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    Análise

    Irã sai do isolamento imposto pelo Ocidente

    HUSSEIN KALOUT
    ESPECIAL PARA A FOLHA

    18/01/2016 02h00

    Após quase 40 anos de sanções econômicas e de isolamento político imposto pelo Ocidente, o Irã dá um importante passo para reintegrar-se ao sistema internacional e às cadeias globais de produção.

    No bojo desse fato histórico, é necessário reconhecer dois axiomas centrais. Primeiramente, a disposição do governo de Hasan Rowhani de partir para o diálogo em alto nível com Washington. Em segundo, a compreensão por parte dos EUA da complexidade que se impunha no contexto interno da política iraniana para se avançar nas negociações nucleares.

    Se por um lado consolidava-se, nas principais capitais das potências ocidentais, a percepção da irreversibilidade do crescente poder de Teerã no Oriente Médio como um "player" altamente qualificado, por outro, a nova face do Irã diferenciava-se das administrações anteriores não apenas no conteúdo, mas, sobretudo, na forma de dialogar com o Ocidente.

    O elástico grau de pragmatismo da administração Obama, concordando com a reivindicação de Teerã de restringir a negociação ao programa nuclear, foi uma importante concessão para o êxito do acordo e para a implantação dessa etapa inicial.

    Ou seja, não seria plausível do ponto de vista de Teerã solucionar o contencioso nuclear e negociar, concomitantemente, temas ancorados a outros ângulos da geopolítica do Oriente Médio, como a milícia libanesa Hizbullah, o movimento radical islâmico Hamas, a guerra síria e a desintegração do Iraque.

    O anúncio da extinção de parte das sanções e a libertação dos americanos, não obstante, confluem para a configuração de três cenários, seja no contexto interno iraniano, na conjuntura regional ou em uma dimensão mundial.

    Dos meandros da política iraniana, só o imponderável tiraria de Rowhani a reeleição. As conquistas diplomáticas sob seu mandato e o forte apoio popular convergem para aplacar o ímpeto antiocidental dos clérigos ultraconservadores e tendem a enfraquecer a beligerância da Guarda Revolucionária.

    No certame regional, as implicações para os competidores do Irã não serão tangenciais. Israel, Turquia e Arábia Saudita, principalmente, terão de coexistir com um Irã dotado de maior capacidade de persuasão e com diversificados instrumentos de poder à disposição.

    Além do potencial de seu mercado, o Irã terá cerca de US$ 100 bilhões para atrair importantes investimentos, reestruturar seu sistema financeiro e revigorar seu parque tecnológico.

    Leonhard Foeger/Reuters
    Chanceler do Irã, Javad Zarif, e a chefe de Política Externa da UE, Federica Mogherini, durante coletiva
    Chanceler do Irã, Javad Zarif, e a chefe de Política Externa da UE, Federica Mogherini, durante coletiva

    Já no âmbito global, não seria desprezível dizer que o Irã será realocado, no médio prazo, em patamar diferente na escala de prioridade política de Washington, Londres, Paris e Berlim.

    A sincronização do fim das sanções ocidentais associada à libertação dos presos americanos foi uma ação diplomática bem orquestrada. Apenas o cumprimento do acordo nuclear e o beneplácito da AIEA não seriam talvez partituras políticas suficientes para aplacar o descontentamento dos neoconservadores do Partido Republicano nos EUA e também a desconfiança da opinião pública no Ocidente.

    Desde o princípio, o secretário de Estado americano, John Kerry, e o chanceler iraniano, Javad Zarif, centraram suas estratégias, ainda que de forma contida, focados em pavimentar uma aproximação que pudesse culminar, no médio prazo, no reatamento das relações diplomáticas entre Washington e Teerã.

    O engajamento entre EUA e Irã poderá ser descrito como o ponto alto da diplomacia do governo Obama para o Oriente Médio ou, porque não, da política externa americana em décadas para a região.

    Irã

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