igualdade", que lhe renderam o Oscar) conta os bastidores e negociações do encontro de sete horas regado a tequila que teve com Chapo.

    Os dois se encontraram em 2 de outubro de 2015, num acampamento no meio da selva mexicana, quando o traficante estava foragido.

    O ponto de contato foi a atriz mexicana Kate del Castillo, conhecida pelo papel de chefona do tráfico na telenovela "A Rainha do Sul".

    Em 2012, ela causou polêmica ao dizer que confiava mais nos cartéis de drogas do que no governo.

    Numa mensagem em uma rede social, a atriz se dirigia ao Chapo, pedindo que ele se engajasse em causas sociais e traficasse "com amor".

    FROTA DE AVIÕES

    No encontro na selva, Guzmán jantou com os atores e gabou-se do tamanho de seu império. "Forneço mais heroína, metanfetamina, cocaína e maconha do que qualquer um no mundo. Tenho uma frota de submarinos, aviões, caminhões e barcos."

    Mas o encontro foi interrompido e a entrevista só seria consumada semanas depois, quando o traficante enviou 36 respostas gravadas em um vídeo ao ator norte-americano.

    Com naturalidade e sem sinal de remorso, Guzmán relembra sua trajetória, do adolescente pobre de 15 anos em Badiraguato, município com menos de 4.000 habitantes no sudoeste do México até tornar-se o maior traficante do mundo.

    "Não havia oportunidades de emprego. O único jeito de ganhar dinheiro para comprar comida, para sobreviver, é cultivar papoula [planta usada na produção de heroína], maconha, naquela idade eu comecei a cultivar e vender", conta Guzmán.

    Sem negar o estrago causado pelo produto que comercializa, ele repete que não teve alternativa. "É uma realidade que a droga destrói. Infelizmente, como disse, no lugar onde cresci não havia outro jeito de sobreviver", diz.

    Logo em seguida, diz que nunca foi viciado e não usa drogas há 20 anos.

    Penn descreve uma viagem de 14 horas floresta adentro até chegar a Chapo Guzmán.

    Depois do vôo de Los Angeles "a uma cidade no centro do México", mais duas horas de avião e dez de carro, com Alfredo Guzmán, um dos filhos do traficante, ao volante de uma caminhonete.

    Em uma barreira militar, os soldados recuam só de ver o rosto de Alfredo, numa demonstração da cooperação das autoridades para manter o refúgio do traficante. A descrição se encaixa nas críticas sofridas pelo governo mexicano após a fuga de Guzmán, de corrupção e conivência de parte das autoridades.

    A entrevista nasceu de um contato do traficante com a atriz Kate del Castilho, manifestando o desejo de realizar um filme sobre sua trajetória.

    De acordo com as autoridades mexicanas, esse e os contatos posteriores permitiram que o fugitivo fosse rastreado e preso. Uma fonte do governo mexicano afirmou o encontro de Penn com Guzmán em outubro era conhecido e ajudou nas buscas.

    Agora, segundo a agência de notícias AFP, as autoridades mexicanas querem ouvir Penn para esclarecer as circunstâncias do encontro.

    Na extensa introdução à entrevista, o ator ataca a política antidrogas dos EUA e atribui responsabilidade direta aos norte-americanos pela disseminação das drogas.

    "Nós somos os consumidores e, como tais, cúmplices em cada assassinato", escreve Penn, que ao longo de todo o relato revela o temor de ser morto pelas autoridades ou pela gangue de Guzmán.

    Num momento de pânico bem humorado, ele se embrenha na mata para urinar, antes do encontro: "Com o pênis na mão, eu o considero uma das partes do meu corpo vulneráveis às facas de traficantes irracionais, e dou uma última olhada, antes de devolvê-lo as minhas calças".

    Entretanto, na entrevista, o maior traficante do mundo se diz alheio a violência.

    "Tudo o que faço é para me defender. Mas eu busco encrenca? Nunca", afirma Guzmán. "Sei que um dia eu vou morrer. Espero que seja de causas naturais."

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