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    Uso revolucionário de redes sociais ajudou Estado Islâmico, diz analista

    DIOGO BERCITO
    EM MADRI

    31/01/2016 02h00

    Terroristas administrando um território desértico entre a Síria e o Iraque têm vencido, ao menos até agora, o duelo virtual.

    Governos como o americano se esforçam em apresentar uma contranarrativa ao Estado Islâmico, mas são afogados pela enxurrada de mensagens extremistas circulando no Twitter.

    Reuters
    Homem mascarado aponta arma para câmera em vídeo atribuído à facção terrorista Estado Islâmico
    Homem mascarado aponta arma para câmera em vídeo atribuído à facção terrorista Estado Islâmico

    Os esforços dos EUA passam pelo CSCC (Centro para Comunicações Estratégicas de Contraterrorismo), ligado ao Departamento de Estado.

    Esse escritório foi chefiado entre 2012 e 2015 pelo diplomata Alberto Fernandez. Em entrevista à Folha, ele comentou as estratégias da batalha travada nas redes sociais —e as suas limitações.

    "O Estado Islâmico tem uma mensagem poderosa amplificada por um volume imenso. Ninguém consegue competir", disse Fernandez. Leia trechos da entrevista.

    *

    Folha - Quão importante é a comunicação para o Estado Islâmico?

    Alberto Fernandez - É uma chave para o sucesso deles. É impossível pensar que eles se tornariam o fenômeno que são se não fosse pelas mídias sociais.

    Qual é a inovação, comparando com a Al Qaeda?

    A Al Qaeda era mais tradicional, mais centralizada. Eles queriam controlar a mensagem nos fóruns na internet, onde extremistas conversavam. O EI adotou as mídias sociais. Não foram os primeiros terroristas a usar o Twitter. Hamas e Hizbullah já usavam. Mas ninguém usa o Twitter como eles. A mensagem do EI é revolucionária, e a maneira com que usam a comunicação também.

    Os esforços internacionais de contraterrorismo são efetivos na internet?

    Como medir o sucesso quando você trabalha com contraterrorismo? Como você mede algo que não aconteceu? Se 10 mil pessoas se uniram ao EI, sem nosso trabalho poderiam ter sido 20 mil. Mas nunca é possível estabelecer essa relação direta. É como provar que a polícia é eficiente. É difícil provar um negativo.

    Qual foi o efeito do centro durante sua gestão?

    Incomodamos o EI. Mas não tínhamos um fator importante: volume. Ninguém no contraterrorismo tem volume. O EI tem uma mensagem poderosa amplificada por um volume imenso. Ninguém consegue competir. Não apenas governos –a Al Qaeda também falhou em impedir o crescimento do EI.

    Como solucionar a falta de volume?

    Os seguidores do Estado Islâmico divulgam a mensagem porque acreditam nela.

    Precisamos encontrar pessoas motivadas ou uma maneira de criar volume artificialmente. Há muitas pessoas que fariam isso voluntariamente no Oriente Médio. E quem teria mais credibilidade do que os próprios sírios, que vivem aquela realidade?

    Eles podem dizer: "Não acreditem no EI. Eu estou na Síria, e eles estão mentindo para vocês".

    Nesse sentido, os EUA têm pouca credibilidade.

    É uma credibilidade limitada. Nos dizem que precisamos usar os nossos aliados na região, mas eles têm ainda menos credibilidade.

    Ninguém vai acreditar se nós dissermos que os EUA são bons. Mas, se mostrarmos que o EI diz uma coisa e faz outra, é um argumento que pode ter alguma credibilidade.

    Os vídeos do EI têm também mais impacto do que a contranarrativa, por incluírem imagens violentas?

    Pense no típico vídeo de recrutamento. Há violência, um vocabulário islâmico, mas também há uma pessoa falando diretamente ao espectador. Com o rosto descoberto, com um nome. É uma evangelização do discurso por uma testemunha.

    Onde está o testemunho de alguém que possa dizer que ter participado do Estado Islâmico foi um erro? É muito raro. Quem foge do EI aparece com o rosto borrado, nos vídeos.

    Há informações sobre quem está por trás dessa máquina de comunicação?

    Sabemos o que eles estão fazendo, por que razão e como. Mas não sabemos quem. Conhecemos os porta-vozes, mas quem montou essa estrutura?

    Não é como o regime do ex-ditador Saddam Hussein. É novo, e não tem precedentes.

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